O PAÍS QUE TEMOS: Tem dias em que dou graças por viver em Portugal, tem dias em que não. Vem a propósito da primeira observação a ansiada recepção não só da minha carta de marinheiro como também as de patrão de costa e alto mar que me possibilitam manobrar esta nau, divulgar o que entender e sem receios de que se possa confundir a identidade do autor com a do amável postador. Não pensem que foi fácil. Contagiada por centenas de anos de desenvolvimento (sem igual nos países desenvolvidos) do processo burocrático, a secretaria da direcção do blog atrasava o envio da documentação necessária. Que iria demorar muito, que eu precisava de juntar certidão de nascimento (como para quase tudo, neste país), cópia de facturas da EDP e da PT, preencher formulários, fazer exames de aptidão e médicos, seguro de responsabilidade civil, enfim, uma infinidade de coisas. Sem êxito tentei demonstrar que isso era um exagero, que iria demorar imenso tempo. Disse até que o tempo de admissão não era compatível com o fenómeno dos blogues, dado que alguns deles constituíam projectos a dois anos e que o processo de admissão consumiria necessariamente esse período. Debalde; a funcionária não foi na minha conversa. Que não, e que não e que não...
Felizmente conhecia bem a direcção do blog e um agradabilíssimo jantar com Neptuno proporcionou-me de imediato a documentação necessária (mais, até), sem sequer prestar exames de admissão.
Portugal é um belo país. Oiço por aí que há ministros que são corridos por situações destas, mas isso deve ser na coisa pública...
A segunda observação vem a propósito da notícia da TVI (embora já a tivesse ouvido, há dias, na TSF), segundo a qual estaria para publicação (ou teria já sido publicado, eu ainda não o vi) um qualquer diploma onde se proíbem nas escolas os aquecedores a gás. O assunto preocupa naturalmente regiões como Trás-os-Montes e Minho (imagino que também a Beira Interior) e provocou logo reacções de dirigentes autárquicos, responsáveis pelas escolas.
Segundo eles, não há dinheiro para, de um momento para o outro, alterar o equipamento de forma a banir os aquecedores a gás e, como as crianças não podem - muito naturalmente - sofrer com o frio, manter-se-ão os aquecedores a gás. Mas a lei proíbe, insistia a jornalista. Pois proíbe mas, como não há alternativa, terá de se violar a legislação, afirmava calma e displicentemente à TSF um autarca de Trás-os-Montes.
Não sei o que me incomoda mais nesta notícia, tenho sinceras dúvidas. Talvez a forma como em Portugal (Lisboa) se legisla, sem o mais pequeno conhecimento da realidade nacional. Não se veja nisto um apelo a uma qualquer regionalização, que não desejo. É apenas uma constatação. Infeliz constatação. Temos das normas mais avançadas da europa e do mundo; não servem é no país: fica-nos curta nas mangas, para usar a expressão de Eça de Queirós.
Mas também o facto das autarquias não poderem adquirir umas dezenas - ou centenas, que fossem - de aparelhos ou sistemas de aquecimento para as escolas me parece inadmissível. Estou sinceramente convencido de que para se chegar a esta lamentável situação - a ser verdade - é porque se anda a gastar muito mal o dinheiro. Admito que a instalação de outro equipamento (ou, apenas, o cumprimento das disposições legais...) não dê tantos votos como os da inauguração da fonte luminosa na nova rotunda, mas (que chatice!...), alguém tem de o fazer.
Por fim, igual horror me causou a forma como o autarca, sem qualquer tipo de problema, anunciou que se iria violar o diploma, que se iriam manter os aquecedores a gás. O argumento era o de que não havendo dinheiro, não se cumpria o disposto no diploma. Claro, sr. Autarca: não há dinheiro, fazer o quê? É evidente que não se pode cumprir a lei. Imagino que não deva ter uma linha de pensamento muito diferente desta aquele que não cumpre as suas obrigações fiscais ou o fulano que me roubou o rádio há quinze dias atrás...
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