É O QUE SE PODE ARRANJAR: Bem posso eu votar pela despenalização do aborto, ou todos os anos dedicar 1/4 da cadeira de psicologia social que lecciono à desmontagem dos mecanismos do racismo e de xenofobia; são notas como a que se segue, que me valem aqui em alguma blogosfera, o labéu de reaccionário ou obcecado com a esquerda. Compreendo, pois que muitos do mecanismos de acção dos utópico-revolucionários fundam-se mais no cadafalso e na intolerância, do que na discussão de ideias. Adiante.
A nota que deixo prende-se com a passagem anunciada hoje na SIC de um filminho menor, mas didáctico. Trata-se do Massacre dos Inocentes e relata as vicissitudes dos boat-people que fugiam do regime comunista do Vietname. Saigão foi definitivamente libertada em 1975 da influência norte-americana, e para terem a certeza que a libertação seria completa, cerca de 0.5 milhões de estudantes, funcionários, budistas, comunistas do Sul, foram encarcerados em campos de reeducação. A perseguição e assassínio não diferiram muito das exercidas, sobretudo no Norte, antes da intervenção americana, foram até talvez menos violentas. Mas se nessa altura Ho-CHi Min já era o ídolo dos make peace not war, e o mártir do Tio Sam, claro que depois de 1975, os meninos pacifistas e da esquerda universitária ocidental não verteram uma lágrima, não fizeram uma manifestação. Pior: para eles, o regime era uma bandeira.
O filminho de hoje é uma pequena e miserável homenagem a esses tempos e a essas pessoas. Aqueles que na altura batiam com a mão no peito por Hanói, hoje dirão que não podem ficar amarrados ao passado. O que é interessante é que a noção de passado, para esta gente, é assaz particular: daqui a quantos anos o PCP e amici vão saber o que se passou em Cuba durante todos estes anos? Por isso existe apesar de tudo uma diferença, aqui mesmo na blogosfera: entre uma esquerda como por exemplo do Barnabé, que denuncia o que há para denunciar, e uma esquerda cinquentona, ressabiada, moralmente superior e carregada de silêncios selectivos. Hoje, indignada, esta esquerda caviar-de-ovas-de-salmão dirá ( como muito tarde disse do estalinismo), também, que não se revia naquilo, que não era o que defendiam. Pois não. Bom seria terem dito isso na altura: na alegre casa das ideologias, a suposta superioridade moral tem o seu preço.
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