1ª PÁGINA: Como é bom de ver, as primeiras páginas de um jornal têm particular importância e os assuntos que tratam, por serem (ou poderem ser) relevantes, deveriam ser tratados com especial cuidado. Ou, pelo menos, assim se imaginaria que fosse, caso o nosso país não possuísse particularidades únicas, que o individualizam nem sempre pelo melhor motivo.
Sábado, pego no DN e logo na primeira página fico a saber que os seus dois enviados foram acordados pelas explosões em Bagdad. Caramba! Isto é que é notícia! À falta de uns tiros ou outra qualquer coisinha melhor, os do DN contentam-se em chamar a atenção, na sua primeira página, para o brusco acordar dos seus jornalistas. Fica-se com a ideia de que eles foram para o Iraque contando acordar calma e docemente ao som de violinos ou de harpa, com doce aroma de torradas e compota e a frescura de sumos tropicais. É bem certo que o nosso Presidente da República se despediu dos nossos GNR’s desejando umas displicentes “felicidades”, como se fossem participar num raid TT ou fazer turismo, e que por lá os jornalistas portugueses circulam alegremente em cobiçados jipes de categoria superior, mas todos nós já intuímos que a coisa ali deve andar bem quente, e não me refiro apenas à temperatura que costuma afectar o país. Seria natural que os jornalistas também se apercebessem disso: por algum motivo eles foram enviados para o Iraque, um local de perigo constante onde ninguém vê a sua segurança garantida (claro, PS, PCP e BE exigem que o nosso governo garanta a segurança dos nossos jornalistas no Iraque; mas quando nós sabemos que os próprios militares norte-americanos não conseguem garantir a sua própria segurança no local, as exigências da nossa oposição ridicularizam-se por si, como invariavelmente tem acontecido).
Daí que, hoje em dia, no Iraque, acordar ao barulho de bombas - mesmo que muito próximas - só por se tratar do umbigo pode constituir notícia de 1ª página.
Coisa semelhante se passou há uma semana, na SIC, com a chegada da jornalista ferida, embora aí o tamanho do umbigo da SIC tivesse aparecido, como geralmente acontece, infinitamente maior.
Não pretendo desvalorizar a coragem dos jornalistas que se deslocam ao Iraque mas, cá para mim, quando os jornalistas ganham o estatuto de “notícia”, esta arrisca-se a perder por completo qualquer estatuto de razoabilidade que eventualmente pudesse ter.
A ÚLTIMA PÁGINA do Público de Domingo é outro exemplo perfeito de perfeita falta de razoabilidade, acaso não se trate apenas falta de notícias ou de um frete. A ÚLTIMA PÁGINA é sempre especial e igualmente tratada com cuidado. Mas nem sempre. Noticia aquele jornal, durante meia página (felizmente a outra metade é ocupada de forma deliciosa pela saborosíssima dupla Calvin e Hobbes) e com direito a fotografia, a imensa manifestação de apoio a Michael Jackson realizada por 5 (cinco!) fãs (uma de 13, outra de 20 e parece que um de 25 anos; dos outros não sei a idade, imagino que uma simpática senhora de 83 anos que não percebeu bem o que lhe estavam a pedir, juntamente com o neto de 4 anos, mesmo assim embaraçado).
Parece que uma das fãs se identificava de tal forma com o cantor que este teria influenciado a escolha do seu curso (não comecem já para aí a pensar que seria Educadora de Infância, pois era Relações Internacionais, vá-se lá saber porquê). Isto ocupa meia página. Na última.
Na verdade, face ao espaço que os jornalistas dão a cinco rapazes no Chiado, apoiando Michael Jackson (certamente outra “vítima de uma cabala”...), não admira que andem em bandos atrás dos estudantes e das suas correntes e cadeados.
Mar de opinioes, ideias e comentarios. Para marinheiros e estivadores, sereias e outras musas, tubaroes e demais peixe graudo, carapaus de corrida e todos os errantes navegantes.