AINDA SOBRE LABREGOS: O futebol, ao contrário do que pensam alguns intelectuais respeitáveis, tem muito a ensinar sobre a coreografia da natureza humana nos dias que correm. Para além do espectáculo, técnica comunicacional prioritária da actual civilização ocidental, o encerramento em parque fechado de códigos de comportamento reguladores - competição, justiça, tempo limitado, estratégia e resultado - permite recolher uma ou outra observação interessante. Uma delas prende-se precisamente com a violência que está presente desde os jogos dos infantis ou dos distritais. Aprendemos mais aí do que nos grandes derbies, pois que aí está a origem explicativa, a paideia da coisa. O especialista vulgarmente chamado às TV's para explicar uma sessão de violência num jogo de futebol, diz invariavelmente que:
a) O povo que estava a assistir (ao jogo) é povo normalmente ordeiro e pacato.
b) É devido ao efeito pernicioso e contagiante das massas que o Sr. Antunes passa, num Domingo repentino, de um pacato pai de família empregado de escritório, a um facínora capaz de apedrejar um fiscal-de-linha que não conhece de parte alguma.
Mas se regressarmos ao Freud dos dias do fim, ao Freud filósofo e céptico, de O Mal-Estar na Cultura, percebemos que o verdadeiro Sr. Antunes está mais próximo do facínora dos Domingos à tarde do que do pacato cidadão semanal. É que à semana, o Sr. Antunes é forçado a respeitar os sinais de trânsito, os humores do chefe, os pêlos nas pernas da mulher. Ao Domingo, por um breve momento, o verniz velho de séculos estala, e o Sr. Antunes redescobre por breves instantes, o prazer da selvajaria. Que sempre conheceu, e sempre foi sua, afinal.
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