UM BALÃO CHEIO DE AR foi como se revelou o fenómeno Howard Dean nas eleições primárias do Iowa. Dean era o favorito, segundo todos os comentadores. Acabou num humilhante terceiro lugar.
Howard Dean transformou-se em ano e meio no maior fenómeno do processo eleitoral do EUA. Governador de um estado com pouco mais de 500 mil habitantes aproveitou, como ninguém até agora, a Internet para fazer passar a sua mensagem e angariar fundos (angariou mais que qualquer outro candidato democrata até à data). A sua mensagem de oposição radical a Bush, carregada de energia, raiva (chegando a rondar o puro ódio por tudo o que Bush é ou representa) trouxe para junto de si milhares de voluntários, sobretudo jovens universitários, que o adoram e acompanham para todo o lado. É este entusiasmo que há muito não se via nas eleições americanas. Mas a liderança nas sondagens não se traduziu em votos.
É certo que o complicado método de contagem de votos do Iowa retira muita, para não dizer toda, da validade de sondagens de intenção de voto. Mas Dean tem problemas mais fundos: a mensagem de contestação radical, pela negativa, conjugada com a personalidade abrasiva fazem dele um candidato pouco presidenciável. Para perceberem melhor o que quero dizer dêem uma espreitadela ao discurso verdadeiramente desastroso que fez aos seus apoiantes, após a divulgação dos resultados - foi uma mistura de gritaria, zanga, raiva e apelos à mobilização em tom guerreiro que assusta até alguns eleitores radicais, quanto mais os moderados.
Acresce que Dean tem algumas contradições e dificuldades difíceis de superar. Não tem experiência em política externa: é curioso que, segundo inquéritos à saída dos caucuses, a maioria dos opositores à intervenção armada no Iraque votou em John Kerry que, enquanto senador, votou a favor da intervenção armada e não em Dean que tem feito do tema um dos seus principais argumentos eleitorais. Os eleitores terão preferido a crítica equilibrada, sensata e sustentada de Kerry à política externa de Bush ao primarismo demagógico. Por outro lado, tendo começado por se declarar como o candidato anti-establishment, Dean acabou por ser apoiado pelas principais figuras do establishment do Partido Democrata: Al Gore (que mais uma vez prova que é um pé-frio eleitoral), Jimmy Carter, a maioria dos congressistas democratas. Por último, Dean não tem qualquer capacidade de comunicação emocional - é um straight-talker, o que produz muito bom efeito a elencar críticas, mas não cativa votos.
Terça-Feira o circo continua no New Hampshire e apesar de tudo Dean ainda tem boas hipóteses (afinal de contas, ainda é o candidato com mais dinheiro, o que lhe permitirá concorrer em todos os estados). Mas a forma como reagiu ao resultado do Iowa não augura grandes melhoras.
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