UM NOVO PARADIGMA ? Um dos momentos mais interessantes da exposição de David Kay foi a propósito da definição do que são armas de destruição em massa. Segundo o seu testemunho, se se tiver uma definição lata destas armas (incluindo armas electrónicas e do ciberespaço), poder-se-á concluir que há, hoje em dia, cerca de 50 países no mundo com programas de armas de destruição em massa. Isto levanta problemas interessantes.
David Kay é um experiente homem das informações, com décadas de serviço nas guerras ocultas e subterrâneas entre serviços de informação. Na sua opinião, tendo em conta os dados acima descritos, acabou a era da possibilidade de controle da disseminação de armas de destruição maciça. A comunidade internacional, confrontada com este facto, terá de elaborar um novo critério para controlar a posse e uso deste armamento. Segundo Kay, passámos da era da avaliação e controle da posse para a idade da avaliação e controle da intenção de utilização. Ou seja, a comunidade internacional e sobretudo as democracias ocidentais para se defenderem terão de acordar em critérios sobre a avaliação das intenções e objectivos dos regimes e grupos que possuem estas armas.
Neste contexto, a crise diplomática em torno da guerra no Iraque foi um novo tipo de crise, que ocorrerá sistematicamente enquanto não se encontrar um novo enquadramento legal e institucional para estas necessidades. Enquanto as discussões forem caso a caso teremos sempre divergências entre países aliados mas eventualmente com interesses diversos.
Só assim se compreendem artigos como este, de Richard Perle e David Frum, que o Ivan contestou de forma veemente, mas talvez precipitada.
Não me revejo totalmente neste diagnóstico, que tem uma clara assinatura ideológica, e corresponde a um programa político dos neoconservadores. Mas sou forçado a reconhecer que é uma análise que parte de um diagnóstico correcto (ou pelo menos possível na realidade geo-estratégica pós 11 de Setembro).
O mundo está cada vez mais perigoso. Mudou muito e muda a uma velocidade cada vez maior. Podemos agarrar-nos às instituições e ao Direito Internacional elaborados perante uma realidade substancialmente diferente da actual. Ou aceitar que este é um debate ao qual não poderemos fugir.
A realidade encarregar-se-á de no-lo demonstrar.
P.S. - Quem pense que a influência neoconservadora se resume aos republicanos está enganado. Há imensos democratas que assinam por baixo estas análises. O aumento da sua influência no pós-11 de Setembro deveu-se mais a professarem uma ideologia e apresentarem soluções que assentavam como uma luva à nova realidade em que os americanos se acharam, do que a ligações políticas e partidárias.
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