CASE STUDY: O ESTUDO II: Depois tive as reacções do segundo tipo, sérias mas emotivas, perdendo assim muito do que as podia fundamentar.
Tenho de confessar que tinha enorme vantagem sobre todos os outros: tive todo o tempo que quis para elaborar o texto. Cada frase, cada palavra foi pesada, pensada, colocada milimetricamente para obter o resultado pretendido. Cada adjectivo minuciosamente colocado. E as ideias laboriosamente escolhidas. Obviamente não eram minhas mas constam dos estudos de inúmeros historiadores, de relatos, de memórias, de jornais ou do conhecimento público e constituíam factos reais dificilmente atacáveis ou inegáveis. Atente-se, por exemplo: a colonização mais humanizada (não exactamente nestes termos no primeiro post) face às colonizações de outros países (ou menos perversa, se se preferir, mas não se dizendo nunca que se defendia a colonização); o facto do português médio não ter como preocupação fundamental contra o regime a falta de liberdade em Portugal (não se dizendo que não havia liberdade, o que é uma evidência); o facto da falta de liberdade só incomodar seriamente franjas da população, referindo no entanto aqueles que mais sofriam com a falta de liberdade (o que implica necessariamente admitir que a dita liberdade não existia); o facto dos estrangeiros também não se pronunciarem sobre isso, embora se preocupassem com as colónias, por motivos mais ou menos humanistas (o que é verdade); a preocupação, após o 25/4, de efectuar o mais rapidamente possível a descolonização (outro dado indiscutível); a guerra civil horrorosa que isso provocou (a que todos temos assistido), etc., etc.
Tudo isto, objectivamente considerado, constitui um conjunto de factos dificilmente rebatíveis (como disse atrás, FNV ensaiou-o com bastante êxito, embora recorrendo às intenções políticas, quase me estragando a análise e me obrigando a sublinhar o aspecto mais humanista - ou menos perverso - da colonização portuguesa em relação aos restantes países colonialistas), e a sua simples enumeração ou constatação não implica necessariamente que uma pessoa seja contra ou a favor do regime onde eles se deram. Aqueles factos podem ter interpretações e explicações políticas diversas, mas não deixam de constituir, objectivamente considerados, dados de qualquer historiador sério, mesmo do mais perseguido pelo regime (o que é diferente da sua análise política, da sua explicação, motivação, apreciação, etc.). É evidente que os adjectivos colocados, uma forma de escrita mais agressiva e uma ou outra picardia fizeram o resto, que foi provocar a emoção nas reacções, afastando-as do concreto. (cont.)
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