O FANTASMA DA ESTATÍSTICA: Claro que a área política nao podia fugir à obsessão americana pelas estatísticas. Qualquer analista político numa televisão americana debita dezenas de estatísticas, de regras, modelos e padrões de comportamento do eleitorado, com base em números e dados estatísticos. Ao contrário da Europa, em vez de opinion makers são autênticos number crunchers.
No entanto, estas eleições primárias estão a desafiar algumas ideias feitas. Há cerca de 40 anos, que nenhum candidato democrata que ganhasse no Iowa conseguia ser o nomeado. Kerry vai bem lançado e parece imparável, apesar de ter ganho aí os caucuses.
Restam ainda duas regras estatísticas bem mais difíceis de superar. A primeira diz-nos que desde Kennedy (há 40 anos) nenhum senador conseguiu ser eleito Presidente dos EUA. Todos os sucessores de Kennedy eram ou governadores ou vice-presidentes. Há uma razão política substancial para este facto: o registo das votações de senadores são um autêntico maná para os seus opositores. Kerry, por exemplo, votou contra a primeira intervenção americana no Iraque em 1991 e a favor da presente guerra. Vai exigir muito talento (que, diga-se de passagem, não falta a Kerry) para tornar politicamente irrelevante este aparentemente estranho comportamento.
Também desde Kennedy que nenhum Presidente eleito é oriundo dos estados do Nordeste, mais progressistas ideologicamente e mais europeus no estilo. Todos os presidentes, de há 40 anos para cá, eram oriundos de estados do Sul, com a excepção de Reagan que era californiano (um estado que, só por si, tem uma dimensão muito relevante).
Os eleitores democratas, no entanto, não têm ligado a estes dados: inquéritos à saída das urnas indicam que os democratas votam em peso em Kerry, porque o consideram "elegível" - conclusão que contraria a cruel frieza das estatísticas.
Por aqui se mede a díficil tarefa que espera Kerry. Com um candidato a vice-presidente bem escolhido (com saída no Sul) e uma boa campanha, pode provar que as estatísticas de pouco valem em política. Mas este ruído de fundo de comentadores e analistas num país de data-freaks, não ajuda em nada.
Como escrevia Arthur Miller "os dados e relações estatísticas são como os humanos. Nascem. Amadurecem. Casam. E divorciam-se. A única coisa que nunca lhes acontece é morrerem. É preciso matá-los."
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