AMERICAN GUN: É um filme menor, de um cineasta desconhecido, e passou despercebido em quase todo o lado. O leading role é de um quase octogenário James Coburn, que morreu pouco depois da estreia da película. Mas é sobre um assunto porco-espinho: a culpa na morte.
A filha de um velho morre, primeiro num vulgar assalto ( como deveria ter sido), depois às mãos do próprio pai (como foi), num lamentável engano ( o velho pensou que lhe estavam a assaltar a casa). Coburn enceta depois, a propósito da arma do crime, uma viagem à procura da neta, reconstituindo a história dos muitos proprietários da arma, para lhe dar ( à neta), a notícia de uma morte. Carrega a culpa, a velhice, o des-sentido.
O filme é menor no mapeamento dos sentimentos que temos diante de uma perda à qual estamos, de uma forma ou de outra, ligados; mas é poderoso porque Coburn compõe um velho contido, prático, e com desejo de viver. Nesse sentido é quase obsceno. Vital, mesmo. Como bebemos, comemos, fornicamos, trabalhamos, depois de uma perda que nos congelou, que nos fez jurar que "nada mais faz sentido"? De que é feita essa ilusão do freudiano eros, o "instinto vital"? Como activá-lo na velhice, o grande tema da psicologia, nas décadas que aí vêm, ou em qualquer outra altura?
Talvez que uma perda essencial, e só essa, nos remeta para uma condição de solidão e de desprotegimento tal, que uma campainha de alarme soa. Esse alarme, assinala a nossa distracção face a uma fraqueza insuspeitada até então, e daí a culpa; culpa pela nossa fraqueza, pelo nosso desleixo. A vulnerabilidade revelada, mobiliza então forças quase demenciais, que nos fazem percorrer meia-América à procura de um motivo para tomar o pequeno-almoço. É o que faz correr Coburn?
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