FAZER O JOGO DELES: Raramente o FNV e eu estamos de acordo em matéria política. Mas aqui, decididamente, nunca a análise política mainstream me pareceu tão longe da realidade.
Todos procuram dar uma explicação para os resultados das eleições em Espanha que sirva os seus próprios interesses. A esquerda exulta, dizendo que este é o preço da mentira. A direita acidifica-se, afirmando que é uma vitória da Al-Qaeda e, implicita ou explicitamente, do alegado aproveitamento da desgraça e do medo por parte do PSOE.
Mas sobram muitas perplexidades. Primeira: é esta a primeira vez que as sondagens se enganam? Segunda: será crível que um povo com medo, dor e raiva, que foi persistentemente, e à custa de muito sangue, reduzindo a ETA à insignificância, mude o seu voto do PP para o PSOE, supostamente menos "duro" com o terrorismo? Terceira: sabendo-se que a esmagadora maioria dos espanhóis foi contra o alinhamento geo-político de Aznar, não será honesto reconhecer que esse sentimento, formado muito antes do atentado, foi agora expresso nas urnas? Quarta: faz sentido dizer que a retirada das tropas espanholas é uma vitória da Al-Qaeda, como faz o nosso Neptuno, quando essa era uma promessa eleitoral fundamental da campanha do PSOE?
O que nos leva ao mais preocupante, para lá das minudências da análise do que foi: é claro que Zapatero está agora numa posição delicadíssima, dividido entre a promessa que fez e o receio da interpretação que o seu cumprimento possa ter. Ora, como lembra o marujo FNV, será que ainda não perceberam que insistir na vitória da Al-Qaeda é precisamente fazer, por eles, o jogo dos terroristas? Será que ainda não perceberam que isso ainda é parte do mesmo esquema de terror e condicionamento que o terrorismo quer impor? O que será preciso para se entender que as sociedades democráticas devem fazer as suas opções, sejam elas quais forem, e apresentá-las como vontade genuína do povo, sem se deixarem condicionar, de uma forma ou outra, pela chantagem terrorista?
Convinha reflectir sobre isto: não são as decisões dos órgãos democraticamente eleitos que podem constituir triunfos do terrorismo; o triunfo do terrorismo está na atribuição dessas decisões ao medo. E, aí, o terrorismo já está a ganhar.
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