O DESPREZO: Tenho muito gosto em todo este frenesim comemorativo do 25 de Abril, embora em algumas praças ( media) me pareça que está a ser vendido como bacalhau a pataco. Mas por mais enjoativa que seja esta unanimidade nacional-porreirista, muito mais enjoativa e bolorenta ainda, era a unanimidade asfixiante e medíocre do way of life do antigo Regime, da qual só um imbecil pode ter saudades. Até porque a data está condenada a ser engolida pelo tempo ( imaginam as comemorações dos 50 anos de "Abril"?) e os seus personagens em breve habitarão o limbo a que os portugueses condenam a História, não faz mal este foguetório. E é por aqui que o gato vai às filhozes. O leitor conhece algum filme português de jeito sobre a viagem de Vasco de Gama, a vida do Infante D. Henrique ou sobre a batalha de Aljubarrota? Mas conhece e viu dezenas de filmes americanos sobre a conquista do Oeste, o Vietnam, Gettysburg. Ou excelentes adaptações cinematográficas inglesas de Hamlet, da Revolução de Cromwell ou das Cruzadas. Ou sucessos de bilheteira franceses que obrigaram Joana D'Arc ou D'Artagnan a tornarem-se familiares ao pessoal da baguette. Mas todos os anos se estreiam em Portugal, convenientemente financiados, dezenas de curtas e longas metragens abundantemente dedicadas a conflitos interiores, divórcios dilacerantes, sexualidades reprimidas, meditações adolescenciais-filosóficas a tresandar a pastilha elástica. Nos livros, a mesma coisa, nem vale a pena falar, salvo algumas excepções. Basta dizer que, a primeira aproximação popular a D. Afonso Henriques, foi uma biografia publicada por Freitas do Amaral já no século XXI.
Do que falo não é de ensaios universitários ou eruditos. Falo de produtos para toda a gente. Como o filme Capitães de Abril, de Maria de Medeiros, ou de Balada da Praia dos Cães de Fonseca e Costa.
Este desprezo das elites centrais pela História de Portugal sustenta muito da baixa auto-estima nacional. Um puto de 15 anos conhece mais figuras da História americana do que da sua, e cresce pensando que este país se fez à beira do telemóvel e do Luis Figo.
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