UMA PEQUENA AJUDA A PACHECO PEREIRA: Dizia JPP ontem na Quadratura, na SIC-Notícias, que lhe escapava a razão pela qual, na sociedade portuguesa, o futebol é hoje mais opiáceo, mais alienante, do que no antigo regime. Explanemos razões gerais, particularizemos para o caso português, depois.
O futebol é um jogo simples, e a cultura ocidental é hoje simples: quadros mentais rápidamente adquiridos, processos socio-cognitivos de desenlace breve, ao alcançe da indigência comum. Dir-se-á: nos anos 50 do século passado já o futebol era assim, porquê então a sua ditadura mediática actual? Porque a mediatização se popularizou, há mais gente com TV hoje do que com rádio nos anos 50. O público-alvo esteve sempre lá.
Depois, o futebol é consumível, logo, enriquece os seus actores. Se a cobiça era um pecado medieval, hoje nem tanto. Símbolo de um êxito aparentemente ao alcançe de qualquer um, o futebol encanta tanto pelo ordenado como pelas jogadas das estrelas. E o povo sempre se encantou e se deixou esmagar pela riqueza das catedrais, pela sua majestosidade, pela força que delas se desprendia. Antes como agora.
Portugal tem tantos diários desportivos como países mais poderosos, a Itália ou a Espanha, os telejornais abrem com a problemática do joelho do Mantorras? Seremos nós portugueses, uma tribo futebolística especial? Não creio. Se Portugal é original, é no facto de o desporto ser menosprezado, o que deixou campo aberto ao futebol como aglutinador da expressividade regional, do orgulho bairrista, logo, do comando caciquista. País pequeno, onde toda a gente se conhece, o mundo da bola permite unificar a comunidade comunicacional: ser do Benfica ou do Porto constitui uma divisão tão natural como ser do PS ou do PSD. A importância extraordinária atribuida aos árbitros desliza do nosso estilo aldeão: o árbitro, por natureza, é de fora, logo estranho, logo imprevisível, logo perigoso.
Estou convencido que esta nossa "costela terceiro-mundista", como JPP a designa, desaparecerá com o tempo, e o futebol nativo assimilará as regras do espectáculo e do negócio, em detrimento de uma ancestralidade passional, rústica e aldeona. É uma questão de tempo.
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