ANIVERSÁRIOS: É um costume actual, não só português, desdenhar o reconhecimento e o elogio a alguém, pois que tal revelará tão só um proselitismo juvenil pouco frequentável. É sempre mais cool (e verdadeiramente adolescencial) olhar de esguelha afirmando independência enquanto sobranceiramente se larga uma ou outra palavra amável. Como sou pouco jovem e pouco português nesta matéria, aproveito a ocasião para juntar duas calorosas felicitações, a Pacheco Pereira e ao 1º aniversário do seu Abrupto e a Sigmund Freud e às suas 148 Primaveras. ( Foi o Francisco José Viegas que lembrou ao psicólogo desmemoriado a coincidência). Felicito mais JPP do que o Abrupto, porque o que acho que devo a JPP ( os seus textos, algumas orientações, partilha de uma visão desencantada da natureza humana mas racional e pontualmente optimista), devo-o mais noutros escritos, mas de qualquer modo o aniversariante tem a primazia. Freud, mal tratado por gerações inteiras de psicanalistas e psicólogos insanes, poupado por poucos, deixa à cultura ocidental um texto absoluto, O Mal Estar na Civilização.*
Freud, numa carta a Thomas Mann, em Junho de 1935, cumprimenta-o pelos seus sessenta anos e diz-lhe que não lhe deseja uma vida larga e feliz, "porque desejar não custa nada", e além disso, tal significaria "um retrocesso aos tempos nos quais se acreditava na omnipotência mágica dos pensamentos". Isto é um bocado do velho Freud do Mal Estar: pessimista quanto à natureza humana - muitos matariam através do simples enunciar do desejo - mas confiante em que os instintos e os pensamentos têm de passar pela realidade trituradora da cultura. Ainda bem.
* Freud, no seu original, utiliza "Cultura" e não "Civilização": fica para outra ocasião, que merece a pena.
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