CARO SENHOR ADJUNTO DO PRIMEIRO-MINISTRO: Perdoar-me-á que responda aqui à sua gentil missiva, mas o enevelope, posto que elegante, não continha o endereço do remetente.
Estou consciente de que o Euro 2004 é uma "oportunidade única para a projecção internacional do nosso País, da nossa riqueza humana" e, por que não confessá-lo, aqui que ninguém nos ouve, "da nossa riqueza patrimonial e da nossa ambição".
Porém, já desconhecia que, "ao longo de várias semanas, cerca de 8.500 jornalistas estrangeiros farão do nosso País o centro das atenções de todo o mundo" - mas fiquei contente com a notícia. Sabe-se lá o que os terá levado a tomar decisão tão favorável para Portugal e para o Governo que V. Exª superiormente coadjuva, mas... que importa? Pela minha parte, procurarei estar à altura do acontecimento e, para não dar má impressão ao mundo, encomendei já um fatinho de campino sorridente. A minha mulher, não tendo a sorte de ter nascido lusa, está já devidamente treinada para narrar a eventuais repórteres estrangeiros a imensa felicidade da vida de um estrangeiro em Portugal.
Quanto às eventuais "perturbações no [meu] quotidiano e na vida da [minha] cidade", estou certo de que o pior já passou. Aproveito, aliás, para felicitá-lo pela inusitada rapidez com que se fizeram obras de tão importante envergadura - embora sinta alguma pena por não haver um Euro, ou outra coisa qualquer, para crianças doentes. É que um novo Hospital Pediátrico, neste burgo periférico, dava mesmo jeito. Obviamente, tudo a seu tempo e na ordem devida.
Mais lhe garanto que estou pronto para "enfrentar um fluxo extraordinário de visitantes", mesmo que tenha ficado algo confuso acerca do modo como tal atitude se pode conjugar com a demonstração da nossa "intrínseca e cordial hospitalidade".
Agarremos, pois, "de forma determinada", esta "grande oportunidade". Também eu sinto que "Portugal está pronto".
Respeitosos cumprimentos deste seu criado,
Pedro Caeiro
PS: O carácter tão pessoal da original forma de comunicação que escolheu para se dirigir aos seus governados dá-me o à-vontade necessário para lhe pedir que satisfaça uma curiosidade que se me suscitou quando li a última linha da sua carta: também escreveu ao Vítor Baía?
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