E ASSIM HONRAMOS O COMANDANTE: O post do nosso Comandante, fora de tempo, sobre o primeiro aniversário do Mar Salgado tem um extraordinário valor simbólico: nada poderia ilustrar com mais fidelidade a anarquia de memórias, o torvelinho de confusões, enfim, a magnífica diferença que se vive a bordo desta nau.
Nada de melhor, portanto, do que uma refregazita para comemorar o evento (à cautela, procuro escrever entre o dia 7 e o dia 8).
Tem razão o nosso FNV quando protesta que não se aplica aos seus posts o síndroma dos telhados de vidro. Aplica-se, com efeito, a outros que pretendem comparar a tortura dos prisioneiros iraquianos com a repressão institucionalizada, de Estado. Mas, ainda assim:
1) Não deixo de lamentar que as primeiras impressões publicadas neste blogue sobre o assunto (confesso que estava muito curioso para ver se se diria alguma coisa, e o que se diria) se centrem sobre a grande vantagem de se poder saber dos factos, em contraposição ao que acontecia na União Soviética e acontece em Cuba.
2) Quem exalta, justamente, a grande diferença entre actos mais ou menos individuais e a repressão oficial, de Estado, não deveria ficar calado perante as comparações imbecis entre os desmandos do PREC e a infâmia da PIDE. Nem deveria admitir, em consequência, que a liberdade só chegou a Portugal no 25 de Novembro.
3) É preocupante que a glorificação da liberdade de imprensa, como instrumento de controle do abuso, faça esquecer que os factos só se souberam graças à imprensa - e não através dos meios oficiais normais que se esperariam do poder num Estado de direito - e que a CBS foi fortemente pressionada pelo Pentágono para não difundir as imagens, de acordo com as declarações da própria. Tudo oque ficou convenientemente silenciado nos comentários dos meus companheiros.
4) Por fim, e decisivamente, tanto o nosso FNV como o Comandante parecem esquecer que a liberdade de imprensa não é um fim em si. A liberdade de imprensa é um bem instrumental para que o poder se sinta efectivamente debaixo de escrutínio. Por isso, não basta que as coisas se saibam para que nos congratulemos com a democracia: o passo seguinte, necessário, é que o poder se sinta obrigado a tirar as consequências das coisas que ficaram a saber-se.
E por isso, quando vejo Bush exprimir a sua "repugnância" pelos factos cometidos, ou Blair a dizer-se "appalled", não posso deixar de me lembrar dos versos de Orlando de Carvalho,
desmanchamos os gestos em palavras
e eles súplices e dúplices
alisam as espadas
Parabéns, Comandante. Como nos convidaste para ser livres aqui, vê neste post uma homenagem ao jeito dos tecelães de Kuyan-Bulak.
E agora que, também desse lado do mar, o sol já passou o lais da verga, one scotch, one bourbon, one beer.
Mar de opinioes, ideias e comentarios. Para marinheiros e estivadores, sereias e outras musas, tubaroes e demais peixe graudo, carapaus de corrida e todos os errantes navegantes.