IDEOLOGIA E SEMÂNTICA, OU O "PESO SECRETO" DAS PALAVRAS: Abre-se hoje aqui uma secção de reflexão sobre problemas universais, que atormentam o Homem desde o início dos tempos.
Logo a seguir a questionar-se sobre o sentido da vida, o Homem procurou determinar a relação existente entre os termos "substituição" e "demissão". Tentando contribuir, ainda que humildemente, para tão momentosa discussão, eis o que eu diria se fosse um hermeneuta:
Dificilmente poderemos admitir uma relação de sinonímia entre substituição e demissão, mesmo que a segunda possa implicar (o que não é necessariamente certo) a primeira.
Substituição remete-nos para uma neutralidade do acto, uma acção formal que não desvela imediatamente as suas razões nem as motivações do autor, ou, se quisermos retomar as dicotomias heraclitianas, uma "leveza" que abstrai daquelas razões e motivações, centrando a intencionalidade do acto num sentido prospectivo, que por aí se torna essencialmente em expectativa e abertura. Os juízos que possam recair sobre a substituição tomarão como referente principal a performance (esperada ou já actual, consoante o momento em que se façam) da entidade substituinte, e a entidade substituída servirá apenas, se tanto, de termo de comparação.
Diversamente, a demissão (seja por iniciativa do próprio, seja por determinação do seu superior), na medida em que significa sempre uma patente inadequação do titular ao cargo, é já carregada de sentido autónomo, de uma dramaticidade que reivindica razões e motivações (as quais podem ser as mais diversas), ou, no esquema de Heraclito, do "peso" inerente a todo o olhar presente que se debruça sobre o passado, em retrospectiva absolutamente livre de qualquer futuro e, por isso, insusceptível de redenção.
Daí que se compreenda, neste contexto, a frase de Humberto Delgado, a quem certamente nunca passaria pela cabeça dizer, de Salazar, "obviamente, substituo-o".
A mostrar a leveza do conceito de substituição está também aquela história engraçada do rapazinho que, perguntado pela professora da escola primária acerca da profissão da mãe, insistia em responder (com inteira razão, aliás, como se viria a verificar) que a mãe era substituta. Mas isso fica para uma próxima.
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