DIAS FELIZES:O homem não conseguia perceber: pensava nela todos os dias mas demorou três anos até conseguir voltar ao cemitério. E o que não conseguia perceber era porque é que a ida ao acampamento dos mortos lhe custava tanto, quando todos os dias em que metia a chave na porta a mulher morta o acompanhava. Quem não fez este curso julga que recordamos por secções, como quem reza à noite antes de ir dormir. O homem não recordava nada. Ela é que o chamava sempre que a filha sorria igualzinho, sempre que fazia a barba e reparava na borda do lavatório, no imenso espaço vago deixado pelos boiões de cremes e frascos de bolas de algodão. Trocou de cama e de carro o que lhe aliviou o cheiro do rasto, mas cada centímetro da casa era uma fotografia.
Assim, porque raio a ida ao cemitério nas ocasiões oficiais o incomodava tanto? Só ele saberá. Suspeito que esse incómodo, comum, diga-se, desliza de uma marca temporal: recorda-nos não quem perdemos, mas o primeiro dia do calvário. Obriga-nos a imaginar como era boa ( e não o sabíamos) a vida antes desse dia.
Caro Filipe, Porque será na recordação de algo que acabou (e não falo só da morte) recordamos sempre a última cara que vimos? Porque será que essa memória nos chama aqui e ali recordando-nos o que esperávamos dela, o conforto daquilo que tinhamos por garantido e, por isso mesmo, nunca valorizámos. Porque será que a mente se alimenta de outras mentes?
"DIAS FELIZES" Antes dos "cursos" havia dias felizes: dias ensolarados de Outono, dias frios de Inverno.
Depois...depois é a ansiedade mal se pressente o fim do verão, o aproximar dos "dias felizes"!
Caminhar à chuva deixou de ser um momento de feliz rebeldia! Andar de descalça uma interdição! Mal se sente o chão frio "escuta-se" a recomendação de outrora "não faças isso que faz-te mal". Obedeço (agora) a uma voz inaudível. Gostei do teu "DIAS FELIZES" e vai daí, num impulso, escrevi (1.ª vez) este comentário. Anonymous! Não somos todos?!Os que frequentaram o "curso" ...
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