SOCIOLOGIA E PSICANÁLISE: Li um artigo de Maria Filomena Mónica no Mil Folhas sobre os versos de Boaventura Sousa Santos; não, sobre as condecorações de Boaventura Sousa Santos; não, sobre o que Eça escreveu sobre Boaventura Sousa Santos; não, sobre a traição de Boaventura Sousa Santos à memória dos mortos da Guerra do Peloponeso; não, sobre as motivações que não levaram Maria Filomena Mónica a escrever sobre Boaventura Sousa Santos; bem, sobre alguma coisa relacionada com Boaventura Sousa Santos.
Sou ninguém para discutir a crítica literária de Maria Filomena Mónica e sou menos ainda para escrutinar os desejos profundos das suas análises. Mas há uma questão interessante. O artigo cita uma passagem de um livro de Boaventura Sousa Santos que diz assim:
"Neste capítulo, concentramo-nos numa questão específica: as relações entre o Estado e a pluralidade de direitos que, reconhecidos ou não oficialmente, regem os conflitos e a ordem social. Apesar de o paradigma normativo do Estado moderno pressupor que em cada Estado só há um direito e que a unidade do Estado pressupõe a unidade do direito, a verdade é que, sociologicamente, circulam na sociedade vários sistemas jurídicos e o sistema estatal nem sempre é, sequer, o mais importante na gestão normativa do quotidiano da grande maioria dos cidadãos".
A articulista ilumina-nos então sobre "o desejo subjacente a este olhar":
"Pode parecer uma afirmação factual. Mas, subjacente a este olhar, está o desejo de legitimação de práticas legais 'alternativas', com raiz numa espécie de colonialismo invertido. Segundo esta corrente, a justiça dos brancos está manchada pelo pecado original do imperialismo; a dos nativos, porque mais genuína, é evidentemente melhor".
O Luis Rainha não vê lá nada disso. Eu também não, mas não sou sociólogo, nem me dedico à psicanálise da ciência. Por isso, é sempre bom presumir a própria ignorância, e não a alheia, sobretudo quando se está arredado do grande Salon da Capital: alguém me pode indicar uma obra, ou mesmo uma página de jornal, de Maria Filomena Mónica, onde a socióloga trate o problema da unicidade / pluralidade dos sistemas normativos (formais ou informais) dentro do Estado? É um tema que me interessa muito - e sempre poderia confrontar a sua visão das coisas (isenta, certamente, de qualquer "desejo") com a de Boaventura Sousa Santos.
Actualização: Ver também, em particular, o post do JPT no Ma-Schamba.
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