O PRECEITO DE DELEGAÇÃO:"De saber que os infiéis podem dividir-se em duas categorias. A primeira é a daqueles que habitam os seus próprios países; neste caso a guerra santa é um preceito de delegação, isto é, basta que os crentes que estão com eles a façam (...)." Esta configuração da jihad renega uma parte da sua origem etimológica e mística - esforço, superação - para acentuar o rebordo bélico. E é curiosa, esta configuração, porque na época em que foi escrita ( século XVI) e no território (o Malabar, grosseiramente, a costa ocidental da Índia) que descreve, os infiéis contra quem Zinadím incita à guerra santa são portugueses, cristãos, logo um dos povos do Livro, aos quais era permitido o livre exercício do culto. Recordo-me de um dia ir ao volante do meu carro, em pleno período de discussão sobre o Islão, e ouvir na TSF o Claudio Torres ( arquéologo em Mértola e aderente, parece que é assim que se diz, do BE) explicar , indignado, que a história das invasões muçulmanas da península ibérica estava mal contada, porque "eles tinham sido convidados a cá vir". Não que me espante, longe disso, com a desonestidade intelectual alegremente praticada nos meios académicos: o que me preocupa é a ignorância que ela fornece. Ocorre hoje em dia em alguns círculos islâmicos, e refiro-me aos meios moderados onde pontificam K.A. Souroush, A. Malek e Fátima Midrissi, e também ao weblogestan iraniano, um debate interessante: é precisamente sobre a desconstrução ( ó ironia das ironias!) da jihad. Os radicais palestinianos, melhor dizendo, operando a partir das membranas palestinianas, apropriaram-se de uma interpretação holísticamente bélica do conceito, mas históricamente sólida da jihad. Esta leitura foi bovinamente - roubo o arroubo aos amigos do Blasfémias - aceite por muitos intelectuais ocidentais, e criou (e cria) imensas dificuldades aos meios islâmicos moderados, sobretudo os universitários e literários. Tanto é assim, que o apelo de Zinadím feito no Malabar do século XVI, é precisamente o mesmo que Bin Laden, Hassan Hattab, Djamel Berghal e outros confessos seguidores da doutrina salafita ( a actual, pois que existiu outra com o mesmo nome, e moderadíssima, a de Al Afghani e demais companheiros do jornal Al-Urwa, no século XIX) dirigem hoje aos muçulmanos que residem na Europa: combater os infiéis, mesmo nos seus próprios territórios.
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