GUANTANAMO (III): THIS IS AN EX-PARROT!: A discussão sobre Guantanamo regressou aqui à nau, neste fim de semana, por causa de um post de Luciano Amaral, n'O Acidental, sobre a afirmação da Amnistia Internacional que chamava a Guantanamo "o Gulag dos nossos tempos". Depois, Luciano Amaral escreveu um texto, mais longo, onde explanou a sua a opinião sobre o problema jurídico e político de Guantanamo. Foi bom, porque mostrou que Guantanamo pode ser discutido para além da inexactidão das comparações com outras atrocidades. Comecemos pelos pontos em que todos estão de acordo e que não vale a pena continuar a debater: 1) Guantanamo não é, evidentemente, um Gulag; 2) os detidos encontram-se privados de vários direitos e garantias que o direito internacional e o direito americano concedem a quem está preso; 3) os países em guerra têm o direito de encarcerar os seus inimigos. A partir daqui, o texto de Luciano Amaral é um espelho fiel da ambiguidade com que a administração americana encara o problema e termina com invectivas que só inibem os timoratos. É verdade que o direito da guerra permite o cativeiro dos soldados inimigos, como medida de segurança (lato sensu) para que não retomem as armas, sem qualquer ligação com uma investigação, acusação e julgamento penal. Pertencer ao exército inimigo não é um crime. Por isso mesmo é que, nos exemplos apontados por Luciano Amaral, as potências aliadas libertaram os prisioneiros sem acusação - excepto nos casos em que havia crimes de guerra e contra a Humanidade - logo que cessaram as hostilidades. Isto é direito dos conflitos armados e é uma conquista inestimável do direito em face da alternativa possível: matá-los. Mas, ao que se sabe, os prisioneiros de Guantanamo estão detidos, não por serem soldados inimigos, como Luciano Amaral bem sublinha, mas porque se suspeita que pertençam a uma organização terrorista. A simples participação numa organização terrorista, ainda que sem participação em concretos actos de terrorismo, é crime em todo o mundo ocidental (EUA incluídos). Por isso, não é nada "ridículo" exigir que sejam formalmente acusados e julgados por esse crime, com as garantias aplicáveis ao processo penal comum. De contrário, se as autoridades americanas os considerarem como presos de guerra, detidos por meras razões de segurança (e não como presumíveis autores do crime de organização terrorista), não podem deixar de lhes aplicar a 3ª Convenção de Genebra e o restante direito humanitário, onde se prevê expressamente, entre outras coisas, que os presos de guerra não podem ser torturados nem submetidos a qualquer método coactivo de obtenção de informações. Agora, o que é absolutamente ilegítimo é inventar uma "adaptação do estatuto" dos prisioneiros de guerra (os tais "combatentes inimigos") de maneira a impedir, simultaneamente, a aplicação das garantias comuns e das garantias do direito da guerra. O Reino Unido tentou algo de semelhante com o Anti-Terrorism, Crime and Security Act de 2001 - e a vetusta Câmara dos Lordes considerou (por 8 votos contra 1) que o encarceramento indefinido dos detidos violava os direitos democráticos e as obrigações internacionais do Estado, como comentei aqui em Dezembro passado. Ora, Luciano Amaral, que é um amante da liberdade, sabe que as restrições e privações da mesma só são legítimas quando se fundam num título válido. E não ignora que, quando alguém pretendeu sair da regra, invocou sempre os superiores interesses do Estado (da Nação, do Povo, da Revolução, etc.). Mas, mesmo assim, acha Guantanamo "legítimo". A ideia, em si, é perigosa. Um Estado que não respeita o (seu próprio) direito, não tem autoridade para exigir dos cidadãos (e dos outros Estados) que o façam. Ao contrário do que possa parecer, as "medidas excepcionais" para reforçar a ordem, ao instaurarem uma lógica de Faustrecht, transformam-se sempre em sementes de anarquia. Mais perigoso ainda é não querer perceber que a denúncia de Guantanamo é (ou pode ser) uma luta pela liberdade. E enquanto a civilização ocidental não conferir a Luciano Amaral, e a quem, como ele, acha Guantanamo legítimo, o alto encargo de a representar em exclusivo, eu, que não me considero decadente nem apóstata, continuarei a dizer que Guantanamo é semelhante ao Gulag, não, repito, num registo denotativo, mas no sentido de que ambos remetem os indivíduos para uma não-existência jurídica. Num Estado de direito, isso é inadmissível. A terminar, lembro uma ideia que já vem de Aristóteles, mas que Pascal sintetizou de forma exemplar: não há razão para censurar mais aquele que age com a consciência do Mal do que aquele que age mal porque não conhece o Mal da sua acção: a culpa deste reside precisamente na sua cegueira perante o injusto. É por isso que o Inferno está cheio de belíssimas intenções. Enfim, se o Luciano Amaral me mandar pentear macacos, eu irei. Mas não sem que antes me devolvam o dinheiro que paguei por este falecidíssimo papagaio. ADENDA: Caro Luciano Amaral, cá recebi a declaração de óbito e fico à espera da resposta. Profundamente sensibilizado por, na sua peculiar divisão do mundo, não me incluir no grupo daqueles a quem manda pentear macacos, convido-o a, se lhe apetecer, aproveitar para explicar a frase "lá vai insistindo na coisa, mas já com muitas qualificações", atendendo ao que escrevi aqui, aqui e no presente post. Bem sei que, uma vez escrito, o texto é dos leitores, e não do autor, mas escaparam-me tais inflexões.
são capazes de me exlplicar como conseguem responder com tanto salamaleque a alguém que faz exercícios retóricos gratuitos?
Que significa tudo o que ele escreveu quando assenta os aregumentos nesta afirmação:
«As pessoas detidas em Guantánamo não são soldados, mas fazem parte de uma organização que matou 3.000 civis em Nova Iorque, mais não-sei-quantos milhares no Quénia, no Iraque e em Bali e por esse mundo fora»
Vocês comprovaram as fontes do LA ou tomam-no por um agente secreto infiltrado na blogosfera?
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