SABER COMER: Durante onze anos a porta do G. tinha-lhe sido barrada. Até que um dia, por sorte, alguém se distraiu e ele entrou, feliz e ufano, sentando-se na primeira mesa que viu livre e pôs-se à vontade, casaco lustroso nas costas da cadeira e colarinho desapertado, gravata à banda. Acendeu um cigarro e pediu "vermute" ao incrédulo empregado, ainda confuso com a presença do boçal. Feliz da vida, demorou-se na ementa o tempo necessário para limpar, com o mindinho, os orifícios auriculares e fez o pedido pelos preços mais altos, com excepção do vinho. Enquanto esperava pela sopa que se lhe havia de secar nos bigodes até ao café, olhou sorridente e orgulhoso pela sala, enquanto com o indicador limpava o salão. Pediu tudo e tudo rapou com sofreguidão, embora pensando que a perdiz não se chegava aos calcanhares do frango da Tasca do Zé de Além. Não quis sobremesa e optou pelo café directo, que estranhamente lhe soube à sopa. O anelar e o médio esgravataram freneticamente os dentes mas não foram suficientes para a missão pelo que teve de pedir alto, fazendo o gesto esclarecedor, um palito, que saltitou sozinho de um lado para o outro da boca aberta todo o tempo que demorou a trazerem-lhe a conta, para inspecção minuciosa. Arrotou três vezes e por três vezes pediu, educadamente, licença à mesa do lado. Escorropichou o JB e pagou espalhafatosamente em dinheiro. À saída quis-se pôr a fazer um enorme balbúrdia no meio da rua, para mostrar com estardalhaço que tinha finalmente conseguido almoçar onde sempre lhe tinha sido vedada a entrada. Felizmente veio a polícia e proibiu-o.
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