HISTÓRIAS DE COCAÍNA - parte I: Pouca atenção foi dada à apreensão de 4 toneladas de cocaína em Almeirim esta semana. O Ricardo Dias Felner, no Público de ontem, depois de uma apetitosa chamada de 1ª página, limitou-se ao acontecimento em si. Mas há mais, muito mais. Depois de já aqui no Mar Salgado ter maçado por várias vezes os leitores com as travessuras dos manos Arellano-Félix , do grupinho Zambada-Garcia, do ópio afegão e dos nossos antigos negócios em Macau e Goa, aqui vai mais texto, apenas entretido, dada a exiguidade do espaço e da forma. Portugal é mencionado pelo menos desde 1994, como um importante apoio ao tráfico mundial de drogas ilícitas, mas tratarei neste post apenas da cocaína. No ano passado, o relatório do INCB ( International Narcotics Control Board) indiciava Portugal e a Espanha como os principais pontos de entrada de cocaína na Europa: 5% do total da cocaína apreendida em todo o mundo A policia espanhola apreendeu a 13 de Julho de 2004, em águas internacionais ao largo de Faro, quatro toneladas de cocaína, que rivalizam com a apreensão lusa desta semana. Estes números são espectaculares, mesmo se comparados com os americanos. Por exemplo, e segundo a DEA, a recente ( durou 27 meses e terminou a 13 de Junho) Operação Mallorca, que atingiu Gabriel Martinez e Edgar De Castro, conseguiu 947 kg, a Operação Trifecta, em Dezembro de 2001, na costa mexicana do Pacífico 9,2 toneladas; a Operação Santuário desmantelou um cartel colombiano-libanês e apreendeu 2,89 toneladas de cocaína. Os europeus andam normalmente longe destes números: um veleiro com bandeira do Belize e que tinha feito escala nos Açores, foi capturado em Brest com 1,194 kg ( ver história completa na Lettre International des drogues nº4 janvier 2002), enquanto que no aeroporto de Fiumicino, em Roma,em Maio de 2003, foram apreendidos 100 kg de cocaína pertencentes a uma organização italo-colombiana. Para terem uma ideia da importância dos números ibéricos, a totalidade da cocaína apreendida em 2003 na Eslovénia foi de apenas...30kg. Portugal esteve envolvido no esquema montado pelo antigo chefe da segurança peruana, Vladimiro Montesinos. Este camarada trabalhava com carteis peruanos e panamianos, e durante os anos 90 transaccionou enormes quantidades de cocaína para o famoso cartel de Tijuana. Montesinos era assalariado da CIA mas fazia um pé-de-meia interessante: organizou o seu próprio cartel, Los Camellos, e enviou quantidades incalculáveis de cocaína para Portugal, Itália e Espanha, entre 1995 e 1999. Uma das consequências do americano "Plano Colombia" dos anos oitenta, entretanto baptizado em 2001 de ACI (Andean Counterdrug Iniative), foi o da absoluta militarização do combate ao narco-tráfico. Os dólares e os meios ( armas, comunicações, etc) americanos passaram a tomar partido na eterna guerra civil colombiana. As FARC ( Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia) , apertadas, mandaram as malvas os principios marxistas e no princípio dos anos 80 passaram a dedicar-se ao negócio da coca ( as FARC foram fundadas em 1964), que suporta anualmente cerca de 30 a 40% do seu orçamento. Uma das consequências interessantes foi a a eliminação dos chichipatos ( literalmente, "gente sem importância"), pequenos intermediários que recolhem a pasta de coca nas plantações, com medo que estes tivessem sido corrompidos pelos dólares americanos e passassem a ser informadores. As FARC especializaram-se na recolha e mais tarde na transformação da coca, tendo recentemente procurado estreitar ainda mais os laços com redes internacionais de armas e de terrorismo internacional, como mostra a detenção na Colômbia, em Abril de 2001, de Fernandinho Beira-Mar, um dos maiores traficantes do Rio de Janeiro. E sabem o que estava Fernadinho a fazer na Colômbia? Tinha ido negociar o empréstimo às FARC, dos dólares necessários à compra de 10,000 Kalacnhikov importadas via Jordânia pelo antigo chefe do serviço de informações peruano...Vladimiro Montesinos. Portugal, com as apreensões verificadas este ano, demonstra estar definitivamente na rota preferida da mundialização do narco-tráfico - cada vez mais em simbiose com outros tráficos - sobretudo o da cocaína; existem muitas e boas razões para que tal aconteça, mas deixarei que quem de direito se pronuncie, pela minha parte farei apenas aqui e ali , alguma divulgação. Mas nada disto se trata de algo que não saibamos assimilar, pois que em tempos não muito distantes, fomos especialistas de renome mundial na matéria, lá pelas bandas do Rio das Pérolas e do Estreito de Malaca. O problema é que os tempos são outros, e agora são também outros que nos fazem a barba.
( a continuar)
Caro LNT/Tugir: make no mistake, as apreensões norte-americanas são enormes; o que eu quis dizer foi que mesmo para os padrões do Tio Sam, as apreensões ibéricas são ( demasiado) significativas. Quanto ao seu segundo ponto, lá iremos, na medida das nossas possibilidades e dos dados disponíveis...
Interessantíssimo Post. Só deixo uma questão. Será que o facto de não serem apreendidas tão grandes quantidades nos EUA se deve a haver menos tráfico (o que não parece se tivermos em linha de conta os dados relativos ao consumo e partindo do princípio que a produção é importada) ou às redes policiais americanas terem menos "capacidades" para efectuar as apreensões? Já agora caro FNV, dado estar tão bem informado em relacção a esta matéria, não poderá dar umas dicas sobre o destino e controlo da droga apreendida em Portugal? Abraço
Quantos dos seus seguidores é que Frei Maló vai conseguir colocar na lista do Avô do Pai da Neta
METE PROVIDÊNCIA CAUTELAR? VAI À GUERRA? MENDES É O REMÉDIO? ESQUECE AS DESILUSÕES E MANDA UMA CANHA? TEM SEMPRE O DOM LUIS? JOGA COM A PRATA DA CASA? VAI AO MERCADO E FICA COM O GESTOR? PEDE UM MILAGRE AO PADRE MARTINS?
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