MELILLA: Há muito tempo, na versão de Heródoto*, os Tereus fundaram no norte de África as colónias de Plátea e Cirene. Plátea é hoje a ilha de Bomba, ao largo de Tobruk, e a Cirenaica toda a gente localiza no mapa da Líbia. Embora de fontes obscuras, sabe-se que alguns tereus, gregos, foram forçados a partir ( guerra civil?) e a atravessar o mar. Depois de terem conseguido uma base em Plátea e instalar-se em Azíris, Líbia, os líbios convenceram-nos a partir, "iludindo-os com falsas promessas de que os conduziriam a outro lugar melhor". Os pobre tereus foram conduzidos de noite para não verem o quão bela e fértil era a região que atravessavam. Finalmente, foram deixados junto da fonte de Cire ( Cirenaica) e receberam dos líbios este interessante conselho: "Homens da Grécia, é para vós imperioso habitar neste local, pois é aqui que o céu se rasga". Os cireneus acabaram por entrar em conflito com os recém-chegados, e uma guerra entre os egípcios - aliados e protectores dos cireneus - e os gregos foi inevitável. Hoerner explicava de forma original o problema membranoso: os territórios têm limites naturais que, institucionalizados, tornam-se fronteiras; mas seja qual for a natureza da fronteira, existem sempre territórios...transfronteiriços. De onde eu parto, a noção de território é sobretudo a de um espaço de inscrição: do poder do Estado, dos interesses e da actividade identitária dos que o reclamam, mas também da História e dos seus humores. Breve, o território é tudo menos uma unidade resgatável às certezas. Se o leitor olha para o problema de Melilla de forma lógica - é território espanhol, só lá entra quem eles querem - está no seu direito. Mas se vir o episódio com aquele espírito de contradição que Heidegger* dizia perturbar a sonolência da lógica, talvez perca o sono. O outro episódio, o narrado por Heródoto, só aparentemente é muito diverso do de Mellila, uma Plátea - base transitória - como outra qualquer. E há o mar, há gente a querer atravessar o mar.
*Utilizo a tradução de Maria de Fátima Silva e Cristina Guerreiro para o Livro 4º de Heródoto e a tradução inglesa de William McNeil do Wegmarken, para Heidegger.
Deixo uma sugestão aos autores: que tal mudarem o template deste blog? É cansativo ler textos longos numa coluna tão estreita e sem parágrafos justificados...
ó bekx és esquisito!!! Ainda bem que alguém aborada este assunto, há algum tempo atrás não se falava de outra coisa senão "Guantanamo" e "Gulag", e agora estava a ver que não se levantava uma voz para falar de pessoas anbandonadas em pleno deserto por entidades oficiais. Será só porque melina, não é território norte americano, nem se situa em Cuba?????
Que fazer, então? Abrir por completo a membrana (que nesse caso deixaria de ser uma membrana)? Ou alargar a membrana até à fronteira de Marrocos? Esta solução teria a vantagem de ser, na prática, o primeiro passo da integração europeia de Marrocos (inevitável, depois da Turquia). Mas o problema está lá sempre: a Europa tem condições para receber dignamente todos os que lhe batem à porta? Perguntar não ofende.
Caro Pedro: é precisamente perguntar que é preciso. A coisa pode ser posta assim: a Europa tem condições para bloquear a entrada a todos os que lhe batem à porta? Se sim, com que consequências? Tentarei acompanhar-te nos próximos dias.
Estão também sudaneses, por exemplo, autênticos refugiados políticos, naturais regimes onde acontecem as maiores atrocidades.
Eu pergunto: mais uma vez, onde está França, que tem responsabilidades importantes directas nesse país? Já estabeleceu algum plano de ajuda humanitária de integração dessas pessoas depois de abandonadas no deserto?
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