SÍNTESE DAS LIBERDADES: Meu querido Filipe, não precisavas de "treplicar" porque eu nem tinha visto os vossos textos antes de colocar o meu (como estás fartinho de saber que acontece invariavelmente) pelo que eu não me estava a meter na vossa conversa. Seja como for, se se trata de uma questão de abecedário, tens toda a razão; se se trata de uma questão numérica (25), estamos empatados.
Mas parece-me que a coisa é ligeiramente mais complicada do que isso: não pode ser reposta uma liberdade que não existia e da última vez que o país tinha conhecido verdadeira liberdade - ou algo que minimamente se assemelhasse - ainda éramos uma monarquia e o partido republicano concorria livremente às eleições.
Nem a I nem a II república foram adeptas da liberdade e, em boa verdade, o período compreendido entre o vinte e cinco do quatro e a data que hoje se comemora também não teve nada de liberdade.
O vinte e cinco do quatro acabou com a guerra, acabou com as colónias, acabou com o regime anterior mas não nos veio dar de imediato qualquer liberdade porque quaisquer uns poderiam ir cair tombados ao Campo Pequeno, não pelos chifres dos touros de que nós dois tanto gostamos mas pelos cornos de verdadeiros imbecis que, incapazes de produzir uma frase em condições, achavam que resolviam as questões com discursos carregados de "pás", pelotões de fuzilamento ou, na situação que se pretendia, uma bomba naquele belíssimo recinto.
O país viveu um período de libertinagem (não confundir com liberdade) que certamente terá sido muito agradável para jovens entre os 16 e os 25 anos (eu deveria ter achado o máximo!...) e para a esquerda mais trauliteira que havia, mas não podemos confundir isso com liberdade (ou democracia) e ainda estamos a pagar muitas das facturas do disparate.
Em 1969 não havia liberdade, como todos sabemos, mas em 1975 não havia muito mais. Imagino que, por diversas razões, não te tenham entrado pela casa a perguntar "quantas famílias poderiam aí viver" mas olha que na zona da Sé Velha, em Coimbra, a coisa era mais complicada e assustadora. Foi já no fim da faculdade que consegui rir com pessoas da zona sobre esses tempos (no velhinho café Oásis), sobre a forma como nos tratavam bem e, dias depois, nos passaram a odiar e a tratar mal sem qualquer razão, ou sobre quando antes eu passeava ali, em criança, na maior das facilidades, a qualquer hora do dia e da noite, e de repente tudo era um susto. Hoje é também engraçado beber uns copos no Quebra-Costas com a malta dessa zona e relembrar esses dias, em sã confraternização. Mas na altura aquilo metia medo, acredita.
Claro que as eleições são sempre importantes; no antigo regime já se sabia isso (e por isso se promoviam aquelas ficções). Acontece que as eleições de 1975 não foram feitas em plena liberdade (provavelmente, concedo, não poderiam sequer ser feitas dessa forma), como o demonstra o execrável prefácio da nossa Constituição. De forma que não posso aceitar que esta data que hoje (ontem) se comemorava tenha reposto a liberdade porque a população portuguesa já nem se lembrava de ter assistido a algum momento de verdadeira liberdade. Esta foi a data que em que nos permitiram a liberdade, coisa que é muito diferente.
Meu igualmente muito querido companheiro Vasco ( eheheh...):
A tréplica era relativa ao post do nosso neo-papá, mas ainda bem que escreveste, porque escreveste muito bem, sobretudo para recordar a alguns a matéria desses dias de medo. Em minha casa, no antigamente, não "cabiam famílias", mas no consultório do meu pai, por exemplo, couberam vários médicos que estavam impedidos de exercer, ou seja, de ganhar a vidinha (por exemplo o ex-bastonário da Ordem), porque tinham dito coisas que não deviam ( não eram propriamente terroristas). Trocamos mais cromos à mesa, depois de um belo capão assado ( faço kms por uma coisa dessas)? Um abraço benfiquista.
Caríssimo, mete-te no carro e ruma ao norte. A tua formação nunca ficará completa sem experimentares as iguarias do Se Senta Se Tenta e eu não me importo de dividir contigo o privilégio de andar a experimentar a futura lista.
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