SILÊNCIO MORTAL: É o que se ouve numa praça, antes da morte do touro. É o respeito. Uma corrida de toiros é um espectáculo brutalmente violento. É o espectáculo violento por excelência, uma vez que os massacres, as guerras, as violações de crianças e os assaltos a velhinhas não são produzidos como espectáculos. O propósito de uma corrida não é o de matar um animal. O propósito de uma corrida é o de tornar esse sacrifício uma arte e, naturalmente, uma técnica. Quem negar a brutalidade da corrida é um demente. Acusam-nos de barbaridade porque o progresso de uma civilização mede-se pelo respeito com que tratamos os mais fracos, cabendo neste grupo os animais. Logo, matando animais espectacularmente e tirando gozo disso, somos bárbaros. Pequena confusão à vista. Numa corrida, todos os seres humanos são tratados com cortesia e respeito, o que não é coisa comum na fábrica social. Resta o animal. Pois bem, uma corrida não pretende o sofrimento do animal, pretende a sua morte, que é uma coisa diferente. Todos morremos, o toiro bravo morre num enlace artístico e técnico. O toureiro também, como no quadro de Manet " O Toureiro Morto". Há quem não seja sensível aos dispositivos técnicos e a arte do toureiro; ou quem julga que o público apenas se diverte com a morte do toiro. A esses nada tenho a dizer. A brutalidade da corrida assenta na ideia de morte como inevitável, mas merecida. Isto é o que fere a cultura urbana, na qual a morte ou é inútil ( por um punhado de dólares) ou vergonhosa ( a da criança às mãos de quem a devia proteger) . A corrida confronta-nos com a nossa maldade, ensinando-nos a organizá-la e a civilizá-la: é um espectáculo cuidadosamente encenado, recheado de regras, vigiado por leis e julgado por observadores. A brutalidade e a violência são contidas por todo este aparelho normalizador, que ainda por cima exige, e ferozmente, muita arte ao toureiro. Tomara que toda a barbaridade que por aí grassa fosse como esta.
O mundo divide-se entre os que não aceitam que uma morte, seja ela qual for, seja transformada num espectáculo, e os outros. Permitam-me a caricatura da dicotomia mas isto diz tudo do carácter dos outros...
Se há coisa que me deixa triste, é ver pessoas dizer quando um toureiro é colhido: `"É bem feito. Ñinguem o mandou mal tratar o touro." Primeiro a vida humana e depois a do animal. Mas isto sou eu....
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