"ISLÃO MODERADO": O José Pacheco Pereira ( JPP, www.abrupto.blogspot.com) tem dito e escrito que não existe, que é uma ficção, até porque se existisse teria saído à rua condenando os desmandos do outro Islão, o radical. Se JPP quer dizer que não existe um estado islâmico moderado que não se tem demarcado dos outros, dos radicais, é uma coisa; se JPP quer dizer que não existe "Islão" moderado, é outra. E está errado. A moderação islâmica , como a entendo, significa a existência de um corpo de pensadores - intelectuais, eruditos, universitários - que recusa o ensimesmamento anti-moderno da nova vaga radical. Não são suficientemente visíveis? E porque não torná-los visíveis? Recordo-me de uma vez ter proposto ( a título de provocação para o debate, bem entendido) a eurodeputados, inclusive a JPP, a atribuição do Prémio Shakarov a Karim Abdel Souroush. Não era isso que a Europa livre e os EUA faziam com os intelectuais " moderados" do mundo comunista? Na literatura e nos blogues também podemos ver o tal Islão moderado. A Banipal publica regularmente muitos autores com uma visão livre do mundo. Saadi Youssef, escritor iraquiano hoje com 72 anos, traduz Cavafy e Orwell e intitula a seu último conto - precisamente publicado na Banipal de Setembro de 2004 - com a declaração certa: " I trained myself to be free ". No Egipto, Heba Qotb iniciou há semanas o primeiro programa de sexologia do mundo árabe. O programa chama-se Kalam Kebeir, ou seja, "Conversa Séria". E é . O Islão moderado não sai à "rua"? JPP sabe tão bem ou melhor do que eu que, em certas alturas e em certos lugares, não se pode sair à rua. Talvez fosse bom a "rua" ir ter com ele, com o Islão moderado.
Muito bom post. Só pergunto uma coisa: em que medida os muçulmanos moderados são realmente muçulmanos? Este conceito de moderação é profundamente ocidental: pressupões que é possível viver "moderadamente" uma religião, ou seja, separar a fé dos outros ou, pelo menos, de alguns dos outros aspectos da vida. O Islão não tem esse conceito. É-se muçulmano ou infiel, não há meio termo. O que explica muito facilmente porque é que a "rua árabe" não distingue "cristãos" de "ocidentais" e queima a efígie do Papa com a bandeira da América. Assim sendo, não sei se os teus moderados representem mais qualquer coisa do que eles próprios, ao contrário do Sakharov.
E muito boa pergunta. Tem sido precisamente isso que me tem interessado e sobre o qual tenho escrito : pode haver uma via moderada, secular, ou moderna no Islão actual? Lá irei. abraço, Filipe
E muito boa pergunta. Tem sido precisamente isso que me tem interessado e sobre o qual tenho escrito : pode haver uma via moderada, secular, ou moderna no Islão actual? Lá irei. abraço, Filipe
E estou de acordo com o Pedro. Ainda ha´bocado estava a dizer isso ao José lá no Cocanha e ao Paulo do Misantropo.
Também não me agrada essa palavra de islão moderado. São todos fundamentalistas. A diferença é que nem todo o fundamentalismo tem de aderir a jihads ou ingressar em facções terroristas.
Já agora, também existem judeus ortodoxos e, por acaso, é precisamente essa ortodoxia e fundamentalismo que faz deles por vezes bem mais moderados poliicamente que os outros...
Um excelente post, e a assunção, por parte de alguns comentadores, que o bilião de muçulmanos é integralmente fundamentalista ou, então, secretamente ateu, tal como o desconhecimento das evolução legislativa e social em Marrocos.
a grande questão é que o islão tem muitas correntes e diversos guias. Nem tem uma "cabeça" como o Papa. E é nessas variantes que existem dissidências, podendo na mesma serem fundamentalistas (do ponto de vista teológico) mas não necessariamente belicistas.
A palavra "moderado" está mal aplicada porque mistura o comportamento civil com a fé.
O facto de alguns serem ou não serem ocidentalizados também pode ser acessório. O caso do Bin Laden, por exemplo- não podia ser mais "ocidentalizado" e no entanto sabe-se o resto...
E o problema deste debate e de textos como o do JPP está no facto de misturarem um discurso teológico onde existe uma demarcação da Igreja Católica e uma afirmação sa superioridade Católica (o que é a obrigação do Papa) com uma prática política intervencionista que quer agora vir à boleia.
Texto certeiro e que coloca tudo no lugar certo é o do Dragão- Escol de Cadáveres.
Agradeço o debate e os comentários; várias coisas foram levantadas, as quais tenciono abordar mais tarde. Por exemplo, porque razão o Islão não pode evoluir? Não aconteceu o mesmo a outras religiões que em tempos ditaram a vida pública em razão da fé? Algumas experiências ( umas muito antigas, outras menos) têm sido analisadas.
O mais importante deste post foi mostrar como pode ser muito mais interessante connhecerem-se os bons casos, do que nos satisfazermos pela negativa.
Foi um verdadeiro post cultural e anti-acédia.
ahahaha
Acho que é disto que mais se precisa. Se não podemos mudar o mundo, podemos ao menos divulgar os casos mais saudáveis. Para agravar boçalidade já temos os outros media.
É importante lembrar, como faz este post, que o preço da moderação tem custos elevados na "rua muçulmana". Faz lembrar a lei do silêncio na Sicilia mafiosa, a kale barroka no País Basco e outras manif's de indignação "popular" e "espontânea". A diferença é que além das cumplicidades, há reféns, misturando estado e instituições religiosas que deveriam ser as forças moderadoras por excelência. Porém, com a corrupção, nepotismo e sub-desenvolvimento a grassar na maioria das sociedades muçulmanas, a demagogia populista dos radicais facilmente ameaça essas instituições caso pretendam "moderar-se". Deste modo, essas forças "moderadoras" têm de alinhar nas condenações para não serem alvo. Ou seja, um problema mais político/social, que religioso.
Ou seja, um problema mais político/social, que religioso.
mas este é o problema da própria formação do fundamentalismo a partida de II G.Guerra. O fundamentalismo, a jihad, a Sharia e o atraso e falta de industrialização dos países islâmicos têm um peso muito maior que o estritamente religioso.
Porque aquilo a que denomina "islão fundamentalista e terrorista" é mais uma ideologia que uma leitura ortodoxa dos textos sagrados. São nacionalismos ideológicos que se se sustentam na religião (porque a religião domina a teoria nessas sociedades) como outros foram sustentar-se em doutrinas económicas e ateísmos.
Sem se entenderem estes aspectos sociais não se entende nada. Podiamos falar do islamismo como do hinduísmo e a coisa era idêntica.
Não é devido ao petróleo e à importância geo-estratégica e conflitos por esses motivos. Se assim não fosse o atraso não nos afectava e afectava-os mais a eles. Como afecta todos podem dar-se ao luxo de serem atrasados e fundamentalistas- enquanto nos tiverem na mão à custa do petróleo. E enquanto esse mesmo petróleo e a união contra o "ocidente" não causar mais dissidências internas.
Esperando e contando com a boa da porta-aberta ocidental. Aí é que ninguém toca. E aí é que é capaz de estar o maior problema.
Este é um aspecto pertinente: é a religião "em si" ou é a sociedade "islâmica" que travam o progresso (à boa maneira ocidental, reconheço) e facilitam a violência organizada? Talvez países como a Indonésia ou a Turquia possam dar pistas para uma sociedade maioritariamente islâmica e tendencialmente "ocidentalizada". Dar visibilidade aos "bons exemplos" como sugere o post, é promover escritores, cineastas, políticos. Premiar reformas "moderadoras" é, p.ex., colocar metas à Turquia para poder entrar na CE.
O Eisenstadt fazia uma boa leitura em "Fundamentalismo e Modernidade": a interpretação salvífica - da ideologia comunista e do fundamentalismo islâmico - permite uma negação das periferias ( universitárias, culturais, artísticas) ao mesmo tempo que impõe um projecto totalitariamente utópico e centralizado. Julgo que é por aí...
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