SERINGAS NAS CADEIAS III ( Recentrando o debate): As políticas de redução de riscos ( PRR) não são panaceias para o problema da droga. As PRR, desde os primeiros outreach programs de Chicago nos anos 60 até aos programas de troca de seringas nas cadeias experimentados na Alemanha, Suiça e Espanha do final dos anos 90, são uma forma de minorar os danos causados pelo consumo de drogas injectáveis. Para acabar com o problema da droga existem outros meios, desde o método maoísta na China da década de 40 do século passado ( desintoxicação a frio e depois bala na cabeça para os reincidentes) até à liberalização de todas as drogas, como entendem algumas cabeças. Pressupondo que porque alguém está preso, não deve deixar de aceder ao direito constitucionalmente consagrado do acesso à saúde ( não falo de ar condicionado), vamos ao debate. Os países não são todos iguais, as cadeias não são todas iguais, por isso parece-me um disparate a proposta portuguesa de arrancar com a troca de seringas em quatro cadeias simultaneamente: não temos os meios para tal. Seria muito mais razoável iniciar o projecto apenas numa cadeia. Os opositores ao programa não discutem as vantagens, discutem os efeitos secundários. Recapitulemos:
1) Risco de agressão - a pessoal e a outros reclusos - devido ao aumento do número de seringas em circulação.
2) Tensão entre drogados aderentes aos programas e o resto da população prisonal.
3) Alterações nos equilíbrios de poder devido ao facto de deixarem de existir controladores do material de injecção.
4) Pressão excessiva ( revista "dura") sobre os familiares/amigos que visitam os aderentes ao programa.
5) Problema epistemológico: é-se preso por crimes relacionados com droga e recebe-se seringas enquanto se está preso .
6) Aumento do número de utilizadores de drogas injectáveis em virtude do aumento de material de injecção disponível.
São muitos. Os dados das avaliações feitas até agora não indicam, no entanto, que estas objecções tenham razão de ser. Vejamos:
- O ponto 1: nenhum caso semelhante foi até agora relatado nas avaliações feitas aos programas em curso na Europa. Na Austrália, em 1991, o sr. Geoof Pearce, guarda prisional foi picado por uma seringa infectada e morreu. Não existia ( nem existe) programa de troca de seringas na cadeia onde a tragédia ocorreu. Na altura, o New South Wales Corrective Services conseguiu que fosse aprovada uma lei - o Prisons Syringes Prohibition Act - que oferecia uma pena de dois anos de cadeia a quem introduzisse seringas em meio prisional.
- os pontos 2, 3 e 4: a cultura de prisão tem os seus custos, independentemente da existência de um programa de troca de seringas. A revista dura, se feita a todos os visitantes, decerto que acabaria com a existência de droga ( e seringas) nas cadeias.
- o ponto 5: A vida é o que é. Se é certo que parece estranho oferecer seringas a reclusos, não o é menos que eles tenham acesso a todo o tipo de drogas. Empate técnico.
- ponto 6: Em lado nenhum do mundo se provou que aumenta o número de utilizadores de drogas injectáveis pelo facto de se fornecer material adequado. Em quase todos os países da UE existem programas de distribuição/ troca de seringas ( fora das prisões) e o numero de utilizadores têm decrescido ( em virtude da adopção de novos hábitos de toxicomania).
Na opinião de todos os que têm monitorizado estas práticas, a verdadeira objecção à implementação de um programa destes é simples: se o pessoal auxiliar e os guardas prisionais não estiverem racional e honestamente envolvidos, o programa falha. Rotundamente.
Penso que está a esquecer-se de um argumento contra a decisão do governo e que se prende com o facto de continuar a ser proibido o consumo e tráfico de drogas. Dee o governo dar como perdida a "guerra" contra o tráfico e consumo, assumindo que é incapaz de controlar a prática de tais factos.
Se não existissem drogas nas cadeias não teria escrito este post. Ora, se a lei não se cumpre - existem drogas e seringas nas cadeias -, porque raio é que tem de morrer mais gente? Apenas para podermos fazer de conta que a lei se cumpre?
Mar de opinioes, ideias e comentarios. Para marinheiros e estivadores, sereias e outras musas, tubaroes e demais peixe graudo, carapaus de corrida e todos os errantes navegantes.