UM NOVO PARADIGMA ELEITORAL? Em 2000, Karl Rove, o cérebro da política eleitoral republicana, afirmou que nessas eleições tinham faltado a Bush 4 milhões de votos da direita religiosa, que não se incomodaram em votar num candidato então aparentemente centrista. As eleições de 2002 e 2004 vieram provar que a sua aritmética eleitoral estava certa. A noite de anteontem feriu de morte esta estratégia política. De tão preocupados em segurar estes votos da direita religiosa, os republicanos foram alienando de forma bem perigosa o apoio dos independentes que em anteriores eleiçõs tinham garantido a sua maioria. O ambiente da América pós-11 de Stembro convidava a uma estratégia de clara confrontação política por parte dos republicanos (eletoralmente falando claro, outra coisa é avaliar se esta seria a táctica mais inteligente para combater o terrorimo). O centro assustado (essencialmente independentes moderados de classe média que habitam os subúrbios, os daily commuters) apoiava sem reservas uma política externa agressiva. Uma certa ideia difusa de fazer a guerra ao terrrorismo ao ataque tinha tomado conta dos espíritos da maioria dos americanos. Toda a retórica pré-guerra do Iraque, o apoio esmagador a essa opção (não esqueçamos que a maior parte do Partido Democrata apoiou essa decisão) devem ser entendidos nesse ambiente. Três anos depois, o panorama político mudou. A prolongada indefinição da situação no Iraque e uma série de acontecimentos internos (Katrina, na minha opinião, o momento-chave de viragem da popularidade de Bush, bem como a corrupção e escândalos que sempre florescem em períodos de poder absoluto) criaram um clima político anti-republicano. E fizeram com que o voto dos independentes fosse esmagadoramente na direcção dos democratas. Foi o centro político que deu a vitória aos candidatos democratas, como a direita religiosa a tinha dado aos republicanos em 2002 e 2004. Isto explica muitas das análises que sustentam um regresso dos moderados ao comando da política americana. É certo que os democratas escolheram muitos candidatos no Midwest e no Sul que são, na sua essência, conservadores políticos (pró-guerra, anti-aborto e nalguns acaso até anti-apoiso federal a programas de investigação que usem células estaminais). É óbvio que o Partido Democrata fez a campanha mais profissional desde há muitos anos - a maior prova desse profissionalismo foi o facto de Nancy Pelosi ter estado quase um mês desaparecida de palcos com visibilidade nacional para não assuatar o heartland. Com o poder vem a responsabilidade. Na noite eleitoral, Howard Dean afirmou na televisão que nunca foi objectivo dos democratas retirar do Iraque (esta afirmação provocou sorrisos e gargalhadas num estúdio de TV repleto de analistas que bem se recordavam do Dean candidato anti-guerra). Nancy Pelosi (uma personagem bem mais interessante e hábil do que a caricatura de esquerdista de São Francisco faz crer) tem feito afirmações na mesma linha, garantindo a cooperação estratégica e construtiva do congresso com o Presidente. Mais que um regresso da moderação à política americana (veremos, nos próximos tempso se é esse o caso) começou um novo tempo de refocagem no swing vote (que já não mudava há algumas eleições). Resta saber se e quais serão os políticos moderados a lucrar com este novo paradigma eleitoral.
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