DA CHAMADA "PARTICIPAÇÃO CÍVICA": Todos os dias, com o café do despertar, vagueio pela blogosfera para ler as pregações e os vitupérios de ambos os lados acerca do referendo sobre a descriminalização do aborto: adoro o cheiro a certezas logo pela manhã. Faz-me ficar mais desprendido para o resto do dia. E a vantagem é que vêm envoltas num regabofe porreiro. Já ninguém fala sobre a coisa propriamente dita - o que aliás se compreende, sendo um assunto complexo, desagradável e, digamos tudo, algo enfadonho. Ainda faltam 15 dias e, à conta do aborto, fazem-se boas piadas e discute-se com veemência esquerda / direita, Estado liberal / Estado social, os estudos que mostram que o feto tem vontade de fumar às 10 semanas, Estaline, cultura da morte, o Papa, a propriedade sobre o corpo, a recessão demográfica, dinheiro de abortos ilegais que não é tributado e financiamento das "campanhas" (surpreendentemente, ninguém ligou o referendo ao Apito Dourado, mas lá está: ainda faltam 15 dias). Tudo assuntos maravilhosos, que só estavam à espera de um pretexto para despertar o interesse geral. Alguém com tempo e conhecimentos de sociologia devia estudar o modo como tem sido feito o debate sobre o referendo e o nível da "participação cívica" (?) que somos capazes de oferecer. Anda por aí muita adrenalina carecida de emprego. Dá ideia que o pessoal precisa de umas eleições quaisquer (aqui ou no estrangeiro), da invasão da Coreia da Norte, ou, ao menos, de um campeonato nacional menos mortiço. Porque, se não me engano, do "debate" vai ficar um enorme paradoxo: numa única coisa o "Sim" e o "Não" concordam - o aborto é mau; mas ambos já transformaram o feto numa reles bola de futebol.
Obrigado por este post, ajudou-me a saber que não estou sozinho numa convicção politicamente incorrecta (da qual tenho tanto medo que quase receio pronunciá-la): não estou muito interessado no referendo, não acho que seja um problema que mereça sequer um décimo da atenção que tem e não compreendo porque está toda a gente tão irritada e entusiasmada. Mas lá está, deve ser culpa minha, ora porque não respeito o feto, ora porque não respeito o drama das mulheres.
Estou como o Miguel Sousa Tavares: depois de 11 de Fevereiro, não quero voltar a ouvir falar do aborto. Por amor de Deus!
Cheguei aqui via "Açores S.A.". De outra forma, não teria sido possível ter visto este magnífico post. Sobre o aborto tudo se tem dito, nada se tem discutido. Esgrimem-se argumentos semânticos e esquece-se o "abortado" ou o a "abortar". Como bem aqui se diz, o feto, o bebé, a criança que vai nascer, está a ser tratada como uma bola de futebol (isso para se ser simpático e não usar expressão mais violenta).
Olha que não, meu querido PC, olha que não. O feto não é uma bola de futebol, não é uma rolha de boa ou má cortiça, não é uma carica, não é uma borbulha nem um sinal e muito menos política e há algumas pessoas que estão a tentar dizer isso. No meio deta barulheira toda. Abraços amigos e passa o Douro mal possas para uma desgustação pantagruélica. Há novidades neste campo.
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