O DIÁRIO DO LEOPARDO ( XV): O torneio televisivo de ontem demonstrou que as filiações religiosas e políticas não integram de forma ordenada as hostes em contenda. Parece-me natural. Só a consciência de cada um - sinapses, matéria branca, livros, amores vigilantes, memória, decência - pode decidir o que seríamos capazes de fazer se estivéssemos no obscuro lugar ( o julgamento sobre o início da "coisa humana") do outro. Ou, kantianamente falando, quais as normas orientadoras das nossas acções que gostaríamos que se transformassem em leis universais. Já as voltas que cada um dá à sua consciência - como ontem se viu - de forma a harmonizá-la com o presente da escolha, é assunto de cada qual.
Não, Filipe, isto não é só uma questão de consciência porque há um terceiro envolvido, um terceiro que não tem voz e que não tem outra defesa além da lei. O que estamos a discutir é se essa defesa deve deixar de existir até às dez semanas.
Talvez, meu caro Pedro, mas esse terceiro ( expressão tão lupina como "coisa humana" ), blástula, mórula, ou seja lá ou que for, tem sido muito pouco defendido pela actual lei, como já deves estar cansado ( calculo...) de ouvir.
Tens razão, com essa da lupina. Não sei que outra palavra usar que não impeça logo a discussão (ou que não inicie outras discussões inoportunas). O Marc Bloch, um grande historiador, dizia que as palavras são como as moedas: à custa de serem muito usadas, acabam por perder o relevo. Já estou nessa fase.
A propósito de Bloch e de Freud, considerações sobre a morte. Se deixarmos de lado o dogma espermatozoidico, a ideia de matar uma forma de vida ( acto criativo de dois gâmetas) é aterradora, tens agora tu toda a a razão. Resta que essa definição divina arrasta a maldição de Cronos e do vómito do ophalos: e se tudo for um engano?
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