DESASSOSSEGO: Está a começar a irritar-me o posicionamento de muitos politicamente correctos que apregoam por aí que não importa se o Primeiro-Ministro é engenheiro ou torneiro mecânico, até porque as funções exercidas não necessitam de qualificação especial.
Admito que muitos torneiros mecânicos fossem melhores Primeiros-Ministros do que este que temos, seja ele ou não engenheiro. Acontece que o que temos, com o seu governo a reboque, anda por aí a encher a boca com a qualificação das pessoas, com a importância dos estudos, com a aposta na formação. A acreditar no que nos é vendido ao desbarato em cada esquina, como podemos levar a sério que nos pretendam dizer que a qualificação é tudo, por um lado, e que, por outro, ela não interessa nada tratando-se de exercer o cargo de Primeiro-Ministro? Parece que, para alguns, Primeiro-Ministro será das poucas funções relevantes para as quais não é necessária qualquer formação académica.
Mas a formação académica não se trata só de ser engenheiro ou doutor ou de ser tratado como tal - isso é para os que compram diplomas -; a escola universitária levada a sério revela um percurso de vida que terá servido para acumular conhecimentos e maturidade, bom-senso e sabedoria, coisas que muito dificilmente se conseguem adquirir em volta de um torno mecânico (mas que por isso mesmo mais valorizadas devem ser nesses casos).
Estas pessoas que pretendem defender o seu mais querido clamando que a formação académica não é relevante para o cargo que exerce fazem-lhe ironicamente o maior dos males pois é o próprio Primeiro-Ministro quem defende a qualificação académica como o maior dos bens: fá-lo defendendo politicamente a dita qualificação e formação como coisa fundamental e, em segundo lugar, encharcando as suas biografias com todo o tipo de cursos e cursecos de que se lembrou de ter frequentado, o que revela que ele próprio considerou importante mostrar ao país que tinha estudado qualquer coisita.
Eu não sei se a Universidade Independente é boa ou não, ou se tem ou não qualidades pedagógicas fora do comum (admito que as tenha, pois parece ter formado igualmente, também já em idade avançada, um insuspeito quadro de uma considerada instituição bancária). Do que me lembro, os cursos universitários já eram difíceis de tirar quando não tínhamos mais nada para fazer nem dinheiro para nos dispersar. A facilidade com que se conclui a licenciatura com uma secretaria de estado às costas (ainda que também no timbre do papel) não deixa de ser esquisita (e o facto do motorista nos transportar às aulas - outro ponto por explorar - não ajuda nos exames, diz quem cursou à sombra da Universidade).
Ao lado disto, as contradições e incongruências que os factos trazidos a público têm revelado provocam-nos a maior das preocupações e perplexidades. Devem ser raros os alunos que, neste país, em universidades privadas ou públicas, mostram um percurso tão confuso e atribulado, memória e registos tão apagados, rasurados ou manuscritos. A coisa não pode ser só atribuída à universidade, como agora se pretende. Sabemos bem que esta era tão ciosa que até tratava das burocracias de secretaria ao domingo mas, de todo o modo, não estou em crer que a Universidade Independente se tivesse lembrado de conceder uma licenciatura ao Secretário de Estado José Sócrates sem que ele tivesse contribuído minimamente - fosse de que forma fosse - para essa situação e agido nesse sentido. Se assim foi, não se trata da revelação de que se fizeram uns copianços nos tempos da juventude estudantil: a coisa é substancialmente grave, muito mais grave do que a notícia nunca confirmada de simples pândegas em S. Bento, e necessariamente com consequências, pelo menos, semelhantes.
Fontes próximas do Primeiro-Ministro dizem que este só vai falar depois dos resultados do processo feito à Universidade e que estes sairão na segunda-feira. A comunicação social engoliu a coisa sem sequer se questionar sobre o tempo recorde em que foi feito e decidido o tal processo e anunciada a data da publicação dos seus resultados. É fabuloso como ninguém se interroga sobre a facilidade de obtenção de resultados em tão pouco tempo, resultados esses cuja obtenção e apresentação é anunciada com uma antecedência ainda mais espantosa!
Longe do jornalismo de sarjeta, o DN de hoje fez o frete de anunciar as razões do Primeiro-Ministro (à parte todas as divergências de opinião, nunca imaginei Ana Sá Lopes neste triste papel, patrocinando ainda uma explicação esfarrapada de um copy-paste sem sentido) enquanto a RTP vai fazer o seu papelão habitual na próxima quarta-feira, entrevistando José Sócrates. Parece que ele vai mostrar os diplomas - que valem, neste momento, o mesmo que uma nota de três dólares - e refugiar-se nas burocracias e trapalhadas da secretaria da Universidade Independente para se defender, coisa que não nos interessa para nada. Ele tem é de nos convencer de que está a falar a verdade e de que tirou o curso com seriedade, o que não vai ser fácil face ao conjunto de factos já confirmados.
Num país verdadeiramente civilizado, só uma fenomenal demonstração do Primeiro-Ministro na RTP de que está completamente impoluto em todo este processo o impediria de ser corrido do governo da nação com os epítetos que estão a pensar; no nosso país - e com tristeza o escrevo - julgo que no final da propalada entrevista televisiva ficaremos todos com a convicção de que a sinceridade da sua grande aposta na formação, educação e qualificação das pessoas depende afinal do controlo do croupier da mesa de jogo. Rien ne va plus…
Remeto mesma opinião(s/o SrNÃOengº)p/5ºou6ºComents no blog "portugaldospequeninos" do JGonçalves,posted hj,em q ele transcrevendo o texto de ABarreto:«PRACE QUE FALTA».Midarte.
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