RAIOS PARTAM A CHUVA: Se a tradição meteorológica se mantivesse, por esta altura do campeonato já cá cantariam umas quantas saladinhas de batata. Só que elas pedem calor, verão, sol, tanto e tão forte que à noite nem têm o mesmo sabor. A verdadeira salada de batata só é apetecível ao almoço, exige uma prévia e bem definida quantidade de gins ou tarraçadas sucessivas de branco geladinho ao ar livre, debicando já algumas das azeitonas previamente roubadas na cozinha. Seja envolta em maionese ou com um certo molho avinagrado de gemas cozidas, azeite e mostarda, cuja receita não revelo, seja simples ou com feijão verde, mesmo até com uma cenourita, a saladinha de batata quer sol e come-se de dia. E com quê?, perguntarão os que ainda estiverem a ler. Com tudo! Não se pergunta o que a salada de batata vai acompanhar mas aquilo com o que ela será acompanhada. A saladinha de batata é o único acompanhamento qualificado como tal que não é verdadeiramente um acompanhamento mas antes a parte principal da refeição: ela tem a deliciosa característica de ser acompanhada, não de acompanhar. E aceita a companhia de qualquer um. Pois podemos acompanhá-la com umas costeletinhas de sardinha panadas, ora com uns filetiinhos de pescada fresca, ou pode mesmo, em ocasiões de mais gravata, ser cerimoniosamente servida acompanhada de um robalinho ou de uma daquelas pescadas que custam os olhos da cara, levemente cozida, porventura decorada com outra maionese acabadinha de fazer com gemas verdadeiras e amarelinhas, das que fazem a ASAE fechar casas magníficas, e polvilhada com as claras finamente picadinhas. Todos sabemos que namoriscam magnificamente com um arrozinho de tomate, que vivem em união de facto com o de bacalhau, que são também muito afeiçoados a um feijão fradinho bem temperado, mas o casamento perfeito dos bolos de bacalhau é com a saladinha de batata. Ah isso, venha quem vier. Requer tomates. Tomate vermelho, muito maduro, a rebrilhar no próprio molho com os cristais do sal grosso, a luz do azeite e o reflexo de um bom vinagre, fica sempre bem, ninguém duvida. Vem a propósito dizer que a saladinha de batata tem ainda a vantagem de se poder alargar o número de convivas sem se avisar previamente em casa e sem se ser crucificado pela omissão. Fundamental é que se faça sempre uma quantidade absurda, sem qualquer tipo de preocupações ou receios pois, se sobrar, no dia seguinte leva a acompanhar com um (bolas, ainda nem acabei de escrever e já me estou a babar todo) naco suculento de rosbife, extremamente mal passado, a esvair sangue vermelhinho para a manteiga castanha. Ou simplesmente bifes do lombo do boi, altos e vermelhos. Altos, vermelhos e bifes também os de atum são uma companhia magnífica para a saladinha de batata. Está cientificamente provado que o género humano é incapaz de se zangar se, durante a tarde, tiver a companhia agradável de uma saladinha de batata e de uma montanha de panadinhos de porco, devidamente temperados em marinada de nunca menos do que dois dias. A não ser que haja pouco, que é o que sucede na cantina da ONU. Já que falamos do simpático requinho, que dizer de um lombo do dito assadinho muito devagar, desde as oito da matina, carregadinho de molho, finamente fatiado, a acompanhar a saladinha? Ou dos coelhinhos do reco? Raios partam o diabo da dieta. E lá fora continua a chover.
Caro Vasco, que momento sublime de inspiração. O melhor post do ano...e se for preciso chover para continuares escrendo assim, ca em casa estou fazendo a dança da chuva. Cheers!!!
Eu estou de dieta. EU ESTOU DE DIETA!..mais um voto para o melhor post do ano. Não esquecer o verde (escuro)na saladinha em questão que lhe pode ser emprestado por uma salsa picadinha ou duas folhas de hortelã. E também não fica mal se lhe misturarmos um "trocitos" de pimento piquillo mas desta feita sem grandes molhos.
Descobri ao ler este texto, que sou sádico e masoquista, isto porque são 11 horas e cinquenta minutos, estou com uma fome danada e não consegui desviar os olhos do monitor. Gosto mesmo de sofrer. :) E passei o fim de semana a colher da terra umas batatinhas brancas "olho de perdiz", douradas, lindas, saborozíssimas, semeadas por mim e pelo tractor, sem recurso a químicos nem pesticidas. E um puré feito com aquele verdadeiro ouro da terra? Nem lhe conto, basta que seja um a penar. :)
Cedo na salsa, se picada finamente com as claras. O resto, pela preponderância de sabores que traz, tira à salada de batata o carácter cosmopolita, poliglota, a possibilidade de todos receber por companhia no prato, até ao caricato rissol, seja ele do que for.
Mar de opinioes, ideias e comentarios. Para marinheiros e estivadores, sereias e outras musas, tubaroes e demais peixe graudo, carapaus de corrida e todos os errantes navegantes.