MOMENTO DE ANTOLOGIA DO DISPARATE AUDIOVISUAL: Estou a viver fora de Portugal. O que me poupa ao bombardeamento quotidiano sobre as eleições intercalares no Concelho de Lisboa. Sou eleitor nesse concelho o que espero me coloque a salvo de ataques de bairrismo com que normalmente são brindados os que protestam contra a notória macrocefalia que se vive no País. Não tenho escrito no blogue mas ontem, através da net, apercebi-me que o debate dos candidatos à autarquia de um concelho com cerca de 500 mil habitantes (por volta de 5% da população do país) estava a ser transmitido em directo no horário nobre do principal canal de televisão público. Não me consigo conter. Porque é que os portugueses que vivem fora de Lisboa são obrigados a ter uma noite inteira no principal canal público (pago com os impostos de todos) ocupada com o debate dos candidatos à Câmara Municipal do Concelho de Lisboa? Não havia outros canais interessados? No cabo por exemplo? Ou o próprio canal 2, também público e (neste caso apropriadamente) destinado a minorias? Ainda por cima com as novas tecnologias podem transmitir-se eventos online costumizados apenas para os potenciais interessados (por ex. eleitores emigrados como este Vosso escriba) - como aliás a RTP ontem fez, o que torna ainda mais estranho e até redundante a transmissão via Canal 1 e RTP Internacional. Mesmo que a matéria interesse aos habitantes da Grande Lisboa (e é duvidoso que todos estejam interessados nesse debate tão parcelar relativamente aos seus problemas) isso abrangerá 20 a 25% da população do País. Claro que muitos poderão dizer que a Câmara Municipal de Lisboa é maior que muitos ministérios e que tem mais funcionários e um orçamento superior a muitos organismos do Estado. Mas isso diz mais sobre a má organização administrativa do Estado, o possível excesso de funcionários municipais e o mais que provável exagero de campos de intervenção da Câmara Municipal de Lisboa do que sobre a relevância da coisa. Estou certo que o futuro da Emarlis, da Gebalis, da Lisdesporto e do plano Baixa-Chiado e mais umas quantas siglas acabadas em lis deixaram em suspenso milhões de portugueses, no País e na diáspora, do Minho a Timor (como requinte sádico do disparate, o debate foi transmitido em directo pela RTP Internacional e RTP África). Eu não gosto muito de usar adjectivos deste tipo mas, para além de outras considerações, isto é essencialmente um acto parolo e pacóvio. Produzido pelas brilhantes e cosmopolitas mentes que comandam o nosso sistema político-mediático. Ortega Y Gasset dizia que o provinciano era aquele que, estando onde estivesse, se julgava no centro do Mundo. Pois bem, Lisboa (ou melhor, uma eleição para a Câmara de Lisboa) esteve ontem, através dos diversos canais da RTP, no centro do mundo audiovisual lusófono. Alguém descobre a(s) provinciana(s) mente(s) que resolveu(eram) que isto tinha algum interesse para os cidadãos lusos e lusófonos do Porto, Coimbra, Faro, Bragança, Portalegre, Luanda, Maputo, Newark, San Jose, Macau, Rio de Janeiro, Paris ou Dili ? Isto é serviço público. Mas do tipo rádio local. Infelizmente com projecção mundial. Ou seja, durante 2 ou 3 horas quem quis ver televisão em português fora do País ou o serviço público em Portugal ficou condenado a assistir a uma troca de argumentos de alto coturno sobre magnas questões de interesse global como o túnel que talvez, quem sabe, venha a passar sob o Jardim da Estrela. Um problema, está visto, de transcendente importância e impacto à escala planetária. Que belo uso é dado ao dinheiro dos nossos impostos!!!
A avaliar pelo número de chamadas que recebi de fora de Lisboa durante o debate, tudo me leva a crer que além de não estarem interessadas , concluiram que aquilo não me interessava para nada :)
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