FEITOS ÉPICOS: Esta é a segunda vez que Portugal participa num Campeonato Europeu de Basket. A primeira vez tinha sido em 1951 e por convite - sem qualificação prévia. Graças ao empenho e esforço de atletas, técnicos e dirigentes, os bravos lusos estão a um passo daquilo que até há bem pouco seria impensável - qualificarem-se para os quartos de final. Os nossos Lobos estrearam-se hoje, no Mundial de Rugby, com um jogo de grande dignidade e valentia. Foram verdadeiros campeões ao superarem-se a si mesmo e equilibrando,a espaços, o jogo com a Escócia. O comentador de língua inglesa da emissão a que assitia referiu a certo ponto: The Portuguse team brought a great spirit to this World Cup. Não é pouco - porque é de espírito que se trata e se deveria sempre tratar quando falamos de Desporto. Acima de tudo, o motivo que deve alegrar qualquer verdadeiro amante do Desporto é, pela primeira vez, a opinião pública portuguesa seguir com atenção manifestações desportivas não-futebolísticas. Sendo antigo praticante de basket (mais esforçado que talentoso, diga-se), gosto de futebol. Mas, do ponto de vista de cultura desportiva, a verdadeira tirania mediática do futebol é um sintoma de sub-desenvolvimento do país. A forma como os media portugueses cobrem obsessivamente todos os aspectos da "bola" tem menos a ver com Desporto e mais a ver com o gosto e queda pela discussão mesquinha, pela intriga e o fascínio pelos golpes de bastidores. E que, a medir pelas audiências, estão bem enraízados na sociedade portuguesa. Isto não seria relevante se a overdose de futebol não projectasse imagens e valores completamente alheios ao espírito desportivo. Mesmo que involuntariamente, esta permanente discussão sobre árbitros, dirigentes, empresários ou foras de jogo, cartões e penalties, apenas promove o culto da trapaça, da mentalidade do "ganhar a qualquer preço", do dinheiro fácil por meios legítimos (carreiras fulgurantes) ou ilegítimos (negociatas por baixo da mesa). A crescente profusão de famílias de poucas posses que educam os seus filhos na vã esperança de criarem um novo Figo é um triste sintoma destas maleitas - basta falar com algum responsável pela formação no futebol para perceber que este fenómeno é cada vez maior. Por isso, nunca é demais realçar os feitos das selecções de basket e de rugby - lutam silienciosa e quotidianamente contra a falta de meios, de apoios e contra o desinteresse dos media. Mas sobretudo combatem a triste e ancestral ignorância do que é o Desporto e dos valores que projecta - a promoção do esforço, da superação dos nossos limites, da auto-disciplina e dedicação, a ideia de que nada se alcança sem trabalho, o espírito de grupo, o gosto pela competição, o fair-play. No fundo, uma cultura desportiva enraízada ensina-nos que na Vida tão (ou mais) importante que o resultado final, é o processo, a forma como lá se chega. Por este sopro libertador, rejubilemos, pois, com os feitos épicos (num país como o nosso, são mesmo épicos) dos nossos basquetebolistas e raguebistas. Antes de voltarmos à vil tristeza do pontapé na bola.
P.S. - O Francisco tem uma óptima cobertura diária do Mundial de Râguebi.
Mar de opinioes, ideias e comentarios. Para marinheiros e estivadores, sereias e outras musas, tubaroes e demais peixe graudo, carapaus de corrida e todos os errantes navegantes.