INFANTILIZAÇÃO DO DEBATE: Há momentos em que o debate eleitoral nos EUA se revela muito infantil. No meio de uma tempestade natural e de uma convenção republicana diminuída, as televisões estão há umas horas a falar da filha grávida da candidata republicana a Vice-Presidente. Percebe-se o intuito: passar a ideia (básica, primária e ilegítima) de que uma conservadora social, contra o aborto e contra educação sexual nas escolas, não consegue viver em casa de acordo com as suas convicções. Os blogues apoiantes de Obama estão desorientados desde o anúncio desta nomeação - os boatos multiplicam-se (o mais delirante era que o filho de Palin que sofre de síndroma de Down era afinal neto e a família teria inventado uma história para encobrir isto). Tentam desesperadamente encontrar um motivo para descredibilizar Sarah Palin - uma história sobre o despedimento do seu cunhado polícia apresenta algum potencial de criar dúvidas sobre o seu comportamento ético mas o resto tem sido patético. Obama, que de burro não tem nada, tenta a todo o custo afastar-se desta cacofonia de ataques. Percebe melhor do que ninguém quanto esta indisciplina da sua base de apoio lhe pode custar em termos de imagem. A "nova política" não pode com certeza assentar em história plantadas sobre a gravidez de uma adolescente. Já há uns dias, Michael Moore insistia em "ajudar" os republicanos com declarações de refinado mau gosto em que afirmava que a chegada do furacão Gustav na semana da convenção republicana era uma prova de que Deus existe... Estes pequenos incidentes são uma amostra dos problemas que Obama terá de enfrentar até 4 de Novembro. A máquina política e eleitoral republicana é eficiente e disciplinada. A base de apoio dos democratas é indisciplinada e movida muitas vezes por mera ânsia de correr com os republicanos e por um ódio quase irracional a George Bush. Obama tem um problema eleitoral relevante: as sondagens mostram-no muito abaixo (10 a 15 pontos) do apoio genérico ao Partido Democrata. Ou seja, segundo estes números, Obama não soma, subtrai apoio (uma explicação alternativa pode ser a popularidade de McCain fora do Partido Republicano - segundo as sondagens, ele tem apoio acima dos números do seu Partido). Pode ser por racismo, por desconfiança quanto à sua experiência, por feridas deixadas pelas primárias. A verdade é que esta diferença tem-se mantido constante desde Junho, altura em que ficou claro que ele seria o candidato democrata. Se a isto se somar aquilo que os especialistas em sondagens chamam de efeito Bradley*, Obama terá dificuldades em ser eleito em Novembro. De qualquer forma, o contexto destas eleições favorece claramente os democratas - dois mandatos de um presidente controverso e (agora) impopular, uma crise económica e financeira de amplitude incerta, guerra e uma gestão do acidente do Katrina que mostrou incompetência e insensibilidade social. As opções da candidatura de Obama em Julho a Agosto terão porventura ajudado a que a situação se complicasse.
* O efeito Bradley refere-se a um racismo encapotado que não é capturado pelas sondagens. Numas eleições para mayor de Los Angeles um candidato de cor, de nome Bradley, aparecia consistentemente à frente em todas as sondagens até ao último dia de campanha. No dia das eleições, teve menos 6% de votos do que as sondagens anunciavam, tendo perdido a eleição. Alguns especialistas em sondagens acreditam que tal deva ter resultado de uma inibição de uma parte do eleitorado em admitir nas pesquisas que não votaria num candidato negro. No dia da votação, no isolamento da câmara de voto, muitos eleitores teriam votado no outro candidato como resultado de um sentimento racista não declarado ou até inconsciente.
É certinho que, na intimidade da cabine de voto,(electrónico?) Obama vai perder. Afinal, para além da inovação da cor de pele,e das discursatas volitivas, que mais pode, sabe, lhe deixam fazer?
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