A Carla tem razão apenas em contextos muito particulares. Os escandalizados com a intolerância do Cardeal
esqueceram-se de explicar isto. Conveniente, não é?
Já aqui repeti vezes sem conta que me faz impressão a designação "Islão" para abraçar uma realidade - geográfica, política, religiosa e social - que vai de Rabat a Jacarta. Em Kabul os
talibans mataram à fome, aprisonadas nas suas próprias casas, as viúvas da guerra contra contra os soviéticos ( as que não tinham sequer um irmão que pudesse sair com elas à rua); em Marrocos há deputadas mulheres; em Beirute as mulheres publicam boa poesia ( que já aqui trouxe socorrendo-me da
Banipal). Qual
Islão?
Nada impede que em Portugal uma católica tenha liberdade de culto se estiver casada com um muçulmano. E se quiser abdicar dessa liberdade é uma liberdade que lhe assiste. O liberalismo
começou na questão religiosa e é muito estranho que tantos estudiosos do iluminismo escocês e dos
founding fathers americanos o esqueçam. Já um pastor pode dizer o que quiser às suas ovelhas. É-me indiferente.
É sabido que a condição feminina nos países islâmicos fundamentalistas - no sentido utilizado por Eisenstadt - é um instrumento de coerção. Não existia
cidadania na Kabul dos
talibans e essa ausência começava em casa. Numa sociedade liberal, o
fetiche religioso tem de conviver com super-mecanismos que condicionam o desempenho social das pessoas. A religião passa de um
affaire d'état para um
affaire de soi.
Por último, como romântico incurável - o amor é sempre uma tragédia - , aprecio a ideia de uma mulher se despir da liberdade de culto para vestir o seu amor.