Acrescentaria apenas uma nota da área psi-soc. Não me parece, infelizmente, que as pessoas estejam muito interessadas nos resultados da comissão. Caso estivessem, o conteúdo das escutas seria vital para o processo de mudança de atitude. Neste tipo de dinâmica, existe um factor bem testado laboratorialmente: a credibilidade das fontes. E que fonte pode ser mais credível que o próprio visado?
O fundo da questão é controverso e há argumentos ponderosos de ambas as partes. Mas o facto de as autoridades judiciárias terem enviado as escutas, porque têm uma certa interpretação da lei, não significa que a comissão parlamentar possa (muito menos deva!) tomar conhecimento delas. A CPI (e os seus membros) também são responsáveis, no âmbito das suas competências, pela interpretação do direito aplicável, que não tem que coincidir com a das outra autoridades. Quer dizer: a CPI não pode sacudir a água do capote e justificar o acesso às escutas com o facto de elas lhe terem sido facultadas pelas autoridades judiciárias.
Caro PNV. O artigo 34 da CRP diz que "4. É proibida toda a ingerência das autoridades públicas na correspondência, nas telecomunicações e nos demais meios de comunicação, salvos os casos previstos na lei em matéria de processo criminal."
Estas garantias não significam que para outros fins que não penais, disciplinares ou administrativos se possam fazer (ou utilizar) escutas à vontade. Significa que as escutas só podem existir no âmbito penal, e apenas nas estritas condições previstas na lei. Mas a lei não pode alargar a sua admissibilidade a outras áreas. Num estado de Direito é a lei que deve respeitar a Constituição, não a Constituição que se interpreta em função da lei. Sobretudo no que respeita a Direitos Fundamentais, domínio no qual as leis restritivas têm de ser interpretadas restritivamente! Esta é a doutrina constitucional de qualquer Estado de Direito moderno. De outro modo, abrimos a porta ao estado salazarento: a Constituição também dizia que havia direitos fundamentais (por ex, o direito de criar partidos políticos)...mas de acordo com o previsto na lei...a qual proibia essa criação....
Compreendo, mas então por que motivo ( acabei de ouvir) Mota Amaral diz que os deputados da comissão podem usá-las, lê-las, mas não podem falar delas nas sessões?Então o que está a fazer a CPI???? Desculpe, mas há aqui coisas bafientas.
PS:FNV ( PNV é o meu irmão, coitado , que não é para aqui chamado)
Peço desculpa pelo lapso a ambos :-) No estrangeiro, tenho dificuldade em acompanhar todos detalhes. Haverá algumas divergências sobre o modo exacto de realizar as garantias previstas na CRP (para lá das interpretações motivadas pelo interesse partidário). Mas ninguém pode seriamente dizer que as escutas em processso penal podem livremente ser utilizadas noutra sede, inclusive CPIs. Aliás, de algum modo é o que o Mota Amaral acaba por admitir, não é? E defendo esta posição baseado pura e simplesmente na leitura da CRP (são as leis que devem ser interpretadas conformemente à CRP, não o contrário). Não para defender o Sócrates, mas para defender a sua liberdade e a minha.
em relação ao que diz o leitor anterior, não se trata de interpretar a constituição em conformidade com a lei. A regra de que as cpi's têm poderes similares às autoridades judiciárias está também na constituição (178/5). Mas aceito que o tema é controverso, de facto.
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