Mar Salgado

quinta-feira, outubro 21:

A DEMOCRACIA*:

Não agrada a todos. Sabemos isso muito bem e isto ainda nem começou a sério. Virão mais manifestações de " duzentos jovens", ou "trezentos" ( a solo ou infiltrando manifs. pacíficas) , até que a desordem seja ordem.
Depois virá a contra-ordem, que gerará mais desordem. Nessa altura, só os fascistas ( no sentido genético do termo - unidos pela ordem da violência) , de todos os géneros, saberão fazer-se ouvir.


* via 5Dias

 

posted by FNV on 11:38 da manhã #

Comments:

No dia 29 de Abril de 2007, num comício em Bercy, Sarkozy exortou os seus apoiantes a “liquidar a herança de Maio de 68”. Mas o “psicodrama” – como lhe chamava Raymond Aron – deixou um rasto indelével e, para além da insurreição intelectual, o “psicodrama” engendrou a maior greve operária da história de França e a sua narrativa perene. Mas a política está de regresso e um Espírito paira sobre a Europa: político, gaulês, chauvinista, cartesiano, jacobino, racaille, voltairiano, rousseauniano, gastrófilo, amante do mot d’esprit e da barricada.

# posted by  dromofilo : 11:50 da manhã

 

dromofilo, o teu comentário é complicado, mas a realidade francesa é mais ainda. Ou nem por isso. Por exemplo, o maio de 68 foi feito à revelia do venerando PCF (que depois o teve de o cavalgar para o tentar domar), assim como as greves agora organizadas pela confederação sindical do PCF, nada têm a ver com os desacatos dos anti-sistema e anarquistas. Daí o comunicado do PCF. Une place pour chaque chose, et chaque chose à sa place. Essa tua lista, a propósito, é um saco de gatos. Miam todos em francês, mas alguns dão-se bem, outros não. A nouvelle cuisine, por exemplo, não vai bem com a racaille, que por sua vez, é avessa ao mot d'esprit, que é mais da tradição do Racine, que não gostaria do Voltaire.

# posted by  caramelo : 1:06 da tarde

 

"...até que a desordem seja ordem".
Este lema, o grande sonho de todos os revoluciomários e sobretudo os teóricos de poltrona burguesa e saber livresco que do alto querem ditar a "linha" da revolução e depois guerreiam entre si a discutir sobre a "linha justa".
Seguindo a cartilha de há século e meio, sonham provocar a desordem na democracia para, sobre as cinzas de um mal menor, implantarem o horror de regimes concentracionários: isto é, fazer da ideologia a medida do homem e não o homem a medida das ideologias.
Senhores do 5dias, o mundo mudou brutalmente depois de Marx. O mundo pode aceitar oposições de classe mas não "lutas de classe" com fim à revolução. Nem sequer o mundo aceitará grupelhos violentos a comandar revoltas sociais: a sociedadeno seu conjunto, percebe o que está em jogo e sabe que o que virá será sempre pior do que o que está. Rupturas abruptas na sociedade são impossíveis históricamente, dado os resíduos culturais e técnicos de cada época. Caso se force essa ruptura pela força bruta, será um atraso civilizacional, pois passados umas gerações, tal sociedade violentada regressará ao ponto inicial com o respectivo atraso relativo aos povos que se mantiveram em renovação democrártica e geracional permanente.
Sonhar podem sonhar e é bonito ter sonhos, contudo é preciso não perder de vista que sonhos são irrealidades e, quantas vezes não acordamos aflitos e respiramos fundo: bolas que era só um sonho.

# posted by  josé neves : 5:25 da tarde

 

Salut, ó Caramelo! Embora possua algum esprit de finesse, a máxima “une place pour chaque chose, et chaque chose à sa place parece-me pouco adequada ( e pouco francesa) para aclarar o que se passa em França (e não só, e não só…). É verdade que, por exemplo, George Marchais afirmou que o 68 foi uma conspiração gaullista, mas também é verdade que o PCF nunca percebeu nem podia perceber o Maio de 68. Saber se os “desacatos” dos anti-sistema e anarquistas nada têm a ver com as greves, remete para outra constelação de problemas, ó Caramelo: de quem são eles filhos? Verduras da juventude? Desemprego? Perda da linha do horizonte? Activismo apocalíptico - niilista a fagocitar os movimentos sociais?
Quanto ao saco dos gatos, ó Caramelo! Desde, exactamente, Racine, sabemos que o universo trágico – o do conflito sem solução – é do agrado dos franceses e que o seu exercício intelectual dilecto é a autocontradição performativa.

# posted by  dromofilo : 6:49 da tarde

 

dromofilo, a frase é francesissima e antiga; ainda não cheguei ao requinte de inventar frases em Francês ;) Mas essa ligação umbilical entre o Racine e a racaille anarquista, é um tour de force a que nem se atreveria o melhor jongleur francês pós estruturalista;) Olhe que o Racine era um classissista e a tragédia não é a mesma coisa que desordem. Ainda por cima, o homem era jansenista... A França ama a ordem. Já viu em Versalhes aqueles jardins geométricos, tão tipicamente franceses? Por falar em jardins, acho que quem tem uma pulsão secreta pela desordem são os ingleses... O Maio de 68 foi precisamente uma revolta contra a ordem, a ordem dos normalistes, a ordem de um povo funcionário público, ordeiro e temente a Deus e à Pátria, onde cada um sabe ça place, voilá. A Pátria e Deus, foram entretanto substituídos por outra ordem. E então, temos aí a desordem, que não é diferente da que existe um pouco por toda a Europa e que pouco tem a ver com a revolta dos filhos da burguesia do Maio de 68. De quem são eles filhos? de toda a gente. Dos bons burgueses, dos comunistas, do povo dos banlieus, dos emigrantes magrebinos, etc.

# posted by  caramelo : 8:54 da tarde

 

Entendamo-nos, ó Caramelo. A invocação do “saco dos gatos” (por si) e do Racine (com soltura literária, reconheço, por mim) pretendiam, suponho bona fide, contrariar a presunção de definir uma identidade dominante do Espírito Francês. E, chegados aqui, as questões também podem ser estas: Onde é que estará o Volkgeist gaulês? No rigorismo metódico, ordeiro e racionalista de Descartes ( a ordem, a ordem…) ? Na verve de Montaigne (a desordem, a desordem…)? No conservadorismo de Maurras (de novo a ordem, a ordem…)? No furor irónico e desordeiro de Rabelais (a desordem, a desordem…)? Não há Volkgeist gaulês. Há é uma identidade fluida e o trágico da contradição e do conflito.
Que os franceses gostam da ordem? Mas é claro, ó Caramelo! Tentaram refundá-la radicalmente a partir do grau zero e através do grau máximo da desordem em 1789. O que pode demonstrar que nem sempre os desordeiros só querem a desordem, e que (atenção, isto é só um atalho do pensamento, não é uma comparação), quem sabe, desta vez, a narrativa canónica consabida dos “entediados filhos da burguesia”, e agora também dos comunistas, do povo dos banlieus, dos emigrantes magrebinos, já não é verosímil.

# posted by  dromofilo : 12:41 da manhã

 

Dromófilo, agora o volkgeist? A propósito, foi você que começou por definir uma certa volkgeist francês, não foi? Um geist comum que teria começado, sei lá, nos capetos, e terminaria em Derrida, e que seria a propensão mental para a desordem e a destruição, tipo “fantasminha brincalhão”, uns bonecos que o meu filho gosta muito.
Continua a fazer confusão. O furor irónico e desordeiro do Rabelais tem correspondência, do outro lado do canal, em Swift, o que queria alimentar os irlandeses com criancinhas. E encontra em Inglaterra, historicamente, mais exemplos de desestruturação literária do que em França, se calhar. E desordem a propósito de Montaigne? Esta agora, nunca me teria ocorrido isso… Confunde o essencial com o acessório. Porque fala em grau máximo da desordem em 1789? Foi até uma revolução muito bem planeada e organizada. Correu tudo muito bem, como estava previsto, tudo muito bem enquadrado pelas forças da ordem da mudança de regime.
Isso da volkgeist é muito relativo. Isso que dizer que numa determinada época, mais ou menos alargada, um povo tem um certo espírito e desígnio comuns. A França teve durante séculos um espírito de missão junto dos outros povos do continente e o consequente desígnio comum de conquistar a Europa, levando, sucessivamente, as luzes, uma nova ordem de poder e o seu Código Civil, uma obra prima da ordem e da regulação.
Não confunda a França com a Itália, esse sim, um pais desde sempre descosido, cheio de remendos de identidade, colado a cuspo no século XIX, e que nem o Mussolini, com a retórica toda sobre a pátria e os gloriosos italianos, conseguiu convencer totalmente.
O que está agora a acontecer em França, as greves, as manifestações, a desordem nas ruas, os anarquistas, são fenómenos que (para além de distintos entre eles) não têm nada a ver com esse assunto, e que sempre afectaram outros paises com outro volkgeist. Olhe, a Grécia que é um monobloco cultural, tem tido esses problemas a dobrar. Veja a Alemanha, com ricas tradições no campo da anarquia, dos okupas, das lutas de rua. etc, etc.

# posted by  caramelo : 11:05 da manhã

 

deviam okupar a tua casa.

# posted by  FNV : 11:21 da manhã

 

Até nós temos excelentes exemplos do “trágico da contradição e do conflito”. Vê o FNV. Digo uma coisa tão pacífica e consensual como o facto de os alemães terem okupas, e ele diz-me que deviam okupar a minha casa. Entendeste? Eu não. Se eu dissesse que chove muito em Hamburgo, ele ter-me-ia dito que eu deveria apanhar uma pneumonia. C’est drôle, ça ;)

# posted by  caramelo : 11:55 da manhã

 

ó pá andas sensível eheheh...

# posted by  FNV : 12:10 da tarde

 

ando nada, ando nada, tu não me digas isso que eu fico chateado.

# posted by  caramelo : 12:26 da tarde

 

Mea culpa, caro Caramelo. No caso francês, talvez assente melhor Volkwitz:). O caríssimo Caramelo tresleu a minha enumeração do primeiro post (o “saco de gatos”). Essa enumeração pretendia dar conta, ela própria, da dificuldade em substancializar, definir os fines, traçar os limites, do sobredito “Espírito Francês”. À la Derrida:), mas sem malícia, poderíamos dizer que esse espírito seria indecidível.
Os ingleses também não terão uma identidade cultural, literária, filosófica dominante. Talvez, talvez… mas o exemplo não tem aqui serventia argumentativa
O Caramelo persignou-se e benzeu-se perante a blasfémia de um Montaigne “da desordem”. Olhe que nem de propósito, ó Caramelo! Há um textinho do Derrida ( sim, o estigmatizado, vade retro! Abrenuntio!) que concita o Montaigne para a redifinição da (des)ordem política moderna.
( Derrida, Force de loi. Le "Fondement mystique de l'autorité", Galilée, Paris, 1994). Eu sei que o Derrida passa por ser ininteligível e maneirista, mas…sapere aude!
O Caramelo acusa-me de acenar com o fantasminha travesso e brincalhão do génio francês. Olhe que não, olhe que não! Ele é multiforme. Releia e não tresleia a minha enumeração do primeiro post. Ao invés, o caramelo é que está demasiado obsidiado com um presuntivo Esprit de Géométrie francês, com os seus “jardins geométricos” e o seu Código Civil – “ uma obra-prima de ordem e de regulação”.
Que o espírito francês não exista e nada explique sobre os acontecimentos actuais, é uma possibilidade, ó Caramelo, mas é temerário asseverá-lo e, vá lá, um post é um post, é um post, é um post…

# posted by  dromofilo : 9:01 da tarde

 

Sobre o Caramelo e o FNV como exemplo de conflito e de contradição, não se esqueça do Hegel: o contrário coopera.

# posted by  dromofilo : 9:13 da tarde

 

Que os acontecimentos franceses nada expliquem sobre o espírito francês, é uma forte possibilidade, de facto, atendendo a que, como eu disse, existem em todo o lado. Dei-lhe o exemplo da Grécia, e zeitgeist mais zeitgeist do que o grego, não existe, uma gente que nasce e morre ortodoxa por ordem do próprio Estado e que vive em função da oposição aos turcos opressores, remoendo uma história de séculos. Isto é um bocado exagerado, claro, porque as gerações mais novas vão pensando de forma diferente. Em todo o caso, lá, não concebem um grego que não seja descendente directo de Péricles ou de Alexandre o Grande. Não existe o conceito de grego de origem asiática ou africana, como em Portugal, Inglaterra, França, etc. E no entanto, é um povo danado para a brincadeira, com revoluções e pedrada na policia a eito. Dromofilo, eu temo que esteja a forçar a sua metamorfose num Derrida, e não queria que isso acontecesse ;) Você desestrutura os franceses de uma forma um bocado cruel. Vamos lá voltar atrás: não foi o dromófilo que disse que os franceses tinham um espiritozinho de contradição, pior, de autocontradição? Aquilo é uma gente esquizófrénica! Isso não é então um traço comum? É até capaz de descobrir essa doença no Racine, um gajo que viveu espartilhado pelo classicismo mais canónico.
É claro que a França teve revoluções. Em determinados momentos, quis alterar a ordem estabelecida; é claro que teve movimentos filosóficos e literários de sinal contrário, mas, apesar disso, ou melhor, sem nada a ver com isso, é um povo culturalmente homogéneo, com mudanças sociais lentas, com alguns sobressaltos, e que, de facto, sempre prezou a ordem e a paz social passados os momentos de ajustamento politico e social (alguns sangrentos, claro). Foi só isso que eu sublinhei. Nem teria sido a potência que foi (e continua a ser) se assim não fosse, não é? O exemplo dos jardins é caricatural. Podia-lhe dar também o exemplo da arquitectura. É engraçado que os ingleses, pelo contrário, prezam muito aquele gótico tardio e um bocado exibicionista de alguma da sua arquitectura aristocrática rural.
Os ingleses já tiveram uma cultura dominante, já não têm, os franceses idem. Em sociedades com uma tão grande velocidade de informação como a que agora existe, com grupos cada vez mais fragmentados, culturalmente, etnicamente, etc, é dificil. Já houve tempo em que uns e outros dominaram o mundo com traço forte: os franceses com os seus ideais de libertação dos povos (dos ingleses, claro, e os americanos bem lhes podem agradecer a ajuda) o seu Direito, que influenciou, e continua a influenciar, muitos países da Europa, a sua literatura, o seu romantismo, l'amour, l'amour, a libertinagem, sempre l'amour, a moda... (lembra-se?). Zeitgeits já rareiam, pelo menos dos balcãs para cá. Bem, uma coisa é certa, os francius bebem muito, é esse deve ser o seu zeitgeist. Quando por lá andei, era velhos e novos, madamas e cridas, a beber o seu penalti de pastis ou anisette logo pela manhã nos tascos ;) Também estou a exagerar, só um bocadinho, vá, vivi no bairro errado; Um pernod à sua saúde!

# posted by  caramelo : 10:30 da tarde

 

Que os acontecimentos franceses nada expliquem sobre o espírito francês, é uma forte possibilidade, de facto, atendendo a que, como eu disse, existem em todo o lado. Dei-lhe o exemplo da Grécia, e zeitgeist mais zeitgeist do que o grego, não existe, uma gente que nasce e morre ortodoxa por ordem do próprio Estado e que vive em função da oposição aos turcos opressores, remoendo uma história de séculos. Isto é um bocado exagerado, claro, porque as gerações mais novas vão pensando de forma diferente. Em todo o caso, lá, não concebem um grego que não seja descendente directo de Péricles ou de Alexandre o Grande. Não existe o conceito de grego de origem asiática ou africana, como em Portugal, Inglaterra, França, etc. E no entanto, é um povo danado para a brincadeira, com revoluções e pedrada na policia a eito. Dromofilo, eu temo que esteja a forçar a sua metamorfose num Derrida, e não queria que isso acontecesse ;) Você desestrutura os franceses de uma forma um bocado cruel. Vamos lá voltar atrás: não foi o dromófilo que disse que os franceses tinham um espiritozinho de contradição, pior, de autocontradição? Aquilo é uma gente esquizófrénica! Isso não é então um traço comum? É até capaz de descobrir essa doença no Racine, um gajo que viveu espartilhado pelo classicismo mais canónico.

# posted by  caramelo : 10:31 da tarde

 

Desculpem lá, que o meu último comentário é duplicado de uma parte do outro.. isto ia demorar muito tempo a explicar. Desculpem lá a seca.

# posted by  caramelo : 10:33 da tarde

 

Ora aí está o génio Francês engarrafado,ó Caramelo! E dele também podemos dizer o que Rousseau disse do vinho : "Por uma querela passageira que causa dá origem a cem ligações duráveis". Um copo de Beaujolais Nouveau à sua saúde!

# posted by  dromofilo : 1:56 da tarde

 

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