PENSAR ANTES DE FALAR: O comportamento de Rumsfeld no caso dos abusos dos soldados americanos no Iraque esteve longe de ser correcto. Tendo tomado conhecimento do assunto em Janeiro não lhe terá atribuído a importância devida nem comunicado as verdadeiras implicações do caso a George W. Bush. Foi um enorme erro político.
Mas o futuro de Rumsfeld é o que menos importa nesta história. O sistema de checks and balances de uma democracia madura e aberta como a americana leva a que membros do poder executivo sejam confrontados com perguntas delicadas e investigações rigorosas, mesmo de companheiros de partido. Hoje, na comissão no Congresso, Rumsfeld submeteu-se a uma bateria de perguntas e acusações, com particular destaque para as do republicano John McCain. Os congressistas sentem-se tão furiosos como o Presidente por terem sido mantidos na ignorância durante tanto tempo. A democracia americana está de boa saúde.
Alguma esquerda blogosférica, em resposta ao post Americansky de FNV, afirma que a comparação entre a divulgação do que se passou no Iraque e outras realidades silenciadas durante décadas não faz sentido. Esta é apenas mais uma manifestação da arrogância e má-fé intelectuais que o anti-americanismo confere.
Tanto mais estranhas quanto surgidas num país (Portugal) em que, por exemplo, um comandante de um massacre bárbaro durante a Guerra colonial se passou, de um dia para o outro, de zeloso e cruel capataz do Antigo Regime para destacado dirigente de um partido de extrema-esquerda, sem lhe ter sido perguntado nada àcerca dos seus excessos em actividades militares. Nem uma entrevistazinha, nem uma comissãozita parlamentar. Nada. Tudo na paz do Senhor, que a culpa era do Regime ou da sociedade capitalista.
Eu sei que não nos devemos comparar com exemplos infelizes, nossos, nos ex-países de Leste ou nos países árabes à volta do Iraque onde a tortura é um exercício diário patrocinado pelo Estado. Devemos almejar os mais altos standards de prática democrática e de respeito dos direitos humanos. Devemos perceber que as torturas são um mal absoluto que não se compara ou relativiza.
Mas o que está em causa nesta discussão não são os lamentáveis actos, que serão devida e severamente punidos, mas sim a forma transparente e aberta como factos destes são livremente divulgados e discutidos e um responsável político pode ser chamado à pedra pelas suas eventuais responsabilidades no encobrimento de factos graves. E isso, como acima foi dito, não acontece em muitos sítios do mundo, a começar pelo nosso país.
De vez em quando, convinha que parássemos para pensar e para olhar para a nossa história recente, antes de nos lançarmos em acusações descabidas a sociedades que nos dão diariamente lições de cultura democrática.
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