Tenho uma filha com onze anos e meio. Também não compreendo o conceito de consentimento numa criança. Continuando com os paradoxos conhecidos: e se for um menino de dez anos? Também conta o consentimento? E com uma miúda de nove, espigadita e de shorts ? Também vale?
Não me pronuncio sobre o processo , apenas sobre o facto: o consentimento de uma criança de doze anos. E não me venham com o argumento escatológico das princesas que casavam aos doze, porque nesses tempos também as mulheres eram banidas da vida pública, havia escravatura, fogueiras, etc.
A questão em causa é se o consentimento, numa criança, conta para alguma coisa. Deve perguntar-se a uma criança de 5 anos se ela quer ir para a escola? Se ela responder que não quer, o facto de a obrigarmos a ir constiste numa torpe violação da sua vontade? Numa sociedade em que os adultos são, cada vez mais, tratados como crianças, há quem queira fazer o trjecto ao contrário; pena que seja onde isso é intolerável.
Gustavo, sem querer ser maçador, até porque já comentei a coisa lá no Blasfémias, embora o comentário não apareça: o "consentimento", que na notícia está empregue num sentido impróprio, conta como ausência de violência, o que não significa que o facto deixe de ser crime. Não acha que as relações sexuais com uma criança de 12 anos através do uso de violência são mais graves do que sem uso de violência? Da mesma maneira que o homicídio a pedido da vítima é menos punido do que o homicídio comum (embora continue a ser crime)? A notícia está muito mal feita, dá ideia que o homem foi absolvido, e não é nada disso. É só que a violação de crianças e o abuso sexual de crianças são coisas diferentes. E olhe que a infantilização dos adultos passa exactamente, p. ex., por elevar a idade do consentimento (em sentido próprio): é a sociedade peter pan.
PC, Não percebi se a alusão ao CM é para mim, mas sempre te esclareço com muito prazer: O meu post é apenas sobre o conceito "consentimento da criança".Não é sobre a notícia nem sobre o processo. E naturalmente que o post versa sobre o abuso sexual, pois que para violação não faria sentido ( não conheço, ainda, violações consentidas) .
o post para onde remetes é uma notícia sobre uma notícia do CM citada nesse mesmo post. E tanto tu como a autora desse post (i. e., a opinião pública) puseram-se a comentar a notícia como se o consentimento da criança tivesse desculpabilizado o facto, propagando os erros da notícia. Aquilo a que chamas o "consentimento" da criança (ausência de violência) é precisamente o que distingue a violação do abuso sexual de menores. E a maneira como a notícia está dada não permite compreender isso. Dito de outra forma: para que haja abuso sexual de menores não pode haver violência, senão é um caso de violação. Portanto: o consentimento numa criança é um conceito fácil de compreender (embora não lhe sejam atribuídos os mesmos efeitos do que no consentimento de um adulto). A questão só é problemática quando estão em causa crianças pequenas, abaixo da idade do natural entender e querer (6-7 anos); nesses casos, deve talvez entender-se que há sempre violação.
Se tivermos a falar apenas de consentimento e não do link. Sim deve-se pedir o consentimento a criança de 12 anos que aliás não é criança é adolescente. Deve-se informar uma criança do que vamos fazer e explicar-lhe o melhor possivel e quando peço autorização aos pais para algum exame e eles dão peço tb autorização ao adolescente. Apartir dos 12 anos eles devem mesmo assinar o consentimento. (só é obrigatório apartir dos 16 anos, mas o PC que o diga ou o Vasco parecem mais versados em leis).
Aceitando o que o PC diz como correcto, voltamos à história das leis demasiado brandas para com pedófilos e demais "apreciadores" de crianças.
Tudo bem que a violência é factor de peso, mas um tipo que depende do consentimento de uma criança para ter relações com ela (parece-me o caso, não querendo assumir demasiado) não carece de distúrbios mentais.
Não há demagogia da parte do CM quando usa termos como "à solta": estamos à espera de mais Casas Pias para moralizar estes crimes?
PC, Agradeço-te a explicação, brilhante e concisa,como sempre, mas dispenso os processos de intenção: não falo de desculpabilização nenhuma, apenas do conceito de consentimento. E em geral. Terás de aguardar para me enfiar, de novo, na redacção do CM.
...não há consentimento possível de uma criança num acto ignóbil destes que destrói a vida de alguém para todo o sempre...é revoltante que alguém que cometa um crime patrimonmial fique na cadeia por 10 anos e outro que se assume como um potencial assassino de vidas inocentes não fique lá a apodrecer...e o mais revoltante é que as autoridades fechem os olhos à evidência...
...aliás, julgo que qualquer Mãe/Pai que se preze deveria saber atirar e ter porte de arma- em casos comprovados só resta algo a fazer, without any kind of mercy...sou cristã, mas, nests casos, sou mais Maconde e a Lei de Talião revela-se-me mais forte...
João Gante, "temos leis demasiado brandas". Não quero dizer que seja o seu caso, naturalmente, porque não o conheço, mas 90% das pessoas que acham que temos leis muito brandas não fazem a mínima ideia de quais são as penas previstas para os crimes, nem o modo do seu cumprimento, nem nunca pôs os pés numa prisão. Depois, gostava de relatar aqui uma experiência feita pelos juízes ingleses há uns 6-7 anos. Nesse momento, a imprensa inglesa vinha exercendo grande pressão sobre os tribunais, reclamando contra a brandura das chamadas sentencing guidelines, que são uma espécie de directrizes para a aplicação das penas. Ora esses juízes fizeram uma experiência, recrutando cidadãos comuns para serem juízes em "mock trials", com casos passados. No fim dos julgamentos compararam resultados - e mais de metade dos cidadãos que, em geral, achavam as sentenças muito leves tinham determinado penas inferiores às dos juízes.
FNV, não me faças processos de intenção de te mover processos de intenção. Quando muito fiz uma interpretação errada do teu comentário e se assim for não tenho problema em reconhecê-lo. Depois: "O PC explicou que consentimento significa sem violência". Não foi isso que eu escrevi, mas sim: "o 'consentimento', que na notícia está empregue num sentido impróprio, conta como ausência de violência". Na substância e a ver se entendi: quando perguntas se o "consentimento também vale" queres sugerir que haver ou não consentimento de um menor na prática de actos sexuais deveria ser irrelevante e que todos os casos deveriam ser tratados como se não tivesse havido consentimento, isto é, como se tivesse havido violência e, portanto, violação? É isso?
Eu percebi e revela-se-me completamente chocante que alguém possa admitir que uma miúda de 12 anos dê consentimento ao padrasto para ter com ele relações...só de loucos varridos! Já parece aqueles casos, moldados por uma mentalidade verdadeiramente devassas ainda que falsamente púdica, em que uma pessoa de mini-saia estava a pedi-las, com a agravante de se estar aqui a tratar de crianças...uma miúda de 12 anos não é uma adolescente e mesmo que o fosse são idades em que os seres estão em formação...volto a repetir: coisa que uma boa pontaria e uma arma não resolvam e cortem o mal pela raiz...
Isabel, ninguém disse que este "consentimento" deve valer para - digamo-lo assim - deixar o adulto impune. Por curiosidade, e não querendo ser intrometido: reparo no seu perfil que tem por 'ídolos' o Dalai Lama e Mahatma Gandhi - o que vê neles?
Doze é especial? Não. Então, dez, nove, onze, dez e meio- se são crianças, o consentimento é uma ficção ( debate a aprofundar noutra ocasião).Se é um eufemismo jurídico para ausência de violência e se a lei é mais branda com um ser que penetra uma miúda de dez anos sem a espancar, óptimo. Nós no CM somos pela concórdia.
PC, As explicações que dá estão correctas e a notícia do 'Correio da Manhã', em termos de rigor, tem muito que se lhe diga (eg.: designar por enteada a filha da namorada). Contudo, nada justifica que alguém que mantém relações sexuais com uma menor de 12 anos fique isento de cumprir pena de prisão efectiva.
Carlos Azevedo, "nada justifica que alguém que mantém relações sexuais com uma menor de 12 anos fique isento de cumprir pena de prisão efectiva". Não sei. A moldura penal do crime é de 3 a 10 anos de prisão e, como sabe, a suspensão pode ser decretada relativamente a penas de prisão concretas até aos 5 anos (de pena concreta). Não conheço os pormenores do caso, mas podemos dizer que um caso de abuso de crianças de *gravidade média* será punido com pena de prisão em torno de 6 anos, e por isso a sua afirmação parece-me algo arriscada em face da lei vigente.
Se ler melhor o perfil verá que O Meu Máximo Ídolo É Jesus- acha que alguma vez Jesus Defenderia a solução final que defendo? Nem pensar! Sabe porquê? Porque É Deus, mas eu não sou, sou apenas cristã e, neste assunto, vou contra o que O Messias Defende e Pratica...aliás, é pura justiça...nem é uma questão de vingança, mas tão só profilática, pois estes seres ignóbeis são assassinos em potência e as vidas das suas vítimas valem muito mais do que as suas, primeiro porque são os inocentes de actos execráveis e não os agentes, i.e., os agressores; segundo porque são sempre em maior número, pois este tipo de gente é compulsivo, ainda para mais quando sabem que ficam impunes...logo, mantenho o que disse: depois de devidamente comprovado, boa pontaria...e que Jesus me Perdoe, mas o politicamente correcto dá-me náuseas e sei que ainda tenho de reencarnar muitas vezes até poder perceber O Perdão que Jesus lhes Concede... ...os norte-americanos não brincam neste departamento...só em países laxistas é que os crimes patrimoniais se revelam muito mais penalizantes que os desta ordem...
não volto a insistir em que 12 não é limite algum para efeitos do que persistes em chamar de "consentimento", como se fosse um termo meu, quando eu só tentei explicar o que aquela "notícia" (chamemos-lhe assim) tentou dizer. A tua argumentação tornou-se impenetrável (honni soit...). De toda a maneira, como sabes muito bem e provavelmente melhor que eu, a associação de consequências jurídicas a qualquer limite etário é sempre uma semi-ficção (pela tua ordem de ideias, 13, 13,5, 14, 15, também não são marcos especiais, nem uma pessoa de 18 tem mais discernimento do que uma de 17,5 para votar, e portanto não deveria haver idade de consentimento relevante). Mas só *semi*, porque assenta na experiência incontestável do processo de crescimento e amadurecimento da pessoa (de novo: bem sabes, melhor que eu, que todas as culturas têm ritos iniciáticos). Se mantens a opinião de que é qualitativamente igual forçar um menor a sofrer actos sexuais e fazê-lo com o seu consentimento (ou que só há aí uma diferença de quantidade), discordo totalmente. PS: nunca te imaginei na redacção do Correio da Manhã, mas substituirás com vantagem a coluna da Leonor Pinhão quando ela for nomeada presidente da CD da Liga.
Isabel: quer algo mais politicamente correcto do que pedir a morte de quem abusa sexualmente de menores? Olhe bem para esta caixa de comentários. E olhe bem para as caixas de comentários dos jornais que publicam estas "notícias". Qual é a opinião dominante e confortável?
PC, Não foi tendo em conta a lei vigente que afirmei o que afirmei (nem o poderia fazer, porque também eu desconheço pormenores do caso), mas sim pensando nas exigências de prevenção geral, dirigida à comunidade para garantir que saiba que a prática de crimes tem consequências, tão mais graves quanto mais grave for a infracção.
(Lateralmente: não peço sangue nem pena de morte, mas considero a moldura penal do crime desadequada, ou seja, insuficiente, até pela possibilidade, que o PC referiu, e bem, de suspensão da pena.)
PC, "Se mantens a opinião de que é qualitativamente igual forçar um menor a sofrer actos sexuais e fazê-lo com o seu consentimento (ou que só há aí uma diferença de quantidade), discordo totalmente."
Qual "menor"? Se o consentimento é um adulto perguntar a uma criança de dez anos se quer brincar a chupar as pilinhas, discordamos, infelizmente, de certeza.
podemos discutir a adequação das molduras penais, como tudo. Mas elas não devem ser calculadas em função da possibilidade de suspensão da pena, porque as duas coisas obedecem a critérios muito diferentes. Nem me parece boa ideia excluir a possibilidade de suspensão de pena em função da natureza do crime.
FNV
depreendo, portanto, que, prosseguindo o teu exemplo, achas que essa situação é qualitativamente igual à daquele adulto que coage o(a) mesmo(a) menor de 10 anos a sofrer sexo oral. Sim, discordamos de certeza, mas não sei por que razão "infelizmente". Só uma questão: o "jogo de chupar pilinhas", na tua linguagem tão vívida, deveria ser punido como *violação* (pois é isso que propões) até que a menor completasse que idade?
PC, Sim, é igual. Quando a desproporção de atributos ( físicos, mentais, económicos, etc) é avassaladora, não sei como consegues ( tu ou qualquer pessoa) delimitar consentimento de coacção. O infelizmente é por isto: ou essa filosofia é geral ou é apenas aplicada a estes casos.Qualquer alternativa é infeliz.
Quanto à segunda: Não falei de penas, não estou habilitado a discutir direito ( não fui ao curso organizado pela redacção), não sei. Tu é que estudas essas coisas, mas sei que deve ser difícil: vocês é que delimitam molduras ( é assim que se diz?) consoante o menor tenha 15 anos e onze meses ou 16 anos e um dia.
PC, Concordo que as molduras penas não devem, em caso algum, ser calculadas em função da possibilidade de suspensão da pena (nem foi isso que pretendi afirmar; se foi isso que resultou das minhas palavras, expliquei-me mal). Já excluir a possibilidade de suspensão de pena em função da natureza do crime não me choca. Mas o que eu pretendi com o meu comentário foi manifestar duas opiniões (pessoais, claro): por um lado, entendo que a moldura penal é desadequada, por insuficiência (e isso tem consequências, designadamente, a possibilidade de suspensão, o que é diferente de defender que quem determina a medida a pena deve 'manipular' o cálculo para evitar um resultado que permita a suspensão); por outro lado, o sistema jurídico é um todo, complexo, e tudo deve ser pensado em função de tudo, o que no sistema jurídico português falha demasiadas vezes, com a consequente descredibilização desse mesmo sistema (não é só -- nem sobretudo -- isto que leva à descredibilização, mas é inegável que contribui).
...por vezes, quando me deparo com notícias deste teor, penso que há uma questão que se revela importante e que caracteriza uma sociedade, tendencialmente, materialista, egocêntrica e hierarquizada (o padrão novo-riquista dominante ainda acentua mais esta valorização do umbigo, do concreto e da valorização do outro pelo status ou conta bancária e desvalorização do outro pelos mesmos critérios...)...ora este cidadão comum encara os filhos como extensão dessa autocentração e, como tal, como seres privilegiados em relação a outros menores que pensam não dispõem dos mesmos direitos que os seus filhos, todavia, são crianças e jovens que deveriam merecer os mesmos cuidados e protecção...resultado: para tais criaturas de condomínio fechado, as suas famílias são sagradas, o resto que se lixe, não se importando nada de expor outras crianças e jovens a perigos, desde que isso lhes sirva os propósitos...ora, isto leva a uma falta de empatia perante outros que não os deles (só os possessivos demonstram tudo)...acontece que, quando me referia ao politicamente correcto, referia-me a esta posição muito "laissez faire laissez passer" que permite a aplicação de leis que tentam ser mais humanas para com (os) agressor(es) do que para com a(s) vítima(s)...só isso explica tantos casos em que a impunidade se afirma como dominante...só tal explica a impunidade de agentes de crimes hediondos como os similares a este caso ou ao de universitários que matam um homem de 60 anos à pancada, saindo em liberdade, já para não falar de outros em que a clara violação dos direitos humanos é tratada com toda a leviandade...face a esta tendencial impunidade, reconheço que uma Mãe/Pai que se preze não deixa um crime desta natureza ficar impune...como não deveriam ficar impunes pessoas que desrespeitam os filhos, expondo-os a perigos, em prol do tal umbiguismo...felizmente que algumas desssas crianças têm um dos progenitores com boa pontaria e cuja descentração lhe permite colocar os filhos em primeiríssimo lugar, estando prontos para tudo...não sei se me expliquei bem, mas o que quero dizer é tão simples como isto: "em tempo de guerra não se limpam armas"...
Isabel, se há coisa de que não podem acusá-la é de não ter sido explícita. Foi, e de que maneira, e eu compreendo-a bem. Como não tenho filhos, não posso ser a "Mãe /Pai" que refere nos seus comentários. Mas também tenho os meus alvos: todo o pessoal que faz justiça pelas próprias mãos devia ser executado sumariamente. Trata-se de gente que renega séculos de civilização e o atavismo violento é muito perigoso para a comunidade. Mas enfim, temos ambos de nos resignar, o mundo não é como queremos.
Sabe, PC, que eu tb já acreditei piamente na justiça humana? Até ver com os meus próprios olhos o que quem tem poder pode fazer a vidas inocentes, impunemente, neste país, com as leis que temos. Mata, destrói, tortura, anula como quem vai à praia dar um mergulho e ainda é aplaudido, saindo a rir-se-passa por agressor o agredido, reciclando o Poeta. E aí levanta-se a questão- o que é a justiça? As coisas parecem tão mais fáceis à distância. O distanciamento permite-nos ter a frieza de defendermos o ideal. Mas e se o ideal, na prática, resultar no contrário dos seus princípios? É um dilema! Talvez porque não seja Pai pense assim, talvez porque como o FNV disse seja um profissional da área. Quando o caos se instala, quando injustiças diárias destroem vidas quem é que pode falar em justiça? É que cheag-se a um pouco da autonegação explícita. Por que é que uns são mais cidadãos do que outros? Por que é que os filhos e as famílias de uns são mais sagrados do que outros? Isso é justiça? Onde, quando, como e porquê?
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