O futuro é sempre agraciado com o colar da boa fortuna. Imaginamo-nos bem instalados, com netos, ainda activos e em boa forma sexual. Raramente adivinhamos uma casa vazia, a incapacidade para tarefas tão simples como levar uma chávena à boca, ódios acumulados ou uma cabeça dolente. Não valeria a pena viver se soubéssemos que o futuro nos reserva tais desditas, dirão alguns. Pois há quem pense precisamente o contrário. Um beijo numa pele macia ( e caberá ao leitor a escolha da superfície), por trivial que possa parecer, não terá preço quando já não houver pele para beijar. O nosso tempo conta connosco, o futuro conta com os outros.
Em Lisboa há um pedaço de uma circular externa que esteve trinta anos para ser desenhado. Agora que está desenhado é alvo de mil protestos porque parece que há mil erros. Sócrates estava impante nas sondagens quando o PSD descobriu na OTA falhas inultrapassáveis. Várias personalidades também descobriram a tempo as virtudes do cepticismo sistemático onde antes estava a certeza da " realização de uma obra essencial". A pequena ( em termos de peso eleitoral) oposição ( PCP, BE e CDS) montou rapidamente o cavalinho do cinismo aeronáutico: os dois primeiros porque este governo "é de direita", o último porque de vez em quando tem de mudar a garrafa de oxigénio. O novo aeroporto discute-se há trinta anos. Dado que um aeroporto é mais difícil de construir do que seis quilómetros de circular externa, calculo que outros trinta vão ser necessários para o acabar. Sim, porque nós não somos parvos, a nós não nos impingem histórias da carochinha.
posted by FNV on 7:22 da tarde
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ODI ET AMO (LIII):
Vive uma espécie de morte letal: quando perdemos a amizade ou o amor de alguém e os anos passam e passam sem que essas coisas voltem. Tem o rigor táctico da morte - não se fala, os cheiros são memórias - e serve um ritmo perdido: houve um tempo em que fazíamos coisas com essas pessoas. Subsiste, no entanto, uma diferença para a morte oficial. O outro - um amigo, uma mãe, um irmão - vive, e isso retira-nos o único consolo que o tempo oferece: a resignação.
A SIC paga o acesso exclusivo a Pinto da Costa com serviços destes. Está à saída do Estádio do Dragão a entrevistar espectadores: "Gostou?", "Não sai desiludido?", "Não acha que a exibição foi fraca?". E teve um duplo azar: porque Portugal qualificou-se para o Europeu ( uma chatice) e porque os portuenses saíram do estádio satisfeitos.
Um tribunal diz que um cozinheiro infectado com o HIV pode infectar os comensais através do suor, a brigada do pé franco ( que eu gostava de ver comer os pratos do chef) diz que o HIV é muito pouco resistente ao ar. Estas duas atitudes mostram por que motivo Portugal lidou ( e lida) tão mal com o problema. Uma é anticientífica, própria de uma cultura do medo; a outra, na ânsia tolerante-chic, deixa as pessoas a pensar se será assim tão urgente trocar seringas nas prisões.
posted by FNV on 9:46 da tarde
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AZAR DOS TÁVORAS:
Um miúdo de oito anos está a ser disputado por Benfica e Sporting como um pedaço de carne. Privacidade para que te quero, traz daqui leva daqui, cenas de faca e de alguidar. O azar do garoto é não haver gays envolvidos ( nem cartazes de festivais de cinema).
posted by FNV on 8:56 da tarde
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VER A BANDA PASSAR:
Gaia e Santarém estão endividadas até à medula? E se os jornalistas investigassem quantos concertos musicais essas autarquias ofereceram aos seus munícipes? Ou existe um pacto de silêncio entre os media e o pessoal cantante ( eu convido-te/tu convidas-me e por aí fora) ? Por portas travessas ( e outras escancaradas) sei que foram muitos. E todos à borla.
O Sindh, sempre o Sindh. Na série Narcoanálise, quando revi ( muito) ligeiramente alguns factos sobre Musharraf, já tinha abordado a coisa. Toda a história ( e mais uns links interessantes) sobre Imran Khan aqui.
Dezembro é um bom mês. Este décimo mês depois de Março ( o decem ), no antigo calendário supostamente inventado por Rómulo, traz uma luz de aço. Nos tempos antigos, os homens sentavam-se no escano à beira do lume e pensavam na vida. Hoje não se pensa, não é preciso. Deve morrer-se bastante em Dezembro. Gente só, que vive em apartamentos frios e quase vazios, gente que não vai esperar pelo fim da telenovela. Não é preciso.
Mar de opinioes, ideias e comentarios. Para marinheiros e estivadores, sereias e outras musas, tubaroes e demais peixe graudo, carapaus de corrida e todos os errantes navegantes.