Bem pregava Bourdieu sobre o constrangimento do actor no campo político - não pode falar. Pouco importa o assunto em si, o que conta é o tom do jogral: "à bruta" e "sem benevolência". Se Sócrates discorda de L. Amado, era suposto ter dito o quê? Insuportável é depois ouvir ( e com esforço, porque não sabe falar) Ana Sá Lopes, na TV, queixar-se da lalangue dos políticos portugueses. Ou seja: ASL produz o espectáculo que depois assobia.
Durante toda a manhã a TSF salivou: "novo barco a caminho de Gaza" , "situação explosiva", Israel "não vai ceder". Depois da sesta recomecei a ouvir os noticiários e constatei que o navio tinha desparecido do radar. Não foi necessário um cérebro auxiliar: não houve sangue. E eu a julgar que a TSF estava interessada no destino da ajuda humanitária a Gaza.
Na portinhola da Indaqua Matosinhos, empresa que faz com as águas aquilo que dantes as Câmaras faziam sem empresas, pode ler-se um aviso atencioso para com o cliente que lá se dirija: estão fechados nos dias 4 e 11 de Junho. Interrogo-me sobre a razão de tão estranho encerramento e imagino que, com o sol que está, o pessoal das águas tenha ido a banhos. É por estas e outras que, não tarda muito, o país inteiro irá por água abaixo.
Em tempos fizeram-se várias manchetes, repetidas manchetes sobre as acusações feitas a diversas pessoas, num processo complexo a que se deu o pomposo nome de apito dourado. Veio até gente de Lisboa, para garantir que os provincianos não estragariam a festa da capital. Reuniram-se meios e colocou-se à frente magistrada alfacinha já com opinião formada para nada falhar. Agora que os acusados foram absolvidos, curiosamente não vejo manchetes nem primeiras páginas explosivas. Nem sequer em defesa do dinheiro dos contribuintes. No entretanto, a pseudo-escritora que o MP, uma jornalista e o Presidente do Benfica tanto acarinharam foi condenada nos tribunais a sério. Mas isso também não é notícia. Notícia, notícia, segundo a Bola de ontem, é o FCP ter obrigado o Benfica a gastar mais de um milhão de euros para conseguir segurar o seu treinador. Isto sim, é manchete.
posted by VLX on 2:11 da tarde
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TER SEMPRE PRESENTE:
Os portugueses vão pagar o que o PS andou a gastar às escondidas para se manter no governo.
Em Janeiro de 1947 ( "Leçon de Valery" no Listener) , Eliot escreveu sobre Valery: A sua modéstia e informalidade eram as qualidades de um homem sem ilusões. O apreço de Eliot pela poesia francesa , sobretudo Valery e Cocteau, não era comum nos editores ingleses, quanto mais a amizade sincera. Muitos anos antes, em 1923, Eliot retribui uma carta de Valery. Fá-lo em francês, algo de francamente incomum, e com gusto. Valery tinha-lhe escrito a propósito de questões editoriais, mas incluiu um elogio publicitário à revista de Eliot, que leu a bordo de um navio que atravessava o Canal: La mér était fort sévere, mais le numéro du Criterion m'a rendu indépendant du mouvement. Faço o mesmo nos aviões: nas ( felizmente pouco frequentes) descolagens e aterragens, embrenho-me no mato e caço com Capstick, Patterson ou Pardal. Eles que se mexam.
posted by FNV on 11:15 da manhã
#INICIATIVA DE SUCESSO:
Depois disto, uma série de bloggers, que de vez em quando debatiam comigo os mais variados assuntos, passaram a incluir-me , de um modo geral, no grupo das "bestas" e dos "imbecis"( não foi a primeira vez que descobri esta amável esquizofrenia). Veio mesmo a calhar, porque iniciei a políticaJohn Mortimore("no comments")nos meus posts. Ninguém perde tempo e fico ainda mais isolado. Óptimo.
posted by FNV on 2:51 da manhã
#Dr. K.A.MORE (VI):
"Gostava que o meu marido fosse como o dr.Filipe: atencioso e, sobretudo, com muita paciência para me ouvir. Com ele tenho quase sempre a sensação de estar a falar para uma parede".
É uma questão de experimentar. Peça ao seu marido para a ouvir uma hora por dia, fins de semana incluídos. Serão 1960 euros no fim do mês. A conversa equivale ao sexo: as mulheres sonham com um ouvinte atencioso, os maridos com uma ninfomaníaca. Você pode não acreditar, mas ele gosta de a ouvir. O Eduardo Prado Coelho contava uma história nemesiana. Um explorador vai a uma aldeia africana perdida nos dembos e leva um intérprete. Chegam ao pé do soba, que desata a dar à língua. Ao fim de uma hora, o explorador, impaciente, pergunta ao intérprete: "O que esteve ele a dizer?". O intérprete responde: "Nada. Por enquanto está a só falar".
É um dom. Os judeus são como o azeite Gallo: a cantar desde 1190.
posted by FNV on 2:04 da tarde
#Dr. K.A. MORE (V):
" A minha filha não gosta de rapazes. Falou comigo no outro dia , mas eu já sabia, já desconfiava. Nunca a vi com um rapaz. Diz que está apaixonada por uma colega, mais velha, que já está em estágio. Estou de rastos, o meu marido está em choque. O meu mundo desabou".
Pois desabou e já não há nada a fazer. Acontece. Adiante. O que lhe parece o mundo novo? A sua filha respira sozinha, estuda e ri-se, não é? E, quando a vê, a senhora dá-lhe beijos, não dá? O seu mundo novo é velho. É ter os filhos vivos, felizes ( enfim, nesta época ensinam-lhe essse disparate da felicidade, parece que vem nas revistas) e ao pé de nós. Faz-lhe impressão imaginar um almoço com a namorada da sua filha? Claro que faz, compreendo. Antes de elas chegarem, pense em todas as vezes que teve a sua filha nos braços, vá ao álbum buscar uma fotografia antiga. O que é que conta, do princípio ao fim dos tempos? Pois é.
Continuemos com Broch ( O problema da morte da civilização, 1936): os pensamentos, os conhecimentos e as verdades humanas pertencem todos ao mundo quotidiano da época. Cada época constitui-se como estado definitivo do mundo, Broch entendendo que isto se aplica especialmente às épocas religiosas. Estamos muito longe da época de Broch, que se fechou sobre ela, é certo, mas sobram indícios. Invertendo os termos: a religião da época europeia ( a cristã) compreendeu, sem rebuço, que uma certa totalidade acabou. Restam morceaux, mais ou menos espalhados, mais ou menos vivos.
posted by FNV on 10:17 da tarde
#OS AMIGOS DE MUNIQUE ( mais "amizades e afinidades culturais"):
Não gosto muito desse estilo de crónica social, mas falam de, por exemplo, quase toda a extrema-esquerda europeia respeitável, dos anos 70 e 80, que alinhou com a revolucionária ( que matou centenas de soldados em cafés, escolas, ruas , jardins e restaurantes) e com os movimentos de libertação palestinianos ( que matavam soldados-crianças em autocarros a caminho da escola) ?
Os americanos de Obama, no Iraque e no Afeganistão, com a guerra a milhares de quilómetros de casa, já executaram centenas de operações com "uso de força desproporcionada" nas quais morrerram milhares de civis. É a guerra, acusam os compreensivos. Por isso aprecio os que dizem o que pensam. Antes assim do que desculpando-se com uma realidade com pouco mais de meio século.
Em adenda ( 1850) à primeira edição de The Princess ( 1847) , Tennyson assina duas imagens sobrelotadas. Uma , tão contraída que até dói, reza assim:
Ask me no more: the moon may draw the sea.
A outra, ligeiramente mais longa,é a história da tradição:
The splendour falls on castle walls And snowy summits old in story.
posted by FNV on 11:21 da tarde
#Dr. K. A. MORE (IV):
"Ele só é carinhoso comigo quando quer cama. É assim há quase 15 anos, mas agora está pior. Fora disso é incapaz de uma festa, de uma conversa de jeito. Chega com a neura e adormece em frente ao sofá. Isto não é vida".
Permita-me discordar. Isso é vida: a vida. Salvo anormalidades, uma longa relação só sobrevive assim ou com a ajuda de terceiros: uma colega de escritório ou um instrutor de ginásio ( se tiver andado no liceu consigo ainda funciona melhor). O seu marido é um fundamentalista dos preliminares. Por isso não os desperdiça ao pequeno-almoço ou quando estão no hipermercado diante do balcão dos iogurtes. É um purista, um cavernícola. O problema, como já percebeu, é você. Quer amor e compreensão? Então diga adeus à vida boa e olá a um divórcio desgastante. E comece a fazer continhas.
posted by FNV on 10:59 da tarde
#MUDANÇA DE TURNO (II):
Depois da acertada há 15 dias ( nada de bola, política actual e modas até ao fim da época estival), um ligeiro acrescento: nada de comentários. Fazemos todos umas férias.
posted by FNV on 10:59 da manhã
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A ÚLTIMA SÉRIE (XIII):
Broch ( Lógica de um Mundo em ruínas, 1931) entra na série. Assim:a actividade do homem decorre entre o absolutismo do mal e absolutismo do conhecimento. A consciência moral, em auto-vigilância, avalia permanentemente a própria vida e o pensamento. E nasce a ética como valor. Compreendemos assim por que motivo tantos tiranos sanguinários conhecem bem o que povo quer e se regem por princípios elevados.
posted by FNV on 10:29 da manhã
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O MÁRTIR ESTÁ CARO:
E por isso é difícil de arranjar. O que me impressiona sempre é a forma como os media engolem estas claques ( repetem as key words que Badiou lhes ensina) que só se amam a si próprias ( estão-se nas tintas para o "povo"): tratam-nas como actores políticos.
posted by FNV on 10:07 da manhã
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CAUSAS FRACTURANTES:
A única verdade demonstrada é que a crise está instalada em nossa casa qual sogra desavinda (isto para quem as tem e enquanto não for decretada a igualdade obrigatória entre sogra e sogro), mas diz-se que o Bloco de Esquerda e o Partido Socialista estão entusiasticamente interessados em coisas verdadeiramente úteis, sérias e preocupantes para os portugueses: o homem deve poder tornar-se mulher mantendo o pénis, e a mulher tornar-se homem mantendo a vagina. Parece-me razoável, dentro do género, mas pode ser da hora.
O assunto, segundo a notícia, vai ser discutido na AR em Setembro, durante as vindimas, o que me parece também uma bebedeira perfeitamente natural. Aparentemente, um psicólogo poderá determinar se outra pessoa será homem ou mulher, coisa que já me aflige nas discussões futebolísticas com o Filipe Nunes Vicente. E se ele, no meio de uma briga sobre os pontapés do Luisão no adversário indefeso, assina atestado de que sou mulher? Como é que eu faço?
Em tempos, querido familiar advogado mais velho disse-me que o Direito era a ciência mais exacta de todas, “pois se um grupo de Conselheiros afirmar que esta parede branca é preta, esta parede branca fica preta para todo o sempre não importando o bronco que escreveu sobre a branca que era preta para os outros assinarem, em branco, e preto no branco, que a parede branca era preta.” Na altura pareceu-me acertado e evidente mas pode ser porque estivesse saidinho da Faculdade.
Estava esse meu querido familiar errado: hoje, a ciência exacta é a Psicologia - pois se eles atestam que um tipo é tipa, não há maneira de mudar o tipo da coisa. A coisa passa a tipo e o tipo coisa. Entre amigos, finos e tremoços, seria obviamente e para todo o sempre "o coisinha".
Para não haver mais confusões, sugeria à medicina que inventasse o modo de termos os nossos órgãos sexuais implantados na testa. O que se gastasse a mais em lenços poupava-se em papel higiénico e ao menos ficava-se a saber o que cada um era. São exigências próprias da nossa era e deixávamos de ter de nos cobrir ao centro com hera. E provavelmente deixávamos de andar às cabeçadas uns com os outros, não fosse o diabo tecê-las...
posted by VLX on 1:30 da manhã
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VENHA O DIABO E ESCOLHA...:
A questão da mentirola sobre o encontro com Chico Buarque não é de somenos. Sobre o assunto, o gabinete de Sócrates preferiu dizer que errou, não que tivesse mentido. É sempre a mesma coisa. O PM também diz que não mentiu no caso PT/TVI, apenas que não foi informado.
Ora se não foi informado de um negócio onde estavam directa ou indirectamente metidos não só os seus amigos como os considerados seus inimigos, então é um desgraçado a quem ninguém liga.
E se tem um gabinete que erra de forma tão flagrante ao ponto de o mostrar em biquinhos dos pés aos pés de um cantor, ou como um mentiroso perante a comunicação social, a única conclusão a tirar é a de que é verdadeiramente um desgraçado a quem nem o seu próprio gabinete trata com cuidado.
É que se uma pessoa que erra prefere deixar a imagem de que é um desgraçado em vez de um mentiroso, ou é mentiroso ou é mesmo um desgraçado.
O nosso Primeiro-Ministro vê-se de novo envolvido em situação que implica mentira, o homem é um fenómeno. Desta feita resolveu mandar dizer que Chico Buarque o quis conhecer e por isso ele lá foi a casa do cantor/poeta/escritor. A mentira tinha perna tão curta que o próprio Chico a evidenciou, mais ou menos com estas palavras: “então eu é que o queria conhecer e ele é que vem a minha casa?!?”
O gabinete do PM disse que afinal o PM é que quis conhecer Chico Buarque, e terá utilizado a sua posição pública para conseguir essa vantagem privada. Admitiu ter havido erro na informação prestada, afinal. Outra mentira evidente. Outra pouca-vergonha. Pergunto-me quantos dentes terá ele na boca...
posted by VLX on 10:59 da tarde
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Dr. K. A. MORE (III):
" Desde que ele morreu deixei de acreditar em Deus. E já passou tanto tempo. Tinha 19 anos: por que é que Ele mo levou? Muitas vezes ficava acordada e só adormecia quando ouvia o carro entrar na garagem. Na noite do desastre estava muito cansada, mas acordei angustiada. Já não acredito em nada. Já não sirvo para nada".
Você não podia fazer nada até que se lembrou de deixar de acreditar. Ainda bem. Conseguiu fazer alguma coisa. Um serviço valiosíssimo que o seu Deus lhe prestou. Não serve para nada? Nem eu. Ninguém serve. Estamos para cá para que os outros façam alguma coisa de nós. Deixe as suas filhas e o seus netos tentar. Você ficará com a sua nova religião: noites malditas com esses olhos de gesso violento. E no dia seguinte leva a sua neta à escola.
Mar de opinioes, ideias e comentarios. Para marinheiros e estivadores, sereias e outras musas, tubaroes e demais peixe graudo, carapaus de corrida e todos os errantes navegantes.