A PALHA: O que veio fazer à TV um primeiro-ministro na sua mensagem natalícia? Veio dizer que perdoa aos inimigos, veio falar das canseiras do seu posto, veio explicar-nos que tem o triste fado de nos suportar. Sempre na primeira pessoa, sempre no centro da mangedoura.
BLOGO-SOCORRO:: Para todos os deprimidos natalícios, este sinceramente vosso psi coloca ao dispôr um serviço on-line de aconselhamento. Está triste porque não conseguiu perceber o alcance profundo dos posts do nosso VLX sobre o verdadeiro espiríto natalício? Escreva-me um comentário. Está aflito porque está sozinho nesta hora feliz? Idem. Está enraivecido com o consumismo coca-cola? Idem aspas.
A nau está silenciosa e caminho pelo tombadilho com um purito nos dedos, enquanto olho as estrelas. Se existem almas confusas com o ar do tempo terei todo o gosto, como bom aldrabão-psicólogo que sou, em ajudar. Sou um incréu assumido, naturalmente aberto a todos os deuses.
Resposta ao primeiro leitor: não interessa a forma como escrevo, só interessa a razão porque escrevo ( foi o que aprendi com W.Benjamin). Mas a ti, anónimo atento, que te interessa? Posso dizer-te o que vi esta noite: uma coruja que teima em não reaparecer, uma fogueira azul. Daqui do posto de comando das Forças Armadas dos Incréus, asseguro-te que os azimutes também se rebelaram. Todos ao Rabaçal, que a morte nunca nos leva a mal.
Resposta ao Miguel: Pressuponho que se estás a olhar para Lisboa a esta hora da madrugada, é porque já não aguentas olhá-la durante o dia. Acontece o mesmo a alguns casais cansados de tanta união: ao fim de uns anos já só contemplam o outro adormecido. Dir-se-ia que um olhar nostálgico repousa no invólucro do que já foi belo e vital.
Um abraço e boa vista.
posted by FNV on 10:25 da tarde
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O SEGREDO: UM amigo de Mourinho foi passar uma semana a beber os métodos dele e veio de lá inchado porque Mourinho lhe contou o segredo das sua equipas para a "pressão alta". Diz Formosinho ( assim se chama o amigo) que se muitas equipas conseguem fazer a tal "pressão alta", só as de Mourinho a aguentam durante os 90 minutos. E que isto tem um segredo que ele não pode revelar. O mais engraçado é ele ser tão limitado ( neste aspecto) quanto o jornalista de A Bola que faz a peça, pois que também ele "gostaria de saber o segredo de Mourinho".
Se viram os jogos do FCP nos últimos dois anos, repararam que era frequente ver o Deco ou o Derlei a fazerem de defesas laterais e a cederem cantos ( a "postura defensiva", em futebolês); tanto quanto era habitual verem o Costinha ou o Ricardo Carvalho a pressionarem os defesas adversários quando estes tentavam iniciar a circulação de bola. Mourinho fez contas simples: se entregarmos a pressão alta - aquela que é feita sobre os defesas e trinco adversários quando estes tentam iniciar a jogada - apenas aos jogadores que habitualmente estão perto deles ( avançados, nº 10 e extremos), obviamente que estes bravos ao fim de 1 hora estão estoirados. O que Mourinho faz é dividir essa tarefa, a "pressão alta" pelos 10 jogadores de campo: se todos participarem, a "pressão alta" dura o jogo inteiro.
Claro que isto necessita de um excelente modelo de organização de jogo, mérito absoluto de Mourinho: cada um deve saber exactamente o que fazer e quando o fazer: quem sobe, quem compensa, etc.Tudo isto caldeado com disciplina e espírito de equipa, mérito absoluto, e novamente, de Mourinho.
Um segredo apenas para os cegos, portanto.
posted by FNV on 7:24 da tarde
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A NOSSA FESTA: Devo confessar que a estratégia foi magnificamente bem montada. Começou-se por afastar o Deus Menino, substituindo-O por uma personagem promotora da Coca-Cola, com nariz de bêbedo, alegadamente aparentada de S. Nicolau. Os presentes, que antes se limitavam às crianças e que apareciam milagrosamente nos seus sapatinhos, são agora atirados pela chaminé pelo velho barbudo dos refrigerantes. Vão parar às peúgas de losangos, amontoadas junto a uma árvore de plástico pejada de brilhantes que substitui o esclarecedor e bonito Presépio. Até a vaquinha e o burro foram suprimidos, inventando-se para o seu lugar umas quantas renas, uma delas bastante esquisita. Em lugar dos anjos, atiram-nos com duendes de caras abjectas que terão por missão auxiliar o velho das renas. E, com tudo isso, fizeram sua a nossa festa.
A NOSSA FESTA II: O pior penetra é aquele que não só vem à nossa festa sem ser convidado como ainda se dá ao luxo de se espojar pelos sofás e de opinar e sugerir alterações às comemorações. Foi o que se passou com o Natal. Hoje toda a gente quer festejar o Natal mas como não o querem celebrar como ele é nem vivê-lo como deve ser, toca de o alterarem e de o despirem de tudo quanto é importante. Falseiam a realidade e dizem disparates como os de que o Natal é a festa da família, que o Natal é a união, que é amor, que é a festa das crianças e dos adultos e outras coisas do género. Chega-se ao cúmulo de se dizer que o Natal é quando o homem quiser (e que é esperança. Quase que me esquecia desta, a de que o Natal é esperança). São baboseiras destas que ouvimos em quaisquer entrevistas de rua todos os anos. Quando vem o Presidente da República oferecer-nos a sua mensagem de Natal e falar-nos do "espírito natalício" só me ocorre aquela velha tirada de Álvaro Cunhal - "Deus nos livre!..." Que sabem um e outro de ambas as coisas? Que sabe Sampaio do espírito natalício? Que sabe Cunhal de Deus? Que interesse pode ter para a comemoração do Natal um velhote de barbas, montado numas renas suadas e acompanhado de uns quantos duendes? Que interessa essa porcaria? Porque não escolheram outra data qualquer para festejarem essa coisada toda? Porque se apoderaram do nosso Natal sem o mínimo de respeito? Porque fizeram sua a nossa festa.
A NOSSA FESTA III: A minha pequena vingança alegre é a de que a maior parte das pessoas que não vive o Natal tal como ele é e se entretém a dissolver o seu subsídio em disparates sem sentido, passa necessidades o resto do ano. As lembranças que dantes se ofereciam apenas às crianças nesta altura têm um significado e representam as ofertas dos Magos ao Deus Menino. Não sei que motivo aqueles que não acreditam nisto encontram para oferecer presentes ou para torrarem os seus rendimentos ou derreterem os seus cartões de crédito mas é giríssimo ver a azáfama desta gente nestes dias. Gastam-se inúmeras energias e economias para tudo se acabar num monte de papel de embrulho rasgado e caixas de cartão no lixo. Porquê? Porque não se utiliza o cacau de forma mais inteligente? O que levará esta gente a desfazer a sua paciência e as suas economias festejando coisas em que não acreditam? Porque fizeram sua a nossa festa (e não sabem vivê-la).
A NOSSA FESTA IV: Devia haver um ano em que todos fizessem como Mr. Krank, do livro de John Grisham. Mr. Krank não vivia o Natal e limitava-se às despesas imbecis comummente aceites pela maioria das pessoas que não sabe viver o Natal, que não vive o que está para lá da imbecilidade gastadora, que não vive aquilo que realmente justifica a comemoração do Natal. Até que um ano Mr. Krank decide não festejar essa época pela despesa que ela implicava.
Pois eu também acho que se ao invés de andarem numa correria louca apenas atrás de uma dissipação atroz do seu dinheirinho as pessoas parassem um ano para pensarem no que é verdadeiramente o Natal, talvez se consciencializassem de que o Natal é a comemoração do nascimento de Jesus Cristo e o vivessem de forma diferente e mais condigna. E, assim, ao invés de fazerem sua a nossa festa, talvez se juntassem antes à nossa festa e percebessem o que estavam a comemorar.
PS: eu queria desejar a todos os que vivem realmente esta época um santo e feliz Natal. Ao resto do pessoal faço votos de que tenham um feriado porreirinho e prendinhas catitas.
posted by PC on 2:44 da tarde
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DEPRIMENTE: Clara Ferreira Alves ao Independente hoje: "Ando há anos a educar este povo". Não sei o que será pior: pessoas como esta estarem de facto convictas do que dizem ou o que dizem ser de facto verdade.
posted by FNV on 1:52 da tarde
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MEMORABILIA O momento do ano para mim desdobrou-se em três, ligados entre si: a adesão à UE de alguns dos "ex-países de leste", o processo eleitoral no Afeganistão e no Iraque e o início das conversações visando a adesão da Turquia.
Estes momentos têm aspectos duvidosos ou mesmo negativos, mas todos compreendem, julgo eu, uma propriedade valiosa: um esforço no sentido de diminuir a distância tensa entre os povos. O tempo, esse grande escultor, estou convicto que fará justiça ao que é essencial .
posted by FNV on 1:14 da tarde
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DA MENTIRA: Nos tempos que se adivinham vamos ouvir falar muito dela e da sua meia-irmã, a verdade. Nem todas as mentiras são necessárias - só bebi três copos - ou piedosas - tens uns olhos lindos - ou mesmo inconsequentes - quis dar-te os parabéns mas tinhas o telemóvel desligado. Há uma outra mentira, que os psicoterapeutas conhecem bem, a mentira verdadeira. Esta mentira é positiva no sentido em que serve para construir algo numa relação. No Padrinho I, Al Pacino, apertado, faz uma cena, para depois dizer que finalmente autoriza a mulher a fazer-lhe uma única pergunta sobre os "negócios". Diane Keaton pergunta-lhe então se ele matou o cunhado; Pacino, depois da pausa actor's studio, responde: não. Nesse momento Pacino perde o respeito pela mulher.
A mentira positiva tem esse efeito: desacredita não o mentiroso mas o mentido, na medida em que subverte a identidade do outro. Este outro, ao qual mentimos ( e que acredita), passa a ser uma personagem construida por nós. Na política acontece um pouco a mesma coisa. O governado ao qual se pode mentir impunemente passa a constituir uma extensão instrumental do governante, tão importante como um cartaz ou um autocolante de campanha. E lá se vai, suavemente, a velha regra kantiana que manda tratar os homens como fins e não como meios.
AÍ ESTÁ:" Pinto da Costa propõe Alberto João Jardim para Presidente da República", notícia da SIC-N, há bocadinho. Aguarda-se o próximo artigo de Miguel Sousa Tavares enquanto se observa o sorriso divertido de Rui Rio.
Já o meu amigo e colega de nau PC, se disser alguma coisa, será sobre a dicotomia natural entre as extraordinárias qualidades de um indivíduo para comer a sopa e a sua irremediável falta de jeito para dobrar colheres.
posted by FNV on 11:20 da tarde
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O EXPLIQUÊS: Uma multa de 1500 euros, mais ou menos o mesmo do que o que é aplicado individualmente a um condutor que tenha cometido uma infracção grave, foi o que a Liga de Futebol Profissional ofereceu ao Vitória de Guimarães na sequência de mais uma cena de cadeiras arremessadas num estádio do Euro-2004, o "tal" que iria elevar o nosso futebol aos patamares do século XXI.
Repete-se até à náusea: "embora condenando e coisa e tal, existem factores que explicam as reacções dos adeptos". Foi o que lemos, e é o que lemos, vemos e ouvimos sempre nestes casos. Os "factores" são sempre múltiplos: as provocações dos adversários, o calor, o álcool, o frio, a seca, a chuva. Quando a polícia dá uns tabefes a uns destes meninos, lá estão as TV's a passar em directo as queixas dos agredidos: "isto é uma vergonha", "regressamos ao tempo do fascismo", etc.
O "expliquês", subproduto de uma pseudo-sociologia igualitária ( e da sua prima, a psicologia-de-cordel), desculpabilizante e supostamente albardada no remorso pelo estilo de vida ocidental, aplica-se a outros tumultos. Hoje ( a bem dizer, de há mais ou menos 60 anos para cá) niguém tem o direito a ser mau, pulha, ou besta, puta ou drogado. Se o somos, é porque a malvada sociedade capitalista não nos proporcionou um desenvolvimento justo e harmonioso, como o dos "ricos".
Claro que as claques de futebol envergonham um pedaço os adeptos do "expliquês", mas não os paralisam: se quem arremessa cadeiras são meninos sem dificuldades materiais, são também meninos com o cérebro chupado pela sociedade do espectáculo, descerebrados e uniformizados pelo consumismo.
O "expliquês" é como a Toyota: veio para ficar.
posted by FNV on 1:25 da tarde
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CLÍTORIS & CULINÁRIA III: Sei que não é um assunto muito natalício, mas os posts são como as cerejas ( e os coments também). Uma teoria interessante é a que afirma que a verguinha feminina não passa de um orgão vestigial: já serviu mais. Básicamente as mulheres terão tido em tempos enormes clítoris, muito úteis em no tempo em que se portavam como as bonobos que passam a vida a copular, mas não só: a brincar, a excitarem-se umas às outras, enfim, um regabofe. O embrião humano tem a capacidade de gerar os dois sexos ( somos todos bissexuais na origem...), daí as meninas nascerem com um subproduto do pénis e os rapazes com dois mamilos. Para que quer um homem macho dois mamilos? Os peircings são coisa recente.
A ideia da vestigialidade do clítoris apoia-se em parte no facto de ainda hoje uma mulher não precisar do coito para ter orgasmos. Assim, que raio significa a lenga-lenga que assegura que uma mulher que é boa na cama não sabe cozinhar? Talvez uma antiquíssima memória da espécie: podendo e sabendo divertir-se, uma mulher assim não quer nada com tachos e panelas, é de um tempo anterior ao primado da ( suposta) monogamia.
Bom, com todo o respeito pela biologia evolucionária, psico-biologia, sociobiologia e outras disciplinas, a coisa pode ter uma explicação associada. Nenhuma mulher sabe de facto cozinhar, porque carrega a maldição de associar a cozinha a uma obrigação; o mais que pode aspirar é a fazer "boa comida", comida-de-mãe. Já o homem, não tendo clítoris nem a respectiva possibilidade de subtrair o prazer ao relógio, vinga-se no dom de manipular os alimentos, os cheiros, os sabores, os aromas, as texturas.
Dir-me-ão: e então e os homens que não sabem cozinhar? Direi eu: não sabem, mas podem aprender. São como as mulheres desesperadamente anorgásmicas : com jeito acabam por lá chegar.
Resposta a comentário ( da Tatie?): a mulher não precisa de manipular um orgão reprodutivo para ter um orgasmo, é o que eu queria dizer. Já quanto ao pénis poder ser um vestigío do clítoris, essa julgo ser mais difícil, mas nunca se sabe...
Um beijo e Boa Páscoa.
posted by FNV on 11:53 da manhã
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"DRIVING AWAY FROM HOME...":Segundo o DN de ontem, José Sócrates, sempre muito seguro de si, afirmou, perante uma plateia de jovens socialistas lisboetas, que "não quer agradar a todos". A propósito da co-incineração, claro.
Pela parte que me toca, já está no bom caminho. Quando o PS era Governo e Sócrates ministro, pareceu-me que a decisão de instalar a co-incineradora em Souselas era, no plano procedimental, inatacável. O que não me levava, evidentemente, a concordar com ela, por uma razão substancial: atendendo à diversidade das opiniões dos peritos acerca dos potenciais riscos para a saúde pública, prosseguir com a instalação significava a violação de um princípio elementar deste tipo de políticas - o princípio da precaução.
Na altura, a polémica tomou direcções inverosímeis, para não dizer ridículas, de um lado e do outro da barricada. Uns defendiam que as co-incineradoras deviam ser instaladas nos lugares onde se produzem os resíduos tóxicos (tese quem come a carne fique também com os ossos); outros defendiam que as populações afectadas deviam ter uma "visão global" do País e aceitar algum sacrifício em nome do bem geral (tese Portugal é maior que o teu quintal).
Não é de nada disto que se trata. O problema é só este: enquanto não houver juízos conclusivos e independentes sobre a natureza e a dimensão dos riscos associados à co-incineração, ela não pode ter lugar, ainda que seja para pôr fim a uma situação actual globalmente mais perigosa. Por outras palavras: não é politicamente legítimo diminuir riscos que ameaçam a generalidade da população através da sua concentração sobre certos grupos.
Se as coisas são assim, não se pode pedir aos grupos mais afectados que "compreendam" a decisão. Mesmo que seja essa a vontade da maioria, a democracia também se faz das minorias - não da unanimidade. Ora, como, para mim, está fora de causa votar no CDS/PP, em Santana Lopes, no PCP ou no BE, terei de votar em branco. E, pelo rumo que as coisas levam, começar a ouvir outra vez os It's Immaterial.
O SINTOMA DE ELÊUSIS: Neste Natal o Ocidente vai sofrer uma comoção. E não, não vão ser as renas do Pai Natal que se vão constipar. Como é que eu sei? Porque sonhei. Sonhei com gente aquecida a trinchar perus e a escolher agasalhos, e muitos, muitos telemóveis. E sonhei com o desleixo gordo e pacífico dessas conversas celulares e com outra gente. Gente que não trincha perus mas que fala ao telemóvel. E que fala muito. E que combina rituais, coisas para iniciados. Coisas más. Coisas más para quem está a trinchar perus.
posted by FNV on 9:46 da tarde
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TOPOGRAFIA SENTIMENTAL: Cada vez que eles falam do Alto Douro, torce-se um nervo cá dentro. Hoje o Besugo pôs uma fotografia das vinhas com nevoeiro, e é assim mesmo, por cima das vinhas, quando está nevoeiro: "névoa e fraguedos, vinhas a descer pelos ombros dos homens abaixo".
Foram muitos setembros, às vezes outubros (quando as férias eram dignas desse nome), a pinchar por ali, no meio da bicharada, das amoras e do cheiro a mosto. Chegar de comboio à estação da Alegria, quatro horas depois de sair do Porto, a somar às duas que se traziam de Coimbra. Descer, caindo repetidamente, de S. Salvador até à Valeira, pela Quinta do Cachão, sempre temerosos da Ressurreição dos Mortos, com a cana de pesca (de pesca? dos feijões!) na mão e a sacola do lanche a atrapalhar. Ou ir aos frades (sombreiros, agasalhos, que em pequenos se dizem maçarocas), jantados depois sem demasiado receio. Fabricar armadilhas para coelhos que, por razões insondáveis, nunca funcionavam. Crescer: caçar pardais com uma pressão de ar e, de repente, ser incapaz de caçar pardais com uma pressão de ar. Adormecer ao som do relato do Portugal-Espanha em hóquei - maior acontecimento do dia.
Mais tarde a casa diminui, enruga-se, já não cheira a compotas ao lume. E a gente torna-se mortal, ganha medo aos cogumelos, inventa uma vida ocupada, são duas horas de carro, e vai arrumando a felicidade na memória. Até que alguém, como dizia Molero, nos atira uma frase a lembrar-nos quem somos. Ou põe uma fotografia assim. E a gente fica meio envergonhada, mas agradece.
posted by PC on 4:19 da manhã
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E ESTA, HEIM? Pacheco Pereira ( link para o Abrupto infelizmente só disponível na coluna da direita, as minhas desculpas) informa-nos que no livro do Barnabé, Louçã e Rosas não têm entradas, mas que ele e G. Bush são os mais citados. E pergunta e bem, JPP: "mas que mundo é o deles?"
Respondo eu: o mundo de Dorian Gray.
posted by FNV on 3:06 da manhã
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CLÍTORIS& COZINHA II: O comentador/a anónimo/a do post anterior, indignou-se com a expressão "clítoris desenvolvido" ( fala de uma obsessão). Não vejo porquê. O clítoris tem 8000 fibras nervosas, a haste é atravessada por milhares de vasos sanguíneos: é a maior concentração de fibras nervosas existente no corpo humano, incluindo as pontas dos dedos, os lábios, a língua, e possui o dobro da concentração de fibras nervosas existente no pénis. O clítoris mantem o seu tamanho inalterado mesmo na velhice e não atrofia com a menopausa ( talvez por isso as más cozinheiras continuem más).
A origem da palavra é obscura; segundo Natalie Angier, por exemplo, pode provir do grego kleitoriazein ( excitar) ou ainda do grego para "chave". O que é certo é que o garanhão fica todo inchado se atinge 2 ou 3 orgasmos numa noite, mas uma mulher bem preparada pode fácilmente alcançar 50 orgasmos clitoridianos no mesmo período de tempo.
Volto a repetir: porque há-de uma mulher assim perder tempo na cozinha?
SERÁ? Um dos mais estranhos -que lhe hei-de chamar? - aforismas populares-psico-sexuais é o que nos adverte que "mulher boa na cama não sabe cozinhar". Devo dizer, para início de treta, que são raríssimas as mulheres que sabem cozinhar. Se compulsarem os rankings dos melhores chefs mundiais não encontram uma mulher. Se se deslocarem aos melhores restaurantes portugueses só encontram homens á frente do concerto de sabores e metais; tal constatação inibirá ao menos a ideia que o sexo masculino não pode reunir as duas capacidades.
Mas porque raio se compôs a representação, em círculos restritos e descerebrados, que uma mulher que sabe cozinhar não pode ser boa na cama? Passemos por cima dos significados: "boa na cama" siginificará, seja na ( sempre) transitória monogamia, seja na fiesta, predisposição para gozar entre lençóis. Clítoris desenvolvido, pernas agéis e mente submetida ao corpo, portanto. "Boa cozinheira" significará a habilidade para ultrapassar a obrigação de fazer comida para ser comida: ou seja, a habilidade em se divertir com os alimentos.
Estará aqui a resposta? A culinária exigirá uma resposta claramente masturbatória no homem: não interessa quem ( se) vai comer, o gozo reside no desperdício, no derrame indigente da fantasia, na criatividade desenfreada.
Imaginar uma mulher assim. Capaz de cozinhar como se masturba: estar-se nas tintas se o maridinho ou os filhinhos ou os irmãozinhos gostam ou não, se ficam ou não satisfeitos.
Uma mulher assim, porque haveria de perder tempo na cozinha?
Ao anónimo comentador: pesquisa ou investiga o que quiseres, em japonês ou em islandês; mas se pesquisares ou investigares em português, pesquisa em clítoris e não em clitóris.
posted by PC on 5:42 da manhã
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ÓBVIAMENTE: Escrevi aqui, faz pouco tempo, que as estruturas nacionais de "combate à droga" têm sido ao longo dos anos sistematicamente incompetentes e paroquiais ( SPTT, Projecto Vida, IDT). A imprensa deu conta nos últimos dias de um dos múltiplos e rotundos falhanços da "Estratégia Nacional de Luta Contra a Droga 1999-2004": neste período houve um aumento anual de 10% do consumo de drogas em jovens adolescentes.
Ou seja, a"prevenção primária", do uso de droga em meio escolar, a grande bandeira, resultou nisto. Agora imaginem os resultados obtidos em projectos que não foram apresentados como essenciais...
OS FRETES: Fazem-se no jornalismo desportivo como no outro. José Eduardo Simões venceu as eleições da Académica com mais de 56% dos votos. O jornal A Bola traz hoje uma página inteira dedicada ao assunto e com um único intento: demonstrar que este resultado "fracturou", "dividiu" a academia. Apoiado! Digo mais: um líder com 56% dos votos "estralhaça", "rompe", "rasga" o que quer que seja.
Sócrates que se cuide: se conseguir 45% dos votos em Fevereiro, tem os rapazes (pelos vistos saudosos do unanimismo da União Nacional) da "bíblia do desporto" à perna.
posted by FNV on 9:27 da tarde
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COLIGAÇÕES, NOVELAS E ESTRATÉGIAS III: De forma que estas críticas à decisão dos partidos do governo são infundadas (outras poderão existir, mas estas não têm razão de ser). Para se convencer disto mesmo, o leitor ainda céptico pode atentar no seguinte: uma vez que falamos de estratégias, coligações, eleições e poder, podemo-nos perguntar porque razão o PS não faz uma coligação pré ou pós-eleitoral com a CDU ou com o BE.
Na verdade, mesmo que seja por falta de dentes, já não se acredita que a CDU coma criancinhas ao pequeno-almoço pelo que não será esse o motivo que leva o PS a nem querer ouvir falar no assunto. Por outro lado, relativamente ao BE nem se põe a questão de eles comerem criancinhas ao pequeno-almoço (até porque umas das suas mais ferozes bandeiras é a defesa da possibilidade das criancinhas não verem sequer a luz do dia...).
Então porque é que o PS não faz uma coligação pré-eleitoral? Ou porque é que o PS é dúbio e reticente quando indagado da possibilidade de fazer acordos pós-eleitorais com esses partidos? Porque foge à pergunta e à resposta? Porque esconde dos portugueses as suas posições relativamente a esses partidos? Será simplesmente nojo? A arrogância natural do novo Secretário-Geral?
O PS não admite publicamente a possibilidade de fazer acordos com a CDU ou com o BE por pura estratégia política de alcançar o poder. É a suaestratégia de tentar alcançar o poder. O PS sabe bem (nem deve precisar de sondagens para o saber) que o país, por muito adormecido que esteja, não lhe dá votos se se lembrar que o PS pode fazer entrar pela janela o BE ou a CDU no governo (mesmo que seja apenas através do jogo de influências parlamentar). Muitos dos que hoje lhe dão palmadinhas nas costas serão os primeiros a retirar-lhe o tapete. Daí que fuja às perguntas, evite as respostas, esconda do eleitorado português as suas verdadeiras intenções de alianças com a CDU ou o BE face aos resultados das eleições. Estes últimos, por seu turno, também têm as suas estratégias de poder (certamente alicerçadas em sondagens). Basta ver como se têm apressado a dizer que não querem ir para o governo com o PS (está-se mesmo a ver...) para não afugentarem do amigo PS o eleitorado que não quer sequer sonhar com a possibilidade destes partidos estarem à frente de qualquer que seja a pasta governamental.
Ou seja, todos têm e cada um tem a sua estratégia de alcançar o poder, percebendo-se mal que as críticas recaiam unicamente sobre a dos partidos do governo, a única que foi abertamente explicada ao eleitorado.
Com efeito, a reserva mental dos partidos da actual oposição é o que distingue as estratégias em confronto nas próximas eleições: do lado dos partidos do governo, o eleitorado sabe o que irá acontecer face aos resultados das eleições. Do lado da oposição é a verdadeira incógnita, sendo no entanto muito provável que o PS se abrace à extrema-esquerda. De um lado temos a clareza e a transparência, do outro temos a obscuridade e o silêncio. Ora as coisas na política deviam querer-se claras, como se anda por aí a apregoar...
posted by VLX on 3:08 da manhã
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COLIGAÇÕES, NOVELAS E ESTRATÉGIAS II: As críticas à estratégia dos partidos do governo vagueiam ao sabor do vento, mas de forma muito bizarra. Ao que parece, a decisão dos partidos do governo de concorrerem coligados era uma estratégia de poder, criticava-se. Segundo se diz agora, a decisão de concorrerem separados é uma estratégia de poder. A necessidade de irem coligados era uma exigência das sondagens, apontavam. A decisão de concorrerem separados é ditada pelas sondagens, censura-se agora. Estas críticas de alguma comunicação social e da oposição devem partir do princípio de que quem as ouve é burro. Na verdade, podem-se fazer inúmeras críticas à estratégia dos partidos do governo mas estas que se têm destacado parecem provir de burros a pensar que falam para iguais.
A luta política pretende efectivamente a conquista do poder e, para isso, existem várias estratégias. Muitas dessas estratégias são definidas em função dos resultados de sondagens. Isto não tem nada de mais, não tem nada de mal e é uma realidade extensível a todos os partidos.
Dizia-se que a estratégia de Guterres para alcançar o poder foi definida em sótãos e que teve certamente por base sondagens de opinião (como, de resto, toda a sua governação até que a última sondagem lhe revelou o pântano a que tinha conduzido o país, momento em que ele, estrategicamente e tendo em vista um poder futuro, se resolveu pirar). A Sampaio não são estranhos os sótãos e as singulares estratégias de alcançar o poder (a súbita decisão de se atirar à CM de Lisboa é bom exemplo). Que Sampaio ainda hoje liga a sondagens mostra-nos a mui recente História do país.
(cont.)
posted by VLX on 3:05 da manhã
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COLIGAÇÕES, NOVELAS E ESTRATÉGIAS: Certos comentadores e muita comunicação social, sempre com a oposição a reboque, passaram a semana a criticar o resultado daquilo a que chamaram "a novela da coligação".
Convém frisar que a dita novela foi criada pela própria comunicação social: as direcções dos partidos do governo ainda não se tinham pronunciado oficialmente sobre a questão e já a comunicação social nos dizia sobre o assunto uma coisa num dia e outra no outro, ambas absolutas verdades, sem o mínimo pudor ou vergonha. Os exemplos da SIC no sábado passado e do Expresso destas duas últimas semanas são elucidativos: dizia-se uma coisa num momento e, logo a seguir, dava-se notícia completamente oposta sem sequer se fazer um acto de contrição pela anterior. Ninguém veio dizer «enganámo-nos». É triste, mas é a comunicação social que temos. Não precisamos é de acreditar em tudo o que nos querem fazer crer.
A falta de vergonha de certa comunicação social não é muito diferente da de certos partidos. Ainda há oito dias tínhamos visto e ouvido Francisco Louça a berrar, no meio daquela imensidade de banha da cobra habitual, que toda a gente sabia que os partidos do governo iriam concorrer às eleições em coligação, que só podiam ir em coligação, estavam obrigados a ir em coligação. Dias depois, vimos e ouvimos Fernando Rosas a defender, no meio daquela imensidade de banha da cobra habitual, que se estava a ver que os partidos não iriam concorrer coligados, era naturalíssimo que concorressem separados, havia imensas razões para isso, etc., etc.. Na CDU e no PS as coisas não foram muito diferentes. Valha a verdade, os certos comentadores remeteram-se ao silêncio (desconheço se por não saberem o que apontar agora se por se terem começado a consciencializar da triste possibilidade de poderem voltar a ter em S. Bento os clássicos Cravinhos, Coelhos, Gamas, Veras, Ferros ou mesmo Seguros e Pedrosos, para não falar de Sócrates).
(cont.)
posted by VLX on 3:02 da manhã
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ANJO BRANCO, ANJO NEGRO: O Natal já chegou cá a casa e trouxe com ele dois anjos, um branco e outro negro.
O primeiro chama-se Sufjan Stevens e o disco é Seven Swans. Uma experiência mística do princípio ao fim, na primeira pessoa, com destaque para Abraham, Sister(I have a fish stone burning my elbow / reminding me to know that I'm glad / that I have a bottle filled with my old teeth) e, sobretudo, The Transfiguration (And keep your word, disguise the vision till the time has come. / Lost in the cloud, a voice. Have no fear! We draw near! / Lost in the cloud, a sign. Son of man! Son of God!).
O segundo chama-se elliott smith e o disco é from a basement on the hill(as minúsculas aqui são importantes). A narração de outra intimidade, Deus presente só em negativo por entre overdoses e relações perturbadas, com destaque para don't go down, king's crossing (It's Christmas time / and the needles on the tree / a skinny Santa is bringing something to me / His voice is overwhelming / but his speech is slurred / and I only understand every other word), a distorted reality is now a necessity to be free, e, sobretudo, a fond farewell (I see you're leaving me and taking up with the enemy / the cold comfort of the in between / a little less than a human being / a little less than a happy high /a little less than a suicide / the only things that you really tried).
O brilho da fé e a penumbra da enfermaria onde esperam os agonizantes. A voz de Deus que anuncia a morte da profecia da morte e a voz empastelada do dealer. A esperança inquebrantável e a certeza de que o in between não existe.
Ninguém sabe se Sufjan cumprirá o grandioso projecto, começado com Michigan, de produzir um disco para cada Estado americano. Mas elliott não gravará mais. Foi encontrado morto no seu apartamento, aos 34 anos, com uma única ferida de faca no corpo, exactamente um ano antes do lançamento de from a basement on the hill. Parece que se suicidou. Ele tinha escrito, em king's crossing, "I can't prepare for death any more than I already have". Não muito diferente da promessa de Sufjan, na primeira faixa do álbum: "And I am joining all my thoughts to you. / And I'm preparing every part for you". Duas metades.
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