É MESMO TÃO ENGRAÇADO? II: Complementando um pedacito o post anterior do PC e a citação do Livro dos Provérbios utilizada pelo Nuno Guerreiro na sua Rua da Judiaria ( link directo indisponível, as minhas desculpas) , socorro-me de uma sabedoria ainda mais antiga, do tempo em que existiam muitos deuses mas já só vivia um único homem.
Ulisses passa a fio de espada Demoptólemo, Liodes, Agelau e muitos mais. Manda chamar a ama Euricleia que ao entrar na sala solta gritos de alegria ao ver os corpos dos inimigos tombados e ensaguentados. Ulisses ( Odisseia, XXII 388-427) diz-lhe então:
Alegra-te, velha, no teu coração; reprime, porém, os gritos, porque é uma impiedade soltar vozes de triunfo por causa dos homens que pereceram. O destino dos deuses e as suas obras malvadas foram quem lhes deu a morte, pois não respeitavam a nenhum homem na terra.
posted by FNV on 10:44 da manhã
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É MESMO TÃO ENGRAÇADO?: Apesar de tudo, é surpreendente a vaga de brindes e, até, de piadas, que a morte de Arafat suscitou numa parte da blogosfera portuguesa. Excepção feita, naturalmente, aos mais lúcidos, porventura até os únicos a quem a questão israelo-palestiniana tem interessado de verdade, que sabem manter a firmeza das suas opiniões sobre o assunto (das quais, aliás, discordo) sem perder o respeito mínimo pelo adversário (ou, talvez, inimigo).
Não consigo compreender o que leva alguém a celebrar ou a tentar fazer humor com a morte de um homem que nunca lhes matou ninguém, nem mandou incendiar-lhes as casas. Suponho que a morte de Bin Laden lhes arrancará foguetes das mãos - e não por se sentirem mais seguros, pois continuarão cativos da litania anti-terrorista.
Eu sei que não está escrito assim na Bíblia, mas quem age dessa maneira diminui-se. Muito mais do que ao objecto do seu ódio.
PS: Na morte de Sousa Franco, O Acidental apagou certos textos que entendeu não deverem persistir para além desse momento. Na morte de Arafat, O Acidental publica vários textos e desenhos escarninhos sobre o próprio assunto da agonia e morte de Arafat. A isto chama-se o relativismo da proximidade. E, sim, estou a comparar Sousa Franco com Arafat, naquilo em que são iguais: eram homens e morreram.
O SENHOR ESTÁ ENTRE NÓS: Atraiçoado pelo meu post anterior em pleno vertigo narcisista, fui à TV ouvir e ver Santana Lopes: "eu vim do meio de vós", "eu falo a verdade", "com a Graça de Deus vou conseguir". Converti-me. Aleluia, obrigado Senhor.
posted by FNV on 9:53 da tarde
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OLHA QUEM FALA: Navegava esta nau no seu número regular de page-views quando de repente amocha. Intrigado, dei uma volta pelo blogues do costume: zero, silêncio absoluto. Porque fala Santana, o tal que é alvo do pagode nacional. Afinal ouvem-no.
Para atrair leitores nesta altura do discurso do Bey de Lisboa, um excerto de um belíssimo romance, embora prenhe de referências psicanalíticas:
(...) Não usei as mãos. Ela não dizia nada. Poderia ter devorado os vinte e dois ossos de cada um dos seus delicados pés. Sugava-os ávida, como se mamasse no peito de uma mãe generosa; enfiava-lhe a ponta da língua por entre os dedos, mordia-os com delicadeza, roçava-os pelos lábios molhados. Quase não podia respirar.(...)"
(Flávia Company, Dá-me prazer, 2001 Difel)
posted by FNV on 9:18 da tarde
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UM CAMINHO LIMPO, OU O CULPADO QUE SE SEGUE?: Sucessivamente promovido pela comunidade internacional, de guerrilheiro a fazedor da paz, de líder terrorista a Prémio Nobel, interlocutor privilegiado de vários governos americanos e israelitas e Presidente da Autoridade Palestiniana, Yasser Arafat morre como instigador do terrorismo palestiniano, no meio de investigações sobre desvios de dinheiro em proveito próprio.
Se estas acusações forem verdadeiras (falo da verdade verdadeira, não da mentira repetida mil vezes em que até bons espíritos acabam por acreditar), não deixará de surpreender a ingenuidade e a incompetência de tantos negociadores internacionais experientes que deram crédito a Arafat ao longo dos anos.
De qualquer maneira, morto Arafat e satisfeita a pretensão tantas vezes reclamada pelo actual poder israelita, que via nele o principal obstáculo para o cumprimento integral dos Acordos de Oslo, espera-se que o caminho para a paz esteja agora definitivamente limpo e que o próximo líder palestiniano não seja o culpado que se segue. E Sharon, se desejar mesmo a paz, que se cuide. Foi um desejo que Rabin pagou muito caro.
posted by PC on 8:14 da tarde
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CABAZADA VIRTUAL: Na Visão desta semana, lendo o que Chomsky ( vive lá) e Boaventura S. Santos ( viveu lá) escrevem sobre as eleições americanas, o que não se percebe é como é que Bush não ganhou com maior vantagem: se aquilo é/representa a "esquerda americana", vou aqui e já venho. E depois a culpa é dos evangelistas rurais.
posted by FNV on 7:18 da tarde
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PREGA AGORA: Berlusconi está formalmente acusado de vilanias várias entre as quais evasão fiscal e corrupção de juízes, e arrisca oito anos de prisão ( a Itália é uma democracia e um estado de direito, não é Cuba). Se Berlusconi vier a ser considerado culpado dos crimes que é acusado, é caso para perguntar: o que andou o probo e virtuoso Buttiglione a fazer estes anos todos no governo? Caso tivesse estendido as suas preocupações morais à política e aos interesses económicos em vez de se preocupar com as mães solteiras e com os gays, talvez tivesse evitado ao seu amigo Silvio um sarilho monumental. A menos claro, que os magistrados que acusam agora Berlusconi façam parte de mais uma conspiração politicamente correcta e moralmente relativista.
posted by FNV on 7:02 da tarde
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PORTUGAL INFECTADO: O Movimento Portugal Positivo que há meses nasceu no Porto ( lembram-se?) só podia dar nisto, na revista "País Positivo", cujo segundo número foi distribuido na passada segunda-feira com o Público. Este número é igual ao primeiro: um valhacouto de vaidades de autarcas que simulam responder a perguntas feitas por não se sabe ( não assinam) que estrompados. O senhor da capa, Horácio Pina Prata, engenheiro e autarca do PSD e entre outras coisas ligado a uma empresa de tremoços ( muitos bons, por sinal) fala de tudo menos da embrulhada dos apartamentos construidos ao lado do estádio municipal de Coimbra, assunto que já está na justiça. Gaia repete o destaque do primeiro número: desta vez parece que são muito bons a alojar pessoas. É tudo muito "positivo", com muitas fotografias dos "positivos", a fazer lembrar um folheto promocional de uma empresa de construção civil.
posted by FNV on 5:56 da tarde
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CONGRESSO DA DEMOCRACIA II: Guterres afirmou, igualmente, que "o fundamentalismo religioso penetrou o centro do poder da maior potência mundial, pondo em causa os valores do século das luzes no seu prório comportamento." G. terá esquecido que a tal "maior potência mundial" é uma democracia, que não anda a matar civis em nome da religião, a qual não se confunde com o estado e que não se encontra num estádio semelhante a qualquer tenebroso século medieval - por oposição a séculos iluminados - de fanatismos, de miséria, de servos da gleba, de déspotas, de ausência de direitos das minorias (e, por vezes, também das maiorias) e mesmo das mulheres.
Esta demagógica e desonesta inversão de papéis estará relacionada com algum cargo na ONU?
posted by Neptuno on 1:10 da tarde
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CONGRESSO DA DEMOCRACIA I: Guterres regressou aos "palcos" políticos nacionais, produzindo algumas considerações que merecem comentário:
G. alertou para a progressiva promiscuidade entre responsáveis políticos e os media bem como para a tentação dos primeiros em manipular os segundos, os quais acabarão por destruí-los. G. refere-se, obviamente, à manipulação "tipo Marcelo", i.e., via pressão directa sobre os proprietários dos media que, por sua vez, "torcem o braço" aos comentadores incómodos.
Penso que esta manipulação ilegítima tem origem numa outra manipulação, que será aparente e "politicamente legítima" da qual G. foi precursor em Portugal e que consiste em viver e agir para os media. Em que os "responsáveis" políticos se preocupam mais com a agenda mediática e respectivo retorno eleitoral em prejuízo da efectiva governação.
Esta promiscuidade é que está na génese da tentação da manipulação dos media. Se o móbil do modus operandi dos responsáveis políticos em geral não fosse o impacto mediático mas sim servir o país - nostálgica memória - talvez a componente mediática não fosse tão endeusada como é hoje. Mas, a partir do momento em que é usada com êxito (eleitoral) por uns, dificilmente será prescindível pelos outros.
POLITESSE: Também não sou (como se escreve no O Acidental)* amigo nem quero ser amigo do Daniel Oliveira do Barnabé. Já tenho amigos que cheguem e pouco tempo para eles. Mas num texto de Vasco Rato, no referido "O Acidental", este dirige-se ao "licenciado Daniel Oliveira". O texto surge na sequência de uma discussão ( sobre a morte de Theo Van Gogh) na qual participei, e por isso a menciono aqui. Não consigo compreender a referência à graduação académica de um blogger no meio de um debate absolutamente comum. Ainda por cima quando julgava ( e julgo) Vasco Rato um gentleman. Manias minhas, manias de um conservador das boas maneiras.
* Links directos indisponíveis: as minhas desculpas.
posted by FNV on 9:47 da tarde
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TELEMÓVEIS: O artigo de hoje de Pacheco Pereira no Público fez-me sorrir. Um sorriso amarelo. Não tenho telemóvel e lembro-me sempre de um adágio de Umberto Eco nos primórdios da coisa: "se não fores jornalista, médico ou advogado, ou se não mantiveres uma relação extra-conjugal, não precisas dele". A coisa ultrapassou o adágio de Eco, e hoje toda a gente tem.
Não tenho telemóvel por vários motivos, uns confessáveis, outros não. O estar permanentemente contactável assusta-me: não sou figura pública, nada tenho para dizer a toda a hora ( já me basta o blogue). O toque de um telefone inaugura uma zona de incerteza sombria: quem morreu, a quem fiz eu uma patifaria? Ou então, que me querem, que posso eu fazer? O resguardo da privacidade, o podermos estar sossegados resolve-se fácilmente : desliga-se a coisa; mas uma coisa desligada, incapaz de fazer o serviço para o qual foi pensada, arrasta a culpa. As máquinas foram feitas para funcionar.
Assim, que perdi eu até hoje por não ter telemóvel? Não sei. O velho artifício lógico da malta do Stoa Poikile embala-me os ouvidos: Tudo o que não perdeste ainda tens/ Não perdeste um par de cornos, pois não?/ Então ainda tens um par de cornos..
Quando os achar, telefono.
"À idéa da Pátria e lei de Deus,
Tudo calcou e recalcou aos pés,
Vergando orgulho a mouros e ateus,
Vencidos duramente , de lés a lés"
"Pórtico", Menção Honrosa, editado no Jogos Florais 1939, Produções Poéticas Classificadas, Emissora Nacional, s/data.
posted by FNV on 7:50 da tarde
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11/11/11: Às onze horas do dia onze do décimo primeiro mês do ano de 1918, entrou em vigor o armísticio assinado pelos alemães e pelos vencedores daquela que se convencionou chamar a I Grande Guerra Mundial. Mas como nenhum soldado estrangeiro pisou solo alemão, as sementes estavam lançadas.
posted by FNV on 7:35 da tarde
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DESCUBRA AS DIFERENÇAS: O Daniel Oliveira no Barnabé ( link directo indisponível) distorce propositadamente as coisas no caso do assassínio de Theo Van Gogh. Diz o Daniel que a "intelectualidade da direita portuguesa" ( sei que ele não me inclui em nenhum dos adjectivos) persiste "em ver em cada fánatico muçulmano um representante do Islão", assim gerando as "sementes do ódio". Por mim falo: persisto em ver em cada fanático muçulmano um representante sim, mas do Islão integrista, fanático e intolerante, do Islão que Soroush , Shabestari ou Kadivar repudiam.
O Daniel compreende perfeitamente a diferença. Porque raio nos pretende fazer crer o contrário?
posted by FNV on 2:22 da manhã
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ESTES ROMANOS SÃO LOUCOS: Faz hoje 208 anos, a 11 de Novembro de 1786, Goethe demorava-se em Roma na sua Viagem a Itália e visitava o que julgava ser o Hipódromo de Caracala. Admirava a alvenaria sólida batida por aqueles homens que trabalhavam para a eternidade e que tudo previram menos a loucura dos vândalos. Não sei se Goethe estava afinal no Circo de Maxêncio ou se de facto passava por uma obra de Caracala, as termas luxuosas no qual o fratricida gastou o que tinha e o que não tinha. O que o Caracala promotor da Constitutio Antoniniana não teve foi o elogio de Gibbon, pouco apreciador do cosmopolitismo do romano. Caracala lançou as bases de uma efectiva união do mundo, de um mundo no qual todos são cidadãos sem nacionalidade específica, quer adorem Ísis ou Cibeles, quer sejam núbios ou cântabros. Também é verdade que há quem diga que tudo não passou de um truque para tornar todos os homens cidadãos romanos. Seja como for, tal como a alvenaria admirada por Goethe, o projecto de Caracala durou menos do que a eternidade.
NÚMEROS Nas vésperas de mais uma manifestação de estudantes de Coimbra, anunciada para 17 do corrente (vejam lá se chove...), talvez os especialistas da blogosfera na causa me possam esclarecer: na Universidade de Coimbra, quanto estudantes pagam a propina máxima?
Era só para saber. É que ando estúpido, como se pode constatar no post anterior.
posted by FNV on 1:51 da tarde
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O ESPÍRITO DO CONTRADITÓRIO: Tem sido encarado de forma séria e abnegada por este governo, no capítulo das alterações ao IRS: Bagão diz, Santana desdiz, Santana talvez sim, Bagão talvez não, Bagão só amanhã, Santana é já hoje.
Devo ser eu que sou estúpido, recorri ao Musil para me explicar mas só lá encontrei uma referência do austríaco à estupidez honesta: não tenho compreensão fácil. Pois que seja.
NÃO, NÃO CAIU: Peça da SIC-Notícias sobre o aniversário da queda do Muro: "desemprego e baixos salários são agora os novos pesadelos dos habitantes da antiga Alemanha de Leste". A jornalista (?), reparem, opera dois milagres de propaganda vingativa dos orfãos do Muro, na mesma frase:
1) Estes pesadelos - desemprego e baixos salários - são "novos". Ou seja, o sub-emprego fictício criado pela Alemanha comunista e a miséria associada à "transição para o socialismo" não existiram. Por isso "estes pesadelos" são novos.
2) Simula uma equivalência também no tormento. Se pensarmos que antes havia assassínio, tortura em massa, falta de liberdades e direitos civis, no problema: eram "uns" pesadelos, estes são "outros", os "muros" continuam lá e blá blá blá.
Ou seja, para esta mestre da novilíngua, tudo ficou na mesma, lá para as bandas onde antes existiu um muro. Um arrepio na espinha é o que se sente, quando fala esta gente.
posted by FNV on 10:44 da tarde
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RTP-MEMÓRIA: Como previsto, é uma desilusão. É um canal de memória ajustado ao que é a História da estação: desleixo, incúria, ausência de critério. Shows de cabaret/revista, festivais da canção, filmes. Ainda assim, tenta-se nos pequenos pedaços possíveis entrever o possível.
A senhora que ainda hoje faz a língua gestual é a mesma de há 24 anos, o que é obra. As fardas dos polícias também. Pinto da Costa aparece em telejornais desde os anos oitenta, o que confirma o carácter etéreo e eterno do personagem. Mas triste e elucidativo é a forma como é tratado o funeral de Sá Carneiro. Dir-se-ia em tom paranóide que há aqui mão marota empenhada em destruir um mito rival. Em vez de nos darem as imagens e os cheiros da época e deixarem aos espectadores a possibilidade de fazerem o seu juízo, espetam-nos com um programa feito em inícios de 90 (?). Nesse programa, Leitão Ramos, Diana Adringa e Miguel Sousa Tavares declaram que o funeral foi uma encenação de propaganda. Leitão ramos diz que os "carros fúnebres andavam muito devagarinho" e que aquilo "durou o dia todo". Não conheço nenhum funeral de uma figura carismática ( nem qualquer outro, mas isso é corda para outros nós), para mais numa ocasião como aquela, que não seja encenado. Não passou pela cabeça daquelas luminárias que milhões de portugueses estavam de facto consternados e que naquela altura não queriam saber de Soares Carneiro para nada. Como não quiseram saber uns meros dias (!!!!) depois ( NOTA: foram os leitores que me corrigiram, eu tinha escrito "meses depois"), reelegendo Ramalho Eanes. A isto o tal Leitão Ramos responde dizendo que "as pessoas não se deixam manipular se souberem que estão a ser manipuladas". Pobre tolo, que além de tudo saber explicar ( a coisa e a não-coisa) não concede ao povo em nome do qual julga falar, um pedaço de dor.
posted by FNV on 8:48 da tarde
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DESINTERESSE: Ontem como hoje, os contadini não se interessam pela guerra. Por nenhuma guerra. Carlo Levi no seu "Cristo si è fermato a Eboli" descreve a resignação desgraçada do popolo italiano, o dos campos, pela campanha fascista da Abíssinia promovida por Mussolini: "Pazienza! Morire sopra un'amba abissina non è poi molto peggio che morire di malaria nel proprio campo, sulla la riva del Sauro. É a velha história: para valer a pena ir morrer lá, é preciso ter algo cá pelo qual valha a pena lutar. Caso contrário, é indiferente.
posted by FNV on 7:19 da tarde
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BAIXOU O SANTO NELE?!: Nem sou muito dado ao comércio com o além, mas hoje, quando vi as substituições de Peseiro, pareceu-me vislumbrar sobre o banco do Sporting, pairando em forma de ectoplasma, a figura do Prof. Carlos Queiroz.
CURIOSIDADE: Por eventuais comentários contra a presença do imperialismo francês na Costa do Marfim...
posted by Neptuno on 1:52 da tarde
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UM SÓ DIA: Ájax está louco e cego pelo cíume; degola animais, assassina os guardiões do saque confundindo-os com os chefes gregos que lhe negam a herança de Aquiles, preferindo entregá-la a Ulisses. Menelau condena-o a ficar insepulto, pois que Ájax, desolado, caiu sobre a sua própria espada.
O desvario de Ájax, o tempo que corre sobre o carácter, tudo isso e mais alguma coisa nos aquece a alma na peça de Sófocles. Mas a profecia de Atena, a malvada inspiradora das duas faces de Ájax, merece ser recordada. Atena explica a Ulisses o perigo de excedermos as nossas possibilidades, de desafiarmos os Deuses; Ulisses concorda dizendo que nada mais somos, nós, os vivos, do que imagens e sombras sem consistência. E Atena conclui, antes da entrada em cena do coro de Salamina:
Um só dia faz baixar ou erguer de novo tudo o que é humano. E a quem é sensato, os deuses amam-no; mas, aos malvados, detestam-nos.
Todos nós somos um bocado Ájax, todos nós pretendemos por vezes desconhecer os nossos limites, nem que seja por um só dia. É o suficiente.
ARANHA GRILO: Não, não é escritor nem pintor, cineasta ou músico. Este homem pesca solhas e linguados com os pés. Sim, com os pés, leram correctamente. É caldeireiro naval e vive na Fontela, Vila Verde, ao pé da Figueira da Foz, conta o Diário As Beiras na sua edição de ontem.
Tenho a impressão que aquela zona é muito dada a albergar gente que faz as coisas com os pés. No caso do extraordinário Aranha Grilo, ainda bem.
posted by FNV on 1:02 da tarde
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A LER: Os dois últimos e sábios parágrafos de Helena Matos, ontem, no Público. O cineasta assassinado ( Theo Van Gogh) é que é o "controverso", o assassino um tipo que por acaso é muçulmano. Ponto final.
Isto sim é que sai directamente da agenda politicamente correcta, da pior delas: da que não defende a liberdade e a tolerância, da que as ataca cobardemente. E nós, calados, como a nêspera comida pela velha, no poema do Mário Henrique Leiria: a ver o que acontece.
Mar de opinioes, ideias e comentarios. Para marinheiros e estivadores, sereias e outras musas, tubaroes e demais peixe graudo, carapaus de corrida e todos os errantes navegantes.