"Quando Prexaspes confirmou a sua disponibilidade, os magos convocaram os Persas, fizeram-no subir a uma torre e ordenaram-lhe que falasse. Mas ele, de caso pensado, fez-se esquecido daquilo que lhe tinham pedido e, começando por Aquémenes, traçou a genealogia de Ciro: quando chegou a este, para acabar, falou das boas coisas que Ciro tinha feito pelos Persas. Depois de relatar todos estes factos, revelou a verdade, dizendo que antes a escondera por não ser seguro contar o sucedido, mas que, na presente situação, uma necessidade imperiosa o impelia a contar tudo. Explicou então como ele próprio, forçado por Cambises, matara Esmérdis, filho de Ciro, e denunciou que eram os magos que reinavam. Depois de muito amaldiçoar os Persas, se estes não retomassem o poder e não castigassem os magos, lançou-se de cabeça da torre abaixo. E foi assim que morreu Prexaspes, que durante toda a sua vida fora um homem bem conceituado"
(Heródoto, Histórias, Livro III, 75.1-3)
posted by FNV on 8:11 da tarde
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MANIPULAÇÃO:"Ó pá, um gajo anda aqui e dizem-lhe assim, vai lá para baixo e dizem-lhe assado. Como é? Ah! É que vocês também só fazem de conta e o camandro! Assim não dá! T´ão a gozar com a gente! Um gajo bem tenta, mas uns fazem coisa e tal e outros nem por isso, como é?" Penso que este texto é uma boa ilustração do discurso de ontem do PR, em que insinuou uma série de generalidades - tipo "o estado a que isto chegou" e "a situação estava a tornar-se insustentável" - para dissolver o parlamento. Os chamados "media de referência" (?!?) fizeram o resto do trabalho. E assim se passa como boa para a opinião pública (= eleitores) uma decisão gravíssima e que, quanto a mim, é a facada final na credibilidade do nosso sistema político.
Penso que o PR decidiu como decidiu para fazer as pazes com a sua família política, que tanto o insultou em Julho. E, para poder terminar o seu mandato nas boas graças dos camaradas, precisava de fazer este geitinho.
Desde o início deste blog que defendo a reforma urgente do nosso sistema político. Mas, enquanto ele existir tal como é hoje, assim deve ser respeitado. Em Julho - sem prejuízo de não acreditar em Santana Lopes como PM - aplaudi a decisão de Sampaio precisamente porque respeitou o sistema e o conceito que sempre transmitiu do exercício do cargo de PR. A decisão que agora tomou, de dissolver o Parlamento como forma de "demitir" o governo traduz um uso reprovável do sistema. Nada se passou de objectivo que justifique a dissolução do Parlamento. Quanto aos argumentos usados para, indirectamente, "dissolver" o Governo, basta lembrar que, durante os governos Guterrres, ministros foram demitidos enquanto discursavam no Parlamento, Ministros juntaram-se a manifs contra e à porta do respectivo ministério, criaram-se fundações para obviar à assumida ineficiência do respectivo ministério, cumpriram-se cinco das cento e tal promessa eleitorais, o país ficou de tanga, um orçamento foi aprovado com um negócio de queijo, etc, etc.
Como explicação para este acto, só sobra mesmo a militância política.
posted by Neptuno on 4:46 da tarde
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POLÍTICA E FUTEBOL: Ao contrário do que tinha previsto, o nosso PR demorou 11 dias a dignar-se, finalmente, esclarecer os portugueses de que as suas (do PR) razões para dissolver o parlamento eram nenhumas (como já se antevia, aliás).
Reconhece-se que a missão do PR era, provavelmente, superior às suas capacidades mas exigia-se como sendo o mínimo que se pede a um PR que dissolve um parlamento maioritário: explicar às pessoas e convencê-las dos motivos pelos quais se dissolve um parlamento legitima e democraticamente eleito pelos portugueses e que maioritariamente apoia o governo em funções.
Uns dirão que isso foi feito mas não corresponde à verdade. O PR não tinha de convencer, com as suas razões, aqueles que obviamente queriam a queda do governo (designadamente, os seus amigos do PS, os antigos aliados da CDU e os clássicos opositores do BE) nem tinha de convencer os que defendiam a manutenção do governo: o PR tinha de convencer aqueles portugueses que estavam indecisos relativamente à questão de que a sua decisão tinha sido boa ou, pelo menos, bem ponderada e justificada - só que não fez isso.
O PR limitou-se a endereçar aos portugueses um conjunto de banalidades que Belém já tinha soprado aos seus preferidos comentadores políticos mas que não sustentam a dissolução de um parlamento nem convencem um indeciso da bondade da decisão. Pelo contrário: fica-se com a ideia de que o voto para a Assembleia da República pouco vale porque, a partir de agora, qualquer PR pode dissolver um Parlamento maioritário porque lhe apetece.
Tivesse-se lembrado disso Mário Soares e Cavaco teria caído com o buzinão da ponte. Dizia nessa altura E. Rangel, opinando sobre a comunicação social, que uma televisão podia colocar uma pessoa em Belém. A coisa é hoje muito pior: certa comunicação social pode desfazer a maioria democrática e legítima de um parlamento, se contar com o apoio de Belém. Isto é grave.
Mas o problema essencial é que se fica com a impressão de que um PR pode dissolver um parlamento que apoia maioritariamente um governo apenas porque o próprio PR não vai à bola com o PM. De tudo o que se tem falado sobre o que serão as perigosas ligações entre a política e o futebol, esta realidade parece-me a mais perigosa para todos os portugueses e para a democracia.
posted by VLX on 3:47 da manhã
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PRO DOMO SUA: O nosso bom masson, depois da longa semana de ausência de que nos fez padecer, regressa em boa forma com mais uma verrina assestada ao FCP em geral e a Pinto da Costa em particular.
Não conhecêramos nós as suas pública e repetidamente anunciadas preferências clubísticas, aliás nefandas, e ficaríamos enlevados com zelo tão catónico pela justiça e respectivas instituições, ou mesmo surpreendidos com o súbito apreço pelo aparelho punitivo do Estado, tão duramente zurzido noutros posts sobre outros processos. Hélas! não é o caso e, neste particularíssimo assunto de fervores clubísticos, em que fervorosamente divergimos, o amigo Almocreve estará sempre na posição semi-desnuda do observador observado.
TEORIA DA CONSPIRAÇÃO: Já se escreveu sobre o facto de Sampaio não ter demitido o governo em Julho, permitindo que o PS se reorganizasse (imagine-se o PS a votos com Ferro na liderança e ainda com o caso pia a pairar), aguardando o momento oportuno para agir, em prol dos camaradas. Ontem, perante as declarações de Morais Sarmento sobre o PR, aparece à noite um "inesperado" personagem ridicularizando nos telejornais as afirmações do ministro. Nem mais nem menos do que Freitas do Amaral. Hoje mesmo, dia anunciado da comunicação do PR ao país - em que fará o favor de de nos informar sobre os acontecimentos da semana passada, em que anunciou a dissolução do parlamento eleito pelos portugueses em virtude de não gostar do governo - em que se adivinha que não terá outros argumentos para apresentar que não sejam de ordem pessoal relativamente ao PM (falta de credibilidade, perfil, etc.), eis que, espantosa coincidência, aparece o Tribunal de Contas a anunciar um "buraco" nas contas da câmara municipal da Figueira, do tempo da gestão de Santana!
De facto, há momentos na vida em que tudo nos corre bem. Parece que o mundo conspira...
posted by Neptuno on 11:25 da manhã
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AINDA SOARES: Para quem não percebeu, convém explicar que, como qualquer democrata que se preze, sinto uma enorme gratidão pelo papel desempenhado pelo Dr. Mário Soares na defesa e na construção da democracia em Portugal, no século passado. No entanto, já no século XXI, penso que Mário Soares encostou de novo à extrema esquerda - por onde andou no início da sua carreira política - colando-se cada vez mais a um passado que, em certa medida, já pouco tem (ou deveria ter) a ver com o tempo em que vivemos.
posted by Neptuno on 11:16 da manhã
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WAY DOWN IN THE HOLE (versão BIG TIME): O Presidente da República iniciou as "consultas" com vista à dissolução do Parlamento cuja dissolução já comunicou ao Primeiro Ministro há mais de uma semana.
Atendendo à forma original como o processo tem sido conduzido, complicando o que era fácil, não é de excluir que as "consultas" decorram assim:
O Presidente da República entra no salão, com um enorme sobretudo preto até aos pés, puído nos cotovelos e curto nas mangas. O chapéu verde foi trocado por um "abas curtas" cinzento e coçado. De pé, microfone na mão e voz enrouquecida a preceito, entoa: "When you walk through the garden, you gotta watch your back / Well, I beg your pardon, walk the straight and narrow track".
Os conselheiros de Estado e os representantes dos Partidos, a princípio maçados e perplexos, começam a agitar-se nas cadeiras ao ritmo daquele som envolvente. Alguns levantam-se e batem palmas cadenciadas. Outros murmuram "this is soul, my man". Outros abanam imperceptivelmente a anca. Ninguém ousa telefonar a Mário Soares. O Presidente continua a evoluir no centro da sala, os braços abertos volteando no ar, sublinhando cada frase cantada com um olhar penetrante. Alguém reduz a iluminação. Vem o refrão: "We'll all be safe from Satan, when the thunder, when the thunder starts to roll / We got to keep the Devil, keep him on down, down in the hole".
Neste momento já a sala está toda de pé, vibrante, presa à magia daquela voz prolongada nos gestos. Há quem, liberto, erga os braços para o céu. A temperatura não pára de subir e o ar torna-se quase irrespirável com a humidade e o fumo. Então o Presidente pára, dramatizando o instante, e lança, gutural: "People: can I get an amen? Can I get a Hallelujah?".
É o paroxismo. Todos conservam as roupas, mas o Presidente é levado em braços do salão.
O DURÁVEL E O EFÉMERO: Leio, divertido, as apreciações sarcásticas que se foram fazendo ao jantar de aniversário de Mário Soares nos blogues da chamada "direita" (incluindo aqui no Mar Salgado, pela pena de Neptuno). Só O Acidental devotou-lhe nada mais, nada menos, do que 12-posts-12(até agora).
É compreensível. A chamada "direita" ainda não gerou uma única personalidade que pudesse convidar com êxito, para acontecimento semelhante, gente provinda de todo o leque político democrático do País, que até, num qualquer momento da sua vida, criticou e se opôs a Soares.
É o unanimismo bacoco, o centrão cinzentão, o (expressão abusadíssima) politicamente correcto! - vociferarão os porta-vozes da originalidade e do radicalismo necessário. Será. Mas não é mau, para Mário Soares, ter esse unanimismo estabelecido à volta do mesmo elo: o seu papel na construção e manutenção do regime democrático (ver a propósito, abaixo, o belo texto do FNV, um homem com memória que percebe o significado de um aniversário). O resto, dura a efemeridade de um post. Ou de um blogue.
posted by PC on 11:52 da tarde
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PAÍS DAS BESTAS: O dragão-mor televisivo, Miguel Sousa Tavares, que cospe fogo regularmente também na imprensa ( "A Bola" e "Público"), já anunciou o caminho: a segunda fase da operação "Apito Dourado" é uma tramóia de águias e leões lisboetas que por acaso puseram a PJ, o Ministério Público e os Tribunais a trabalharem para alimentar os seus nefandos intentos.
É este mesmo dragão-mor que passa a vida a chorar-se nas páginas dos jornais contra a inexistência de investigações à corrupção. Eu não sabia era que essas investigações, para não irritar o cospe-fogo, tinham de ser criteriosamente escolhidas. Está-se sempre a aprender com estes corajosos e polemistas opinadores.
posted by FNV on 11:11 da tarde
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SAILOR & LULA: O Presidente Lula está a dar a cara por uma campanha ( que já recebeu encomiástico apoio da admnistração Bush) contra o turismo de exploração sexual de crianças e adolescentes no Brasil. Porque é que eu tenho a sensação que esta campanha do presidente não é uma iniciativa bem vista pela esquerda festiva europeia que o apoiou?
PS: talvez (mas não só...) porque a iniciativa partiu da indústria hoteleira.
PS 2: A julgar pelo 1º comentário a este post, ao qual não posso responder porque não foi assinado ( preconceitos meus...), acertei no vinte; é pena é não acertar no euro-milhões.
posted by FNV on 10:25 da tarde
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AR DO TEMPO: Uma socióloga da DECO está neste momento a ensinar na TV como se fazem compras de Natal. Coisas que eu nunca tinha pensado, como: "não deixe tudo para a última hora", "não gaste mais do que pode" , etc. A socióloga termina dizendo: "pode-se consumir e ser feliz".
A minha dúvida: fomos nós que ficámos completamente estúpidos ou os sociólogos é que se tornaram subitamente inteligentes?
posted by FNV on 8:52 da tarde
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PRECIPITAÇÕES: O PPM do Acidental, demonstrando um inusitado interesse pelo caso Pinto da Costa, continua a informar-nos, dia a dia, sobre os desenvolvimentos do processo. Fá-lo agora, porém, sem precipitações, que já o levaram a seguir a notícia falsa da TSF, segundo a qual Pinto da Costa estaria a ser "interrogado na Torre das Antas" e Paulo Paraty teria sido "detido". Dois acontecimentos que, como se veio a comprovar, não existiram - e daí eu ter escrito que o Acidental se precipitou. Óbvio. Se Pinto da Costa veio a ser interrogado mais tarde, noutras circunstâncias, é irrelevante para medir a precipitação de reproduzir uma notícia falsa.
Na mesma altura, escrevi que me parecia precipitado o CDS/PP, em declarações públicas e solenes do seu Presidente (falando "aos Portugueses", como ele tanto gosta), prometer a "apresentação de uma equipa completa de Governo", num momento em que a situação política era bastante confusa. O patético pas de deux que o PSD e o CDS/PP têm ensaiado desde então sobre o futuro da coligação, e a notícia de hoje segundo a qual Paulo Portas só anunciará a decisão sobre o assunto depois de amanhã, mostram também que aquelas declarações foram precipitadas. Independentemente do conteúdo da dita decisão.
Não vejo, portanto, a que "exemplo" PPM se refere. O que, aliás, não é importante: os únicos exemplos que dou destinam-se a ilustrar proposições e construções teóricas.
posted by PC on 6:12 da tarde
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QUERELAS ANTIGAS: Nos tempos em que "a justiça funcionava" e havia "valores" e coisa e tal; Quem podia querelar, ou seja, "declarar em juizo competente de algum crime público ou particular" e quem não podia:
"São prohibidos de querelar: 1.º os menores puberes sem auctorização de seus paes, ou curadores; 2.º as mulheres casadas sem auctorização de seus maridos; (...) 4.º as estupradas ou raptadas maiores de 17 annos."
in Elementos do Processo Criminal, Francisco J. Duarte Nazareth, Coimbra, Imprensa da Universidade, 1879, 6ª edição, pp97.
RESPONSABILIDADE E POLÍTICA (IV CONCLUÍNDO): Este episódio da dissolução do Parlamento é mais uma prova da falência do sistema político vigente. No momento em que escrevo, Sampaio justificou a medida da dissolução do Parlamento com o facto de que, caso tivesse demitido o Governo - que era o que realmente queria fazer - Santana poderia ser novamente indigitado pela maioria. Assim, foi necessário subverter o sistema. Como não conseguiu despejar o inquilino do seu apartamento resolveu pegar fogo ao condomínio.
Penso que é urgente a reforma do sistema político vigente, mas preferia que não acontecesse através de um "golpe". A dita reforma até poderá passar pela introdução de um sistema presidencialista, se os portugueses assim o entenderem. E Sampaio poderá então pôr e dispôr dos governos, o que não deveria acontecer à luz do actual sistema.
É igualmente urgente rever o papel da imprensa na nossa sociedade. Não podemos afirmar que vivemos em democracia se o verdadeiro poder não estiver no voto.
posted by Neptuno on 7:02 da tarde
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RESPONSABILIDADE E POLÍTICA (III - OBVIAMENTE DEMITA-SE): Perante tudo isto, que poderá fazer Santana Lopes? Se quiser sobreviver, politicamente falando, penso que terá que jogar em antecipação, demitindo-se antes de Sexta-Feira, obrigando o PR a assumir as responsabilidades da sua decisão. E deverá levar o combate político para a defesa do sistema político vigente, que foi claramente desvirtuado pelo PR.
Seria igualmente oportuno abordar o "poder" discricionário dos media. Mas, infelizmente, Santana fez todo o seu percurso político a cavalo nos media, até ser derrubado por estes, levando coices desde que chegou a PM. Deste modo, falta-lhe credibilidade para esse combate.
posted by Neptuno on 6:55 da tarde
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RESPONSABILIDADE E POLÍTICA (II - OS MEDIA E O PR): Como corolário do panorama de desresponsabilização generalizada, verificamos que o verdadeiro poder, hoje em dia, está no controlo dos media. Um facto apenas será um facto político se for, igualmente, um facto minimamente mediático, i.e., com algum eco nos media. Por outro lado, um facto que em si mesmo não seria um facto político poderá vir a sê-lo, caso tenha um adequado "tratamento" mediático. Em suma, quem controla o "comércio" dos factos políticos - e, indirectamente, as inclinações políticas dos eleitores - são os jornalistas e, em última análise, quem controla os meios. Sem que haja uma legitimidade adequada ao poder que, de facto, detêm.
Não existe qualquer espécie de sufrágio ou responsabilização da actividade jornalística em Portugal, nem sequer a mínima exigível, que seria a aplicação... da lei - uma vez que a justiça não funciona. Também não existe a tradição dos jornalistas ou meios de comunicação se declararem antecipadamente comprometidos com uma qualquer linha de pensamento político, por forma a que os destinatários possam fazer uma avaliação correcta daquilo que lêem.
Deste modo, chegámos a um ponto em que é perfeitamente possível manipular a opinião pública através dos media. E a prova disso, é a recente decisão de dissolução do Parlamento por parte do PR - ainda que a manipulação tenha uma origem involuntária.
Apoiando-se no descontentamento generalizado da população - que já vem de há dez anos e o qual foi substancialmente alimentado pela quase totalidade dos media desde que este Governo entrou em funções - o PR tira o tapete ao Governo sem apresentar um fundamento objectivo e grave que justifique a gravidade da medida. Para além do facto em si, pior ainda - num inacreditável unanimismo - é a forma estranhamente consensual como os media aplaudem a dita medida, a qual não é sequer questionada. O próprio Expresso - suposta referência - é unânime em louvar - de uma ponta à outra! - sem questionar! E como resultado desta "campanha", a população é mediática e convenientemente convencida da bondade de tal actuação, a qual não é sequer questionada naquilo que traduz de subversão do sistema político vigente.
Partilho da opinião - que adivinho como sendo a do PR - que Santana é um mau Primeiro-Ministro e que não tem perfil para o cargo. Mas, não posso acreditar que seja possível fazer cair um Governo com base em conveniências políticas de ocasião, humores do PR e/ou campanhas mediáticas. Se assim for, devemos então assumi-las como novas componentes decisórias do nosso sistema político.
Não sendo esse o caso, não me lembro de ter votado em nenhuma televisão, rádio ou jornal ou mesmo ter encontrado fundamentos na nossa Constituição para a existência de um sistema presidencialista.
posted by Neptuno on 6:23 da tarde
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O ORÁCULO: Menos conhecido do grande público é o oráculo de Apolo a Laio, que transforma o parricídio em legítima defesa: "dizia que a sorte lhe reservava morrer às mãos de um filho que dele e de mim nascesse", são as palavras de Jocasta. Assim Édipo mata antes de ser morto, porque Laio quer matá-lo, também para se defender, como lhe anunciava o oráculo. Tudo isto é em termos realísticos, absurdo, porque a criança ( Édipo) antes de nascer já é parricida.
Conhecem-se as interpretações clássicas sobre as imperfeições dos homens e a eficiência dos Deuses, mas outros aspectos são interessantes no constante renovar do mito. Por exemplo, na mitologia chinesa, o complexo de Édipo assume contornos completamente diferentes: de cada vez que o filho tenta matar o pai e falha, torna-se cada vez mais obediente, de acordo com uma antiga lenda na qual o pai, Shun, é o fundador da nação Chinesa. Em termos literários apenas O sonho do quarto vermelho, popularizado por Lu Hsun envolve uma componente edipiana, entre o pai, Jia Zheng e o filho Bao-yu. Mas na tradição confunciana chinesa, como diz Ming Dong Gu ( The Fragmentation of the Oedipus Complex in Chinese Literature, Proceedings of the 8th International Conference on Literature and Psychoanalisys, London July 1991) o filho obedece sempre.
Por isso a relação de poder é também um aspecto interessante do mito, seja na versão de Homero seja na de Sófocles. Matar porque se vai morrer, desejar antes de ser desejado, são significados que transportam a relação de poder para o plano mental, para o plano do pensamento. Este território é ainda hoje, sobretudo hoje, o mais oracular...
posted by FNV on 3:56 da tarde
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JANTARADA DE ANIVERSÁRIO: Atenção, senhores comensais! O jantar de aniversário (sim, esse) já não vai ter lugar na Pedreira do Sr. Galinha. Será mesmo no Restelo...
posted by Neptuno on 11:15 da manhã
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PARABÉNS, DR. SOARES: Estive até agora a ver na RTP-Memória( rever, muito forçadamente, dada a minha idade, rever) o célebre debate Soares/Cunhal na RTP em 1975. Cunhal ainda tem as sobrancelhas negras, Soares ( hoje à beira dos 80 anos) usa um penteado à Henrique Chaves( sim, esse...). A certa altura, como se o incomodasse as referências de Soares aos sanaeamentos nas Forças Armadas, Cunhal explica: "Se tivéssemos, nós, o PCP e o PS, um relacionamento partido a partido, eu podia sentar-me consigo á mesa, pegar numa lista e dizer-lhe: fulano de tal, reaccionário, beltrano de tal, reaccionário"". A câmara foca Mário Soares de braços cruzados e de sorriso maroto como quem diz: bem podes esperar sentado.
Nesse tempos Cunhal não era o velhinho cheio de patine que é hoje, a luta não se passava num campo de futebol. Soares deu a cara porque sabia o que poderia vir daquelas sobrancelhas, o "Marocas" era na altura considerado o maior obstáculo à "revolução luso-soviética". Nesses tempos, a discussão não era de poltrona entre dois destilados e uma tirada nonchalant. Nesses tempos era a sério. Por muito que não se goste de alguns dos aspectos do (actual) envelhecimento da personagem, seria bom não esquecer o essencial: é o que faz os homens.
Obrigado e parabéns, Dr.Soares.
posted by FNV on 2:43 da manhã
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SE ISTO SERVE PARA ALGUMA COISA: para além de Maria Helena Rocha Pereira, a Universidade de Coimbra, Faculdade de Letras, alberga quer que se queira quer não, um conjunto de pessoas a quem muito devemos no campo da tradução dos clássicos, mas também dos metafísicos e teólogos medievais. Já aqui tenho referido outros nomes, mas é altura de um incontornável: Mário de Santiago Carvalho. Entre muitas outras coisas, alguns exemplos: S.Tomás de Aquino na Contraponto, João Duns Escoto nas Edições 70, Boécio de Dácia na Colibri, e essa monumental "A Novidade do Mundo: Henrique de Gand e a Metafísica da Temporalidade no Século XIII" nas Edições Gulbenkian, que pode ser consultada com uma edição bilingue (fruto do trabalho conjunto de Mário Santiago Carvalho e de Raymond Macken ) de Henrique de Gand e da sua "Sobre a metafísica do Ser no Tempo", nas Edições 70.
Por último, uma chamada de atenção para mais um trabalho, já antigo, de MSC, muito útil ao simples curioso destas coisas: o "Roteiro Temático-Bibliográfico de Filosofia Medieval" publicado pela Colibri em 1997.
posted by FNV on 1:55 da manhã
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SOCIOLOGIA E PSICANÁLISE: Li um artigo de Maria Filomena Mónica no Mil Folhas sobre os versos de Boaventura Sousa Santos; não, sobre as condecorações de Boaventura Sousa Santos; não, sobre o que Eça escreveu sobre Boaventura Sousa Santos; não, sobre a traição de Boaventura Sousa Santos à memória dos mortos da Guerra do Peloponeso; não, sobre as motivações que não levaram Maria Filomena Mónica a escrever sobre Boaventura Sousa Santos; bem, sobre alguma coisa relacionada com Boaventura Sousa Santos.
Sou ninguém para discutir a crítica literária de Maria Filomena Mónica e sou menos ainda para escrutinar os desejos profundos das suas análises. Mas há uma questão interessante. O artigo cita uma passagem de um livro de Boaventura Sousa Santos que diz assim:
"Neste capítulo, concentramo-nos numa questão específica: as relações entre o Estado e a pluralidade de direitos que, reconhecidos ou não oficialmente, regem os conflitos e a ordem social. Apesar de o paradigma normativo do Estado moderno pressupor que em cada Estado só há um direito e que a unidade do Estado pressupõe a unidade do direito, a verdade é que, sociologicamente, circulam na sociedade vários sistemas jurídicos e o sistema estatal nem sempre é, sequer, o mais importante na gestão normativa do quotidiano da grande maioria dos cidadãos".
A articulista ilumina-nos então sobre "o desejo subjacente a este olhar":
"Pode parecer uma afirmação factual. Mas, subjacente a este olhar, está o desejo de legitimação de práticas legais 'alternativas', com raiz numa espécie de colonialismo invertido. Segundo esta corrente, a justiça dos brancos está manchada pelo pecado original do imperialismo; a dos nativos, porque mais genuína, é evidentemente melhor".
O Luis Rainha não vê lá nada disso. Eu também não, mas não sou sociólogo, nem me dedico à psicanálise da ciência. Por isso, é sempre bom presumir a própria ignorância, e não a alheia, sobretudo quando se está arredado do grande Salon da Capital: alguém me pode indicar uma obra, ou mesmo uma página de jornal, de Maria Filomena Mónica, onde a socióloga trate o problema da unicidade / pluralidade dos sistemas normativos (formais ou informais) dentro do Estado? É um tema que me interessa muito - e sempre poderia confrontar a sua visão das coisas (isenta, certamente, de qualquer "desejo") com a de Boaventura Sousa Santos.
Actualização: Ver também, em particular, o post do JPT no Ma-Schamba.
posted by PC on 1:54 da manhã
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AINDA A COISA: Meto a colher na discussão entre o Francisco José Viegas e o Paulo Gorjão, até porque sobre o assunto com ambos troquei ideias no Verão, e agora com o Francisco esses tempos recordei. Não sei fazer análise política, apenas foco um ponto: o que é uma maioria, como pode ser interpretada? Em Julho, entendiamos eu e o Francisco que um velho princípio liberal obrigaria a dar a vontade ao povo. Já sei que sou ignorante da coisa constitucional tanto quanto do interesse nacional ( pelos vistos, empresariale também pelos vistos flutuante), mas assestava a minha mira em dois pontos:
1) Um contrato com o povo vale pelo promitente; ido este, o compromisso vai também.
2) Ido o compromisso, valerá o que se quiser que se valha, desde que o povo se pronuncie.
RESPONSABILIDADE E POLÍTICA (I - JUSTIÇA): É penoso - para mim e para quem lê estes textos - passar a vida a insistir neste tema mas... é um triste sinal dos tempos.
Penso ser consensual que a nossa sociedade atingiu um nível de degradação alarmante, bem visível na política, na justiça, na educação, na saúde, na comunicação social, enfim, bem visível. Acredito que a causa última para esta situação resida na total negligência política das últimas décadas relativamente à justiça. Por outras palavras, o proverbial não funcionamento da justiça -que nunca foi prioridade dos "nossos" políticos - criou gerações e gerações de pessoas que cresceram na convicção da impunidade generalizada, do "esquema alternativo" e, em suma, da desresponsabilização geral. Isto porque a realidade judicial, penso eu, é uma trave mestra de qualquer sociedade e cuja matriz é reflectida nas restantes "realidades sociais". A desresponsabilização judicial acarreta necessariamente a desresponsabilização na educação, no emprego e no cumprimento dos restantes deveres sociais. Pior ainda, acarretou a desresponsabilização como padrão da acção política, ou seja, não podemos sequer contar com a classe política, ela mesma, afinal, promotora e principal usufrutuária da situação que actualmente se vive.
Quando Giuliani chegou a Mayor de NY, erradicou o crime - nas proporções assustadoras que então se verificavam - com base num programa de penalização severa do pequeno crime, como principal acção preventiva do grande crime (o nosso PC pode explicar melhor).
Será essa uma via para recuperar a sociedade? Mais regras, mais rígidas e penalidades efectivas e severas, a todos os níveis que não apenas o penal?
posted by Neptuno on 3:05 da tarde
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MISTÉRIO SOVIÉTICO: Uma edição do Bulletin d'Information de l'Association de Defense Internationale contre les Stupéfiants, de 1930, continha um artigo assinado por um Dr. Rubakine que explicava que o consumo de cocaína era um problema em muitas cidades da URSS. E acrescentava: "(...) os consumidores recrutam-se principalmente entre os criminosos e crianças abandonadas. O desaparecimento quase completo dessas crianças, nestes últimos anos, reduziu consideravelmente os quadros dos consumidores da cocaína.".
Que não comiam criancinhas ao pequeno almoço, acredito; mas lá que sabiam fazê-las desaparecer quase por completo, lá isso sabiam.
posted by FNV on 11:15 da manhã
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PALAVRA DE HONRA? Durão Barroso declarou-se surpreendido pela crise política que estalou em Portugal. Durão é assim a modos que o condutor de um autocarro cheio de passageiros que circula numa movimentada auto-estrada, a toda a velocidade; de repente vê um Ferrarri abandonado do outro lado da via, e salta do autocarro em andamento para se pôr ao volante da bela máquina. Passado uns instantes liga o rádio e ouve que um autocarro descontrolado se espatifou contra os rails de protecção, arrastando outras viaturas e provocando um chavascal dos diabos. Declara-se então deveras surpreendido com o acontecimento.
posted by FNV on 11:08 da manhã
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O ORGASMO: João Pinto, jogador do Boavista, foi expulso ontem por Olegário Benquerença ( sim, esse mesmo...) e explica: "no momento em que me expulsou começou a rir com cara de gozo e até parecia que estava a ter um orgasmo".
Bem me parecia que este Olegário era um discípulo de Reich: numa célebre noite no estádio da Luz, Olegário, adepto do super-orgasmo reichiano, invalidou a penetração do esférico nas redes do FCP apenas pelo puro de gozo de prolongar o momento.
posted by FNV on 11:01 da manhã
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ROGER?! :
Ma chi cazzo è Roger?!
Il coniglio...?
A PRIMEIRA VEZ: Os leitores mais argutos ter-se-ão aprecebido que foi desta vez que atingi as letrinhas azuis (foi aqui). Por modéstia (perfeitamente reconhecida por todos), referi-me a um texto de minha autoria. Mas isso não quer dizer que, de uma vez por outra, não venha a indicar no futuro outro escritor igualmente interessante ou mesmo de esquerda.
posted by VLX on 11:27 da tarde
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COLIGAÇÕES: A comunicação social tem passado o fim-de-semana a discutir se os partidos da maioria vão ou não às eleições em coligação. O assunto tem alguma graça porque quem segue minimamente estas coisas estava já convencido de que não haveria qualquer hipótese de isso acontecer, ocorressem estas em 2006 ou amanhã. Isto porque o maior partido da coligação parecia não querer concorrer coligado, o que era muito natural.
Com efeito, é perfeitamente natural que nestas situações o partido maior se sinta sempre suficientemente legitimado, forte e capaz de concorrer a umas eleições sem ajudas. Contudo, por outra via, é também natural que um governo de coligação se apresente ao eleitorado junto e unido como esteve na governação e no programa que propôs.
O facto de os partidos da coligação irem ou não unidos a eleições legislativas terá a ver não só com os interesses particulares de cada um mas, com o facto do PSD decidir de uma vez por todas ir coligado. Terá realmente de ser o PSD, o maior partido da coligação, a tomar essa difícil decisão e terá de ser ele a decidir se é exactamenteisso o que pretende. Isto porque nas últimas eleições em que foram coligados, essa intenção não era suficientemente clara (para não dizer que não era real) e isso reflectiu-se na campanha e nos resultados.
É do lado do PSD (e não do CDS) que existem manifestos opositores a esta coligação (veja-se Cavaco Silva, Pacheco Pereira, Miguel Veiga, Marcelo Rebelo de Sousa, Marques Mendes, etc. - todos os dias a combaterem por todos os meios o próprio partido). Ora isto dificulta seriamente o trabalho da coligação pois esta tem de combater não só a oposição como parte do próprio PSD.
Só que o PSD de 2004 já percebeu que este líder do CDS não é propriamente o Freitas do Amaral de 1982 que, por interesses pessoais, se rebelou contra o governo, desmantelou a coligação e se pôs na alheta à procura de Belém contra os interesses do país.
Mas o PSD também já compreendeu que este CDS não está para ir coligado quando o seu parceiro faz crer ao eleitorado que nada tem a ver com ele e o deixa sozinho no palco a receber insultuosas acusações («extremistas de direita» e «antigos fascistas» são epítetos ofensivos e injustificados que já Mário Soares endereçava a Freitas do Amaral - olha a quem!... - em 1986, quando este apoiado por Cavaco...).
Por isso, se, por interesses ou ódios pessoais, este bloco do PSD prefere entregar o governo da nação ao PS, não vale a pena ao CDS incomodar-se em ser o alvo directo das críticas da oposição (tal como escrevia aqui há dias) nem ser criticado sem ter a mais pequena defesa dos membros do PSD (como aconteceu este ano nas europeias).
Por outro lado, se essa gente se consciencializar de que para o país é melhor ter como governante alguém do PSD, em coligação com o CDS, do que um governo do PS (sozinho ou apoiado pelos bloquistas ou pelos comunistas), assim talvez já seja possível pensar-se numa coligação.
Cabe ao PSD decidir-se e ao CDS sacrificar-se. A bem da Nação.
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